Protocolos quebrados, faraós e Messi a fazer exatamente o que era suposto: assim foi o primeiro jogo do Mundial de Clubes
Kevin C. Cox
Apesar das dificuldades na venda de bilhetes, o encontro inaugural teve as bancadas bem compostas. Na cerimónia de abertura, a FIFA deu seguimento à autopromoção enquanto o jogo esperava. Quando, finalmente, deixaram Inter Miami e Al Ahly (0-0) entrarem em campo, o Mundial de Clubes mostrou aquilo que pode ter de bom: o desconhecimento entre as equipas ser transformado em emoção (mesmo que ainda tenhamos que aguardar pelo primeiro golo)
Se é o adepto tradicional, aquele que gosta da cerveja e da bifana a acompanhar o jogo de domingo à tarde, dificilmente aguentaria ficar no Hard Rock Stadium até ao início do Al Ahly-Inter Miami.
Quem se prestou à experiência, teve que tolerar os atos narcisistas da FIFA celebrados com fogos de artifício de todos os tipos. Primeiro, apareceram dois artistas locais, Vikina e Richaelio, cantando eloquentes versos como “Viva la FIFA”. Depois, lá vieram os rappers, French Montana e Swae Lee, e ficou confirmado que os organismos internacionais também podem passar por uma ego trip.
Dos confins do universo apareceu uma voz maléfica a narrar o que se estava a passar como se alguém fosse acreditar nas palavras de união ditas com a voz de Thanos, o vilão da Marvel que acreditava que metade das pessoas do mundo devia desaparecer. Aí, houve laivos de bizarria.
A questão era saber onde estava Lionel Messi. Talvez ele soubesse como salvar o dia. Sabe sempre.
Kevin C. Cox
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Quando ficou acordado que o Mundial de Clubes se iria realizar nos Estados Unidos - com todos os interesse que isso serve -, alguém deve ter adicionado uma cláusula para que o evento só se fizesse com as excentricidades próprias dos desportos norte-americanos. Os jogadores foram introduzidos um a um e o speaker nem tentou esconder a adoração por Messi. De seguida, as equipas colocaram-se frente a frente. Se pensou que os capitães iam puxar de um haka, estamos todos consigo.
O jogo fez o favor de começar atrasado para não importunar a propaganda da FIFA. Na altura do apito inicial, as bancadas estavam compostas a um nível bastante aceitável (60.927 foi o número de espetadores). O cenário foi salvo à última hora pela descida drástica dos preços dos bilhetes. Por quatro dólares foi possível ir ver uma equipa com Messi, Busquets, Suárez e Telasco Segovia (ex-Casa Pia). Mesmo a jogar na sua cidade, embora num estádio diferente, o Inter Miami não conseguiu atrair tantos adeptos como o Al Ahly, que arrastou uma vaga de gente com chapéus de faraó.
Notava-se na equipa egípcia que havia jogadores a darem o litro. Com a temperatura a rondar os 30.ºC, o suor acumulava-se. O presidente da FIFA, Gianni Infantino, não parecia muito interessado com o futebol propriamente dito e ia trocando ideias com Ronaldo Nazário e Roberto Baggio.
Anadolu
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O Inter Miami faz parte do Mundial de Clubes apenas porque, em 2024, ganhou a fase regular da MLS, sendo que o campeão da liga norte-americana, o LA Galaxy, não se apurou para o torneio. Se o franchise da Flórida foi encaixado no Mundial de Clubes a algum custo, muito se deve à vontade de ter Messi a jogá-lo e a ser protagonista de lances como o livre em que fez a bola circundar a barreira. Meio estádio gritou golo, mas o ideal não aconteceu. Mesmo a terminar, também levou a bola à barra.
De facto, houve um argentino a brilhar. Chama-se Oscar Ustari e defendeu um penálti de Trézéguet. O Inter Miami conteve o futebol explosivo do Al Ahly e, ao intervalo, Javier Mascherano acicatou uma reação que não impediu que o duelo do grupo A, onde também está o FC Porto, terminasse sem golos. A culpa também é de Moha El-Shenawy, guarda-redes que aguentou o Al Ahly na segunda parte.
Na ementa do Mundial de Clubes que parece ter sido produzida a partir das combinações de ingredientes mais estranhas do mundo, corre-se o risco de encontrarmos alguns jogos como este, frenéticos. Este merecia mais golos do que teve e pode não ter sido taticamente brilhante, com a emoção a advir do caos, mas há sempre que dar uma oportunidade. Se isso fará com que uma competição que ainda se estranha se venha a entranhar? Veremos.