Automobilismo

Fronteira tem mais encanto, na hora da despedida

Alexandre Andrade voando para mais uma vitória
Alexandre Andrade voando para mais uma vitória
Mário Cardoso

Para fechar a 26 ª edição das 24 Horas TT de Fronteira, o jornalista Rui Cardoso conta as peripécias do desfecho da competição, um final que chegou a ser promissor mas que terminou com um amargo sabor de boca

Fronteira tem mais encanto, na hora da despedida

Rui Cardoso

Jornalista

Sic transit gloria mundi. Assim explicavam os antigos romanos que nada é mais efémero que as glórias deste mundo. Quando cheguei à box no final do meu turno de condução (das 17.30 às 20.00 de sábado, 7 de Dezembro, nesta 26 ª edição das 24 Horas TT de Fronteira) o futuro parecia risonho para o nosso UMM Alter Ego, pintado de amarelo e ostentando o nº 69.

Às 12 voltas, feitas na sequência da largada canhão do Manuel Azevedo, juntaram-se as minhas nove, feitas sem qualquer contrariedade. Pela primeira vez em 26 anos guiava um carro que não levantava voo nos buracos, subia como se andasse a direito, passava nas ribeiras a fundo e, cereja em cima do bolo, tinha luzes que nunca mais acabavam, iluminando os cantos mais recônditos da pista. Ultrapassei numa só volta mais adversários que numa edição inteira feita ao volante do meu venerável Nissan Patrol, enquanto os do pelotão da frente — que disputam outro campeonato — iam passando implacavelmente por mim.

Uma noite que começou bem…

A pista apresentava-se muito rápida, ainda que com o piso muito degradado à saída das ribeiras e nas zonas de travagem, havendo, ocultas pelas sombras, algumas armadilhas que só o instinto permitia evitar.

Pelas nove da noite tínhamos ascendido à 21ª posição da geral (em 73 concorrentes) e, com as longas horas de condução nocturna, as avarias e os acidentes alheios, contávamos progredir para um lugar de luxo, algures entre o 10º e o 20º lugar ao nascer do dia. Era não contar que Fronteira é sempre Fronteira e que, se a sorte costuma proteger os audazes, tem os seus caprichos, e nem sempre o faz.

o UMM Alter Ego quando tudo ainda corria bem ao princípio da noite
Paulo Maria/Paulo Maria/ACP

Mal o meu sucessor ao volante, o Fernando Azevedo, entrou no traçado começou a sentir dificuldades com a caixa. Apesar de a selecção da alavanca se ter tornado uma lotaria cujo resultado mais frequente era a terceira velocidade, conseguiu trazer o Alter Ego até à box. Outra coisa não seria de esperar depois de tantos anos a virar frangos em Fronteira.

… mas acabou mal

O pior estava para vir. Apesar dum esforço heróico de quatro horas dos nossos mecânicos – que desmontaram a caixa, a abriram, desbloquearam os carretos e voltaram a pô-la no sítio – a avaria revelou-se sem solução. Nem o programa mínimo de irmos para a pista só com terceira, quarta e quinta se conseguiu concretizar.

Apesar da solidariedade doutras equipas, não havia nada a fazer: a corrida tinha acabado para nós. O monstro amarelo, qual elefante chefe da manada dos romances de Edgar Rice Burroughs, tinha vindo até à caverna para morrer com dignidade. Merecia ser posto numa pira funerária e incendiado ritualmente como os heróis da antiguidade (não sei se os donos do carro apreciariam esta ideia).

É verdade que ao fim de 26 anos a fazer esta corrida não era a primeira vez que tragávamos o fel da derrota. Há um bom par de anos, o meu querido Armando Coelho ficou fora da corrida quando o radiador do Patrol se soltou e caiu no meio da pista já à vista da meta. De UMM (dos antigos) o Manuel Azevedo ficou sem direcção também numa última volta. E, mesmo para quem esteja a disputar as primeiras posições, quantas reviravoltas dramáticas não ocorreram a poucos minutos do fim? Fronteira é Fronteira e está tudo dito.

Andrade e mais uma vitória

Lá na frente, a equipa de Alexandre Andrade recuperava ao anoitecer a primeira posição, perdida na largada, e não mais a largaria, adiando, pelo menos por mais um ano, a perspectiva de esta lendária corrida de resistência ser vencida por um SSV (vulgo “aranhiço”). Ainda não foi desta, mas depois da vitória de um veículo deste tipo em Portalegre, em Outubro passado, tudo passou a ser possível.

A poucos minutos do fim, reforçava-se a liderança dos protótipos franceses: Alexandre Andrade (Proto AC Nissan) e Pierre Lauilhé (Propulsion Oryx) nas duas primeiras posições e, a fechar o pódio, o Mitsubishi Pajero da conhecida equipa da Letónia (Rudolf Skoks), seguindo-se dois SSV (o MMP de Amândio Alves e o Can Am MMP de Filipe Marques). Referência merecida para as pick-ups a gasóleo, caso da Nissan Navara de João Lourenço (12º da geral), da Isuzu D Max de Georgino Pedroso/Rui Sousa (14º), sem esquecer a Nissan Terrano de Rui Gonçalves (19º) que tem quase tantas participações em Fronteira como eu próprio.

Para aferir os meandros da classificação final (onde entram penalizações e outros acertos de última hora), os leitores interessados poderão consultar a lista em https://24horastt.cronobandeira.com/.

Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: rcardoso.expresso@gmail.com