“Se a morte do Quintana não nos tivesse acontecido, não sei se conseguíamos apurar-nos para os Jogos Olímpicos. Foi um combustível”

Jornalista
Em 2016, tornou-se o selecionador nacional de andebol masculino. Ficou surpreendido com o convite?
Fiquei, sinceramente, não estava à espera. Andava a ver outras opções.
Sentiu um friozinho na barriga?
Eu já tinha sido selecionador de dois países, mas ser selecionador do nosso país é diferente, é uma sensação espetacular. Sempre que canto o hino, ainda hoje, aquilo é… Se calhar as pessoas veem-me a rir, mas é de felicidade. Embora uma vez, num jogo, acho que foi contra a Suíça, tivemos uma situação caricata. Puseram o hino, mas numas rotações acima. Muito rápido. Não conseguimos parar de rir porque não conseguíamos cantar o hino naquela velocidade [risos].
Quando assumiu a seleção, quais os primeiros objetivos que traçou na sua cabeça?
Eu tinha visto os jogos que Portugal tinha feito com a Islândia. O falecido Quintana fez um jogo brutal, mais de 20 defesas, e mesmo assim Portugal não conseguiu ganhar. Senti que podia haver mais alguma entrega ao jogo da parte dos jogadores, pareceu-me que não estavam a dar tudo e que podíamos fazer um bocadinho mais, com todo o respeito que tenho pelo treinador que estava antes de mim. Isto não tem a ver só com o treinador, tem a ver com tudo. Como agora, se fazem as coisas bem, ou mal, não tem só a ver comigo. Por isso, quando aceitei o convite, a minha preocupação foi indagar o que é isto de vir à seleção para aquela malta.
A que conclusão chegou?
Percebi que eles vinham para perder. O mindset deles era, lá vamos nós perder outra vez. Até o esquema corporal deles a entrar no estágio o demonstrava. Eu via que iam fazer um frete, porque os colegas dos clubes iam descansar e eles iam para mais uma semana de trabalho com a seleção e ainda por cima para perder. Foram muitos anos a perder, 18 anos sem ir ao Mundial e 15 anos sem ir aos Europeus, sempre o mesmo grupo de jogadores ou a variar pouco. Aquilo já estava enraizado.
Como conseguiu mudar esse mindset?
Primeiro com alguma paciência, mas, ao mesmo tempo, com algumas atitudes que eu também tinha e que hoje não tenho. Andar aos pontapés às coisas e a insultar, entre aspas, toda a gente. Eu parecia um maluco. E às vezes perguntava: “Mas eu tenho que ser maluco ou parecer um gajo maluco para nós mudarmos todos isto? Tenho de andar aqui aos pontapés a insultar toda a gente? Que é isto?” Eu próprio não gostava de ter aquele tipo de comportamentos, mas recordo-me que naqueles dois primeiros anos tive este tipo de atitude. Mas pouco a pouco o mindset mudou.
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