Aleix Espargaró deixou o MotoGP e juntou-se a uma equipa profissional de ciclismo, a modalidade que descobriu literalmente por acidente
Em 2022, já preferia fazer uma corrida de ciclismo ao mais alto nível do que ser campeão do mundo da categoria máxima das motas. O sonho que alimentava há anos foi agora concretizado. Aleix Espargaró vai pertencer aos quadros da Lidl-Trek, após uma carreira no MotoGP onde venceu três corridas e foi 11 vezes ao pódio
Os motociclos não se podem queixar de falta de diversidade no seio familiar. Cada parente tem as suas características. Se há aqueles capazes de produzir 300 cavalos em pistas de asfalto, outros servem para andar aos saltos em terrenos sinuosos. A especialidade de Aleix Espargaró sempre foi o manuseamento dos primeiros e talvez por isso tenha estado mais suscetível ao resvalo quando, em 2015, se aventurou nos segundos.
Aleix Espargaró era já um piloto consagrado no MotoGP, embora os seus grandes êxitos viessem muito mais tarde. O espanhol corria então pela Suzuki, mas a época tinha terminado. Na cidade catalã de Granollers, de onde é natural, usufruía da descompressão de que até um atleta tem direito. Porém, sabe-se que quem anda na alta competição sofre de inquietude. Espargaró ia-se testando no motocross. Uma aterragem mal calculada após um voo partiu-lhe a vértebra T9 com prejuízo para a preparação do mundial de MotoGP do ano seguinte.
Naquelas semanas em que esteve impossibilitado de subir a qualquer tipo de mota devido às dores nas costas, o ciclismo sossegou-lhe, com bastante êxito, a ansiedade de se mexer. Um novo amor estava a começar a brotar, mas as incumbências de ter um lugar na grelha do Moto GP usurpavam-lhe todo o tempo, por muito que desejasse gastar parte dele com o ciclismo. No final de 2024, o catalão de 35 anos terminou a carreira na principal categoria do motociclismo e assinou contrato com a Lidl-Trek, umas das principais equipas do World Tour, a divisão máxima do velocipedismo.
No MotoGP, Aleix Espargaró tardou a obter resultados. Mesmo com um percurso que durou entre 2009 e 2024 (com um ano de interregno onde competiu no campeonato de Moto2), o piloto conseguiu apenas ganhar três Grandes Prémios (o primeiro em 2022) e ficar 11 vezes no pódio. Em 2020, o rendimento na Aprilia era acanhado e Aleix pensava terminar a carreira nas motos. Aliás, tinha um grande incentivo para o fazer: uma proposta da Movistar, equipa de ciclismo espanhola, que o sondou. Esteve “muito perto” de aceitar, como disse numa entrevista, em 2022, ao podcast “El Pinganillo”, disponível no YouTube.
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O desempenho na Aprilia transformou-se para melhor e o corredor ainda foi a tempo de viver os melhores anos da carreira, chegando inclusivamente a lutar pelo título. No entanto, a voz atrás da cabeça era impossível de amordaçar. “Se me perguntares se prefiro estrear-me com os profissionais [de ciclismo] ou ganhar o Mundial de Moto GP, diria que já corri muitos anos e que não interessa se não ganho. Queria muito experimentar o meu sonho, que é ser ciclista e correr no World Tour”, assumiu na mesma entrevista.
Atualmente, Aleix Espargaró vive em Andorra, local que alberga alguns dos mais afamados nomes do pelotão. Na garagem de sua casa, há em exposição quase tantos capacetes de moto como bicicletas. Até assinar contrato com a Lidl-Trek, o ciclismo encaixava-se nos limitados períodos em que não estava a competir naquela que vinha sendo a sua principal atividade profissional. “Recorri ao ciclismo para recuperar [de uma lesão] e treinar. Com o tempo, tornou-se mais do que apenas preparação: tornou-se a minha paixão. Vivendo em Andorra, fiz amizade com muitos ciclistas profissionais, o que me inspirou a treinar a um nível superior.”
Aleix Espargaró foi apresentado pela equipa norte-americana como “embaixador da Lidl-Trek”. À parte da lógica de marketing que também parece existir, o novo elemento do conjunto que conta, entre outros nomes fortes, com o ex-campeão do mundo Mads Pedersen, denominou-se como um “homem de equipa”. É assim pouco expectável que Aleix Espargaró tenha oportunidade de competir em corridas como a Volta a França ou outras de semelhante dureza. Para já, o catalão vai integrar a equipa de desenvolvimento da Lidl-Trek e aponta para a realização de algumas provas de gravel, mountain bike e de estrada.
A autocrítica de Aleix Espargaró fá-lo ser honesto e dizer que, já na casa dos 30 anos, provavelmente não irá a tempo de se tornar um Tadej Pogacar desta vida. Ainda assim, quem o conhece garante que tem nível para estar no World Tour e cumprir o seu desejo de se fazer às estradas empinadas. Os sonhos são mesmo capazes de mover montanhas.