Automobilismo

De jardineiro a diplomata, 26 anos depois

O Alter Ego atravessando o Rio Grande de Fronteira.
O Alter Ego atravessando o Rio Grande de Fronteira.
Paulo Maria/ACP

O jornalista Rui Cardoso descreve a experiência de ter conduzido, nos treinos livres das 24 Horas de Fronteira, um jipe UMM. Ou melhor, numa versão melhorada e vitaminada do original, a que a equipa que integra batizou, convenientemente, de Alter Ego

De jardineiro a diplomata, 26 anos depois

Rui Cardoso

Jornalista

Em 1998, quando começaram as 24 Horas TT de Fronteira, estreei-me na primeira edição da prova ao volante de um UMM Alter Turbo. Este produto da indústria nacional dos anos 80, fruto da habilidade do engenheiro Pedro Magalhães Ramalho, era um jipe com enormes qualidades, mas também com alguns defeitos abomináveis, sendo certo que quem o conseguisse guiar em competição ficava capaz de guiar fosse o que fosse.

Vinte e seis edições depois, regresso ao volante de outro UMM, melhor dizendo de uma versão melhorada e vitaminada do jipe original. Pelo meio guiei diversos carros, com especial destaque para um magnífico, mas já muito cansado Nissan Patrol GR. Era fiável, pisava bem, não mostrava medo aos lamaçais, aguentava tudo, mas se não era o mais lento em pista, para lá caminhava. Sobretudo a subir era confrangedor…

E o Alter renasceu

Vinte e cinco anos é muito tempo e a minha intenção era pendurar de vez as luvas e o capacete. A menos que, como no filme de Frank Capra, do céu caísse uma estrela. E a estrela caiu. Uma outra equipa que também vinha dos UMM resolveu fazer o que a metalomecânica de Queluz já não foi a tempo: pegar no carro original, reinterpretá-lo e fazê-lo evoluir. Nascia um 4x4 mais largo, com (muito) mais cavalos e uma suspensão que não derivava das molas das carroças dos nossos bisavós. Era o que o UMM Alter seria se as leis da economia não se tivessem atravessado no caminho das da evolução. Por isso lhe chamaram UMM Alter Ego…

Foi assim que os irmãos Azevedo (Manuel e Fernando) e os seus amigos Mário Alves e Luis Alemão me adoptaram como quinto piloto do UMM Endurance Team. Depois de um jantar bem regado em Santo Tirso (onde se situa a fábrica de meias para exportação da família Azevedo) e de um ensaio do carro na pista de autocrosse de Murça (a terra da ancestral porca, do lendário soldado Milhões e do quase campeão nacional de TT José Rodrigues) fiquei apaixonado pelo carro, paixão esta que se reforçou depois de quatro voltas nos treinos livres de sexta-feira, 6 de dezembro, de manhã.

Uma verdadeira mecânica híbrida

Lembro-me, quando era miúdo, de ter visto no cinema um daqueles documentários que antecediam a projeção da fita principal chamado “De jardineiro a diplomata”. Era a história de um motorista que passava dos tratores e furgões para chofer privado de uma alta figura, passando a guiar um carro de categoria.

No meu caso foi mais passar de trolha a diplomata, tal a elegância com que o UMM Alter Ego despachou os 16 km do circuito. Uma suspensão que parece um tapete voador, um motor que transforma as subidas em retas e as retas em descidas e um desembaraço a atravessar as ribeiras que nem os ‘aranhiços’ conseguem igualar. E, para estar ao nível das soluções modernas, uma verdadeira mecânica híbrida: o motor é Toyota e as pontes, traseira e dianteira, são Nissan…

Como explica Mário Alves, este carro é o oposto da maldição do filme de Ethan e Joel Cohen ('Este País Não é para Velhos'): não só não penaliza a idade, como parece ter sido feito para os já não muito novos o conduzirem sem darem cabo das costas. Mas, como explicou judiciosamente o grande Juan Manuel Fangio, quem ganha as corridas não é quem faz a volta mais rápida, quem ultrapassa mais vezes ou quem larga do primeiro lugar da grelha: é quem estiver lá quando a bandeira de xadrez descer, neste caso, domingo, dia 8, às três da tarde.

Das peripécias desta corrida, muito em especial da tenebrosa e gélida noite de Fronteira, vos falarei nas próximas crónicas.

Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: rcardoso.expresso@gmail.com