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A casa às costas

“A cara do presidente do Estoril Praia a olhar para o Carlos Manuel dizia tudo: ‘Estás maluco? Vamos assinar com um jogador de muletas?’”

“A cara do presidente do Estoril Praia a olhar para o Carlos Manuel dizia tudo: ‘Estás maluco? Vamos assinar com um jogador de muletas?’”
Ana Baiao

Luís Vidigal, 50 anos, quase dispensa apresentação tendo em conta a tão conhecida história de família dos irmãos Vidigal, pois cinco deles jogaram no escalão mais alto do futebol português. Fomos ouvir o seu percurso, contado na primeira pessoa, através de uma entrevista onde o antigo médio, entre muitas outras coisas, fala da caça aos passarinhos com o irmão Lito, da morte do pai no ano em que dá o salto do Elvas para o Estoril Praia (enquanto recupera de uma lesão), das palavras de incentivo de Carlos Queiroz e do episódio em que um dirigente diz que tem de procurar outro clube. E falámos também da festa do título no Sporting, da ida aos Jogos Olímpicos de Atlanta e da partida para Nápoles, três dias depois de ter casado

Nasceu em Angola e veio para Portugal com dois anos. Quem veio consigo?
Vieram os meus pais, Vítor e Deolinda, e os meus 11 irmãos. Na altura éramos 12, o Jorge já nasceu em Portugal. A nossa vinda para Portugal é sem dúvida o marco principal e mais forte da família Vidigal.

Porquê?
A fuga de uma guerra não deveria acontecer nunca para ninguém. Nunca. Muito menos para uma família com 12 filhos e as dificuldades que isso acarreta. A única condição que os meus pais colocaram para viajarmos foi virmos todos dentro do mesmo avião. Felizmente, foi-nos permitido viajar e cá estamos nós.

Ficaram a viver onde?
Primeiro fomos para um hotel desativado, em Vidago. O incrível é que ainda continua desativado. Ainda não consegui levar lá os meus filhos, mas quero levar. Ficámos em Vidago dois anos.

O que faziam profissionalmente os seus pais em Angola?
Nós pertencíamos a uma família de classe média-alta, com terreno agrícola, com oficinas do meu pai, que era carpinteiro. Tínhamos uma vida super tranquila, espetacular. E viemos para cá com uma mão à frente e outra atrás, com as dificuldades que isso representa para uma família de 12. As dificuldades que os meus pais encontraram para fazer de nós aquilo que somos hoje, não conseguimos medir. Não temos noção. Às vezes sentimos uma ansiedade quando um filho nosso está mal-disposto, ou tem uma coisinha, agora, imaginem o que é na aproximação à hora de uma refeição, os meus pais pensarem o que vamos dar de comer aos nossos filhos? Porque isto aconteceu, algumas vezes. Entretanto, a Cruz Vermelha depois encontrou terrenos em Elvas, que foram cedidos àqueles que faziam parte daquele grupo e fomos para Elvas. Mas teriam de ser as próprias pessoas a construir as casas. Ou seja, enquanto estás a construir a tua casa, não estás a trabalhar, não consegues dinheiro. É muito complicado.

Essa casa ainda existe?
Ainda hoje existe no bairro da Cruz Vermelha, em Elvas, é lá a sede dos amigos e da família.

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