Na lista Forbs de Martínez, a exceção confirma a riqueza que vê num grupo restrito: “Temos talento, mas precisamos de um motivo para mexer”
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Depois de já ter convocado os adolescentes Quenda e Mora, mas sem os estrear na seleção, Roberto Martínez chamou Carlos Forbs por ter "um perfil diferente", mas parecido ao de Pedro Neto e Chico Conceição. O treinador explicou as suas escolhas para os jogos contra a Irlanda e a Arménia pela falta de tempo, para justificar que a prioridade neste estágio é aproveitar o que se fez nos anteriores, de setembro e outubro. E derreteu-se em elogios a Nuno Mendes, que falha a convocatória por lesão, classificando-o como o melhor jogador do mundo que não tem substituto (algo que terá alegrado Raphaël Guerreiro)
Ter os olhos esbugalhados, bem abertos como se vivesse surpreso, é uma característica visual de Carlos Forbs. Rara é a fotografia sua que não o tenha assim. As mais recentes, tiradas esta semana em Brugge, confirmam-no e Roberto Martínez estava atento. “Marcar dois golos ao Barcelona e fazer uma assistência foi uma ajuda”, enlaçou o selecionador, ao fechar o seu embrulho de elogios aos ouvidos também bem abertos do jovem que fez estrear em convocatórias: “Tem um perfil muito especial, é rápido e vertical. Está no melhor momento da carreira, é novo, mas teve muitas experiências em Inglaterra [Wolves] e na Holanda [Ajax], e agora tem um papel essencial na sua equipa.” Mas, no elogio, houve contradição.
Ao alongar-se na explicação sobre a novidade entre os 26 jogadores chamados, Martínez realçou que o extremo do Club Brugge “consegue jogar nas duas alas” e que tal é “muito importante” para este “estágio” de novembro que terá partidas frente à Irlanda (13 de novembro) e Arménia (dia 16). E que vê Forbs como “um jogador diferente, a relembrar o impacto do Chico Conceição e do Pedro Neto” na primeira vez que os convocou pelo “mesmo perfil desequilibrante, rápido, que pode jogar nas duas alas”.
Na derradeira observação esteve a ligeira incoerência: todos os citados são capazes de atuar à esquerda ou à direita, mas nem o “espalha-brasas” da Juventus, ou o homem do Chelsea, igualmente esquerdinos, rendem o mesmo se deslocados da sua predileta ala direita onde o seu melhor floresce ao jogarem de pé trocado. Como Geovany Quenda ou Rodrigo Mora antes dele, Carlos Forbs teve o seu momento para escutar um papiro de elogios do selecionador nacional - “está a fazer uma época muito boa na Liga dos Campeões” -, no qual se inclui, como nos predecessores, a indicação de quando o viu jogar pela primeira vez.
Os dois adolescentes não chegaram a jogar, a ambos Martínez valorizou a experiência de terem participado nos estágios. Esta lista de convocados poderia ser uma lista dos mais ricos com o selecionador, tal o novo exemplo que é da estabilidade das suas escolhas, como o próprio o demonstrou se interpretadas as suas entre linhas. E não só: “O foco em novembro é aproveitar o que fizemos nos estádios de setembro e outubro. Faz sentido continuar com o trabalho feito.”
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Mexer nos convocados? Só se houver um motivo
Para cada convocatória existe uma pré-convocatória e Roberto Martínez, na terceira ocasião em que anunciou escolhidos esta época, enumerou quem ficou a ver a porta do lado de fora, ali quase, jogadores “como o Rodrigo Mora, o Mateus Fernandes, o Geovany Quenda, o João Simões, o Félix Correia que está a fazer uma grande época, o Tomás Araújo”, citando-os porque “isso faz parte da competitividade” que sempre menciona ao explicar as suas escolhas.
Desta feita, referiu mais vezes a relevância que dá a manter um ambiente de clube na seleção nacional, algo que é visto e sabido desde há muito. Declarou-o sem espinhas uma vez: “Agora é importante melhorar conceito e trabalhar como um balneário de clube, é importante estar a um melhor nível quando só há dois, três treinos para preparar os jogos.” Subliminarmente, foram mais vezes. “O que fizemos nos dois últimos estágios é muito importante”, disse. “Precisamos de encontrar as soluções dentro do grupo e utilizar os jogadores que já trabalhámos nos dois últimos estágios”, acrescentou.
Questionado acerca do quão restrito parece ser o acesso à seleção nacional, o treinador assegurou estar a trabalhar para o futuro, que a competitividade também se vê na fartura de opções, e escancarou a sua preferência por ir trabalhando com os mesmos nomes. “Faz parte do grande processo de formação do futebol português, porque todos os anos temos jogadores com talento que podem trazer qualquer coisa diferente ao balneário da seleção - mas, para isso, precisamos de ter um motivo para mexer.” Para Roberto Martínez, a riqueza vem da estabilidade em ir tendo os mesmos jogadores.
Diogo Cardoso - UEFA
O melhor do mundo que faz piscinas
No núcleo dos habituais não vai estar, na última ensemble do ano, a energia de Nuno Mendes. Magoado num joelho, a ausência do defesa do Paris Saint-Germain arrancou do selecionador as palavras mais simpáticas da conferência de imprensa em que anunciou os convocados. Chamou-lhe “o melhor do mundo neste momento”. Só assim. Poderia intuir algo perdido na tradução, um “lateral esquerdo”, mas não, era mesmo tal como o disse: “A minha avaliação do Nuno Mendes é muito subjetiva, é como falares do teu filho. Na minha opinião, agora é o melhor jogador do mundo. Os outros treinadores não precisam de concordar comigo.”
Haverá mais argumentos a favor do que para o contrariar. Não é de agora, o embalo na forma de Nuno Mendes vem da época passada, só abrandado por esta mazela que o afetou no PSG-Bayern, compromisso da Liga dos Campeões a meio desta semana. “Não há outro lateral esquerdo com a sua capacidade de defender situações de um para um, que com bola tem a capacidade de jogar como um 10, por dentro, e por fora consegue ‘fazer piscinas’. É um jogador completo, muito bom no ar, consegue fazer a posição de central”, radiografou Martínez, quiçá o primeiro selecionador nacional desde a erupção de Cristiano Ronaldo nas discussões sobre a Bola de Ouro, em 2008, a ousar juntar, na mesma frase, “melhor do mundo” e outro jogador que não o capitão de Portugal.
Sobre ele, porque é regra ser tema, foi perguntado ao selecionador nacional o que achou da entrevista recente de Ronaldo, na qual referiu que vencer o Campeonato do Mundo não irá “mudar o seu nome na história”, mesmo que tenha mudado o legado de qualquer futebolista que o tenha conquistado. A reação do treinador foi genérica: “É sempre bom ouvir as ideias do capitão, é um jogador único, não há outro com mais de 200 internacionalizações pela sua seleção. Todos percebemos a sua paixão e ideia do que é, para ele, vestir a camisola. É um exemplo. Uma pessoa que está muito focada no apuramento de novembro. Depois, seria fantástico continuar com o sonho do Mundial.”
Mas calma, adiado o apuramento com o empate consentido à Hungria, em Alvalade, no último jogo, só ficará garantido com uma vitória frente à Irlanda. Nada de passos maiores do que a perna até lá: “Vou proibir tudo o que não seja falar de apuramento.”
Voltando a Nuno Mendes e, a reboque, ao restrito que é o acesso à seleção nacional, Roberto Martínez completou o seu elogio. “Não há um jogador para substituir o Nuno Mendes, um jogador especial”, defendeu quando surgiu a questão sobre os porquês de nenhum lateral esquerdo constar na convocatória. A solução, indicou, passará por Diogo Dalot ou João Cancelo. Nem sempre titular, mas constante nos jogos do Bayern de Munique desta temporada, Raphaël Guerreiro terá apreciado saber de tal coisa.