Crónica de Jogo

O Benfica ainda não sabe quem será o presidente, mas em Otamendi terá sempre um general

O Benfica ainda não sabe quem será o presidente, mas em Otamendi terá sempre um general
Gualter Fatia

Otamendi chegou aos 250 jogos com a camisola do Benfica, o dobro dos que fez pelo FC Porto, e marcou o primeiro golo da carreira de grande penalidade. A celebração de uma figura intemporal coincidiu com a confirmação de que Lukebakio é o dono do virtuosismo nos encarnados. Nos quartos de final da Taça da Liga, contra o Tondela (3-0), Mourinho fez algumas poupanças, mas nada que atrapalhasse o apuramento para a Final Four

Houve momentos em que nenhuma das 22 cabeças queria ter os pés no campo. O pouco entusiasmo que a Taça da Liga tem para dar advém da oportunidade de desenjoarmos das figuras de sempre. Porém, não pudemos contar com o contributo de José Mourinho para tal refresco.

Otamendi é uma estátua no onze e está há 250 jogos a comandar a defesa. Nem os 37 anos num calendário estreito para o repouso o despregam da equipa inicial. Habituados à sua tatuada presença estamos. Apenas nos causa surpresa vê-lo a marcar grandes penalidades, exercício que a sua mente maturada tem mais do que capacidade para fazer.

A leveza da terceira competição na hierarquia nacional fez com que a mão de Afonso Rodrigues na grande área, mal foi detetada, levasse o capitão a assumir a cobrança do castigo. Fê-lo exemplarmente, anotando o primeiro golo da carreira do ponto níveo nas redondezas da baliza e abrindo caminho para a vitória contra o Tondela (3-0) e o apuramento para a Final Four.

Os argentinos parecem ser os últimos tradutores da linguagem do amor ao futebol. Otamendi jogou num FC Porto muito melhor do que a versão média apresentada pelo Benfica desde que o central chegou à Luz. Vamos esperar pelo que dirá no final da carreira quanto a uma eventual preferência, mas compromisso nunca lhe faltou. Neste momento, tem exatamente o dobro de encontros vestido de encarnado e uma inexplicável conexão ao símbolo. Com o estatuto de campeão do mundo, em certos momentos do percurso, a realidade foi que o Benfica precisava mais de Otamendi do que Otamendi do Benfica, sendo as atitudes do próprio a apelarem ao contrário. A meio de um processo eleitoral, o Benfica ainda não sabe quem será o presidente do clube no futuro. Em Otamendi, terão sempre um general. Com os seus erros, mas um general.

Avesso à ingestão do exemplo, António Silva demorou poucos minutos a demonstrar na receção aos beirões habilidade para ser apanhado desprevenido. O lapso foi corrigido antes do contemplativo Yefrei Rodríguez rematar desde a boa posição que tinha conquistado.

Um meio-campo com Leandro Barreiro nunca vai ser o esplendor da imaginação. Esse capítulo ficou ao cargo de Lukebakio, insistente a soçobrar defesas na ala direita. O contorno de adversários ficou incompleto por culpa de Lucas Cañizares, subtituto de Bernardo Fontes.

Gualter Fatia

O Tondela alterou dez jogadores face à receção ao Sporting para o campeonato. Na passagem que a equipa de Ivo Vieira fez pela centrifugadora, um Félix, genes futebolísticos que o Benfica tanto procurou no mercado de verão, mostrou-se na Luz. Tratou-se de Hugo e não João, o mais cobiçado dos irmãos e aquele que conquistou as bancadas antes de rumar ao Atlético Madrid.

No ponto de desunião entre Brayan Medina e Rémy Vita entravam os passes verticais de Sudakov. A Franjo Ivanovic saíram-lhe frustradas as tentativas de ganhar preponderância em relação ao suplente Pavlidis. Lucas Cañizares ia levando a melhor sobre o croata.

Um centímetro impediu o Benfica de estar à deriva na partida. A assistência de calcanhar com que Lukebakio abrilhantou a jogada concluída por Sudakov foi realizada para lá do enfiamento do árbitro assistente. A equipa de José Mourinho estava a ter um desempenho aceitável. Contra o campeão da II Liga, é certo, mas aceitável. O aumento da margem acabaria por chegar com nota artística à mistura. Richard Ríos quebrou a cintura de João Afonso e serviu Lukebakio para o encosto.

Eurasia Sport Images

Para não deixar dúvidas de que a posição tem um dono firme, Pavlidis arrebatou mais um golo para a coleção de 13 que já leva esta época. Rémy Vita perdeu a bola onde não devia e Leandro Barreiro, desempenhando o tipo de funções em que pode ser útil, cruzou para o grego.

José Mourinho preferiu claramente cimentar processos do que encontrar novas alternativas. Mesmo com intervenções mais relevantes do que o costume de Samuel Soares, Leandro Barreiro e Ivanovic, o Benfica pressionou o carimbo para deixar uma marca mais nítida em vez de cunhar outro espaço na folha. Foi mais do que suficiente para sobrecarregar a agenda de janeiro com uma ida a Leiria para a Final Four, onde vai defrontar o SC Braga.

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