Crónica de Jogo

O Marselha começou por fazer teatro, o Sporting retribuiu com puro cinema

O Marselha começou por fazer teatro, o Sporting retribuiu com puro cinema
Soccrates Images

Era no banco que estavam os nomes que viriam a dar a vitória ao Sporting na receção ao Marselha (2-1) para a Liga dos Campeões. Os leões começaram a perder, mas o encontro não foi Paixão até ao fim. A jogar toda a segunda parte em superioridade numérica, a equipa verde e branca conseguiu a reviravolta com golos de Geny Catamo e Alisson

Parecia um casting por eliminação imediata, um concurso de talentos em que o candidato sabe, mal acaba a sua atuação, se vai para casa ou não. Emerson ainda teve direito a que o seu desempenho fosse revisto pelo juiz principal. Rade Obrenovic não gostou nada do que analisou e deu uso à regra que pune a desonestidade. O ítalo-brasileiro foi muito mau ator. Maxi Araújo pôs-lhe o pé à frente, mas sem tocar no lateral contrário, que se estilhaçou num fingimento penalizado com o segundo amarelo.

A decisão não foi nada perentória. Afinal, Emerson quase recebeu um Óscar antes de Fernanda Torres, fazendo o árbitro ir ao pequeno ecrã mesmo quando o intervalo já estava a aquecer para entrar. O teatro envolvido a simulação acabou por se revelar uma tragédia para o Marselha. Em 10x11, o jogo tornou-se exatamente na balbúrdia emocional que se esperava. A quatro minutos dos 90’, o Sporting - só melhor quando em superioridade numérica - completou a reviravolta e proporcionou um desfecho que foi puro cinema.

Para a Igor Paixão, a réplica foi mais forte que o sismo original. Antes do remate corcunda entrar na baliza de Rui Silva, o brasileiro tentou um outro com a curva menos definida e que passou ao lado. Pese embora a eficácia distinta, as duas oportunidades nasceram de variações de flanco que apanharam o Sporting descompensado. No lance que deu golo, Pierre Aubameyang encontrou o ex- Feyenoord apenas com Fresneda pela frente. Nem Debast, nem Hjulmand, nem Quenda estavam em posição de ajudar.

Carlos Rodrigues

Já era assim nos tempos de Ruben Amorim: se soubéssemos os laterais, conseguiríamos adivinhar qual a competição que o Sporting estava a disputar. Quando os leões entram em campo na Liga dos Campeões, colocam o patch com as estrelas na manga da camisola e Iván Fresneda em campo. O espanhol é para Rui Borges o certificado de presença em provas europeias. Ainda assim, se a justificação para a preferência era a capacidade defensiva, não funcionou.

O Sporting colocava uma parede de três jogadores – Pedro Gonçalves, Trincão e Luis Suárez – à frente do jogo interior do Marselha. Nem por isso os jogadores de Roberto De Zerbi deixaram de conseguir suster a posse. A vantagem atenuou o ímpeto dos líderes da Ligue 1 que abdicaram da pressão alta, homem a homem, com que iniciaram o jogo e baixaram o bloco. Tudo parecia estar sob controlo, embora tenha sido nesse período que Luis Suárez encarou Gerónimo Rulli.

O timing do cartão vermelho exibido a Emerson permitiu ao Marselha fazer ajustes calculados. De Zerbi abdicou de Arthur Vermeeren, o médio mais criativo, e juntou Matt O'Riley a Højbjerg. Michael Murillo colocou-se sobre a esquerda e foi logo vítima do virtuosismo de Geovany Quenda. O plim do poste e a resistência de Rulli evitaram o empate.

O dedo de Rui Borges começou a sentir-se com as saídas de Quenda e João Simões. O lançamento de Fotis Ioannidis deu aos centrais mais um osso para morderem, o que concedeu liberdade suficiente a Luis Suárez para assistir Geny Catamo. O moçambicano finalizou, mas foi preciso esperar pelos esclarecimentos do VAR, que não viu motivo para anular a jogada.

O momento de tensão foi exatamente o tipo de caos que se esperava após uma nuvem de emoções ter sido levantada. O sucesso das trocas de Rui Borges continuou. A entrada de Alisson trouxe ousadia e foi o futebol de nariz empinado do extremo a permitir a cambalhota. É difícil imaginar alguém de menor coragem a arriscar o remate perante a muralha de defesas que se encontrava à frente. O jovem de 23 anos fê-lo e a bola, aos repelões, lá entrou.

Jose Manuel Alvarez Rey

Os nervos pelos quais todos os intervenientes foram atingidos equivocaram o árbitro. A expulsão de Maxi Araújo, supostamente por ter agredido Pavard, foi revertida. Rui Borges ficou aliviado por não ter que defender a vantagem nos últimos instantes em igualdade numérica com o adversário.

O Marselha era no calendário europeu da equipa verde e branca um presente envenenado. Um eventual défice qualitativo em comparação com outros adversários, tais como o Paris Saint-Germain ou o Bayern Munique, é compensado pela mente de Roberto De Zerbi, capaz de sobrevalorizar jogadores. Por isso, este não foi um triunfo qualquer. O Sporting leva duas vitórias em três jogos e tem os mesmos pontos que a primeira equipa em lugar de apuramento direto para os oitavos de final, o Newcastle.

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