Sporting andou a menos uma hora nos Açores - até aparecer um fantasma e a cabeça de Hjulmand
EDUARDO COSTA
Os leões bateram o Santa Clara por 2-1 já em horas extraordinárias e num lance ingrato e inglório para os açorianos. A 2.ª parte terá sido uma das menos conseguidas pela equipa de Rui Borges esta época, valendo para a história os 3 pontos e o regresso à grande forma do capitão Hjulmand
Não há asteriscos no futebol. Talvez haja estrelinhas, umas mais merecidas do que outras. A vitória do Sporting em São Miguel, frente ao Santa Clara, para os registos históricos, feitos de papel ou do código binário de uma página digital, não terá asteriscos ou estrelinhas à frente, vale 3 pontos como uma outra vitória qualquer, como uma goleada, como um jogo sem história. Mas o lance que dá origem ao segundo golo do leão vai tirar horas de sono a alguns. E perdurará na memória de outros.
Porque aí apareceu um fantasma. Um canto fantasma, neste caso, numa bola cruzada por Quenda que não bateu em nada mais do que no péssimo relvado dos açorianos, o que terá traído primeiro o extremo do Sporting e depois a equipa de arbitragem. Na sequência, Morten Hjulmand respondeu de forma imperial, de cabeça, ao cruzamento de Quenda vindo lá da bandeirola de canto.
A discussão ontológica sobre a justeza do golo será sempre subjetiva. Subjetivo não será dizer que, no meio de um erro, acabou por ser o jogador com mais cabeça do Sporting a resgatar a equipa, de cabeça, lá está, como que ajudando a narrativa. Depois de alguns jogos abaixo da sua habitual fineza de espírito, Hjulmand voltou a gerir com tenazes o meio-campo do Sporting, permitindo que, em boa parte do jogo, a equipa de Rui Borges só tivesse mesmo de se preocupar em atacar.
Tenazes e não pinças, porque o dinamarquês não é homem de técnica aprimorada, mas sim de tempos, de cérebro, de capacidade de liderança. Não foi por ele que o Sporting fez um dos jogos menos inspirados da época, batendo de frente com o muro central construído por Vasco Matos mal se viu a ganhar, logo aos 5 minutos, após um erro garrafal de Diomande num corte, que permitiu a Wendel um cruzamento excelente e uma finalização ainda melhor a Vinicius.
A perder, o Sporting viu-se condicionado por uma zona central muito congestionada, que não ajudou o futebol de toque e combinações dos visitantes, que demoraram a compreender que era necessário variar. Tentou-o então Gonçalo Inácio desde longe, à procura das desmarcações de Pote, depois Maxi nos cruzamentos, procurando por fora o que não se estava a conseguir por dentro. O golo de Pote, aos 32’, nasce de uma dessas jogadas exteriores, um cruzamento de Geny Catamo em que o internacional português conseguiu fugir à marcação para cabecear ao segundo poste. Às vezes não é preciso ser alto, só é preciso ter o olfato para a bola.
O golo acabaria por alavancar o Sporting para o seu melhor momento. Suárez teve duas bolas de golo antes do intervalo. Na primeira, num dos poucos ataques rápidos do campeão nacional na 1.ª parte, foi isolado na esquerda por Geny, mas permitiu o corte. E quase de seguida foi Gabriel Batista a afastar com classe o remate cruzado do colombiano. O árbitro apontou para pontapé de baliza quando era canto, bom para o Santa Clara mas, de certa forma, injusto para a grande defesa do brasileiro. E quase paradoxal quando chegou o lance que resolveria o jogo.
EDUARDO COSTA
O Sporting começaria, assim, a segunda parte com o elã trazido dos últimos minutos do primeiro tempo. Rui Borges deu peso ao ataque: lançou Ioannidis tirando João Simões, fazendo recuar Pote, o que já tinha dado bons resultados frente ao Alverca. Mas Pedro Gonçalves sairia lesionado aos 57’ e o jogo do Sporting ressentiu-se, órfão do seu elemento mais capaz de inventar em momentos de aperto.
Ressentiu-se também por os dois avançados da equipa estarem em dia de pouco acerto. Suárez somou más decisões, como que levado emocionalmente pela marcação dura do Santa Clara à sua área. Ioannidis não menos: aos 81’, em frente à baliza, optou pelo passe primeiro e quando o destino lhe deu nova oportunidade no mesmo lance permitiu a defesa a Gabriel Batista. Pouco depois, cabeceou ao lado num lance que merecia outra abordagem e enquadramento.
Nos descontos, o nervosismo tomou conta da equipa de Alvalade, numa segunda parte muito pouco conseguida, como que estando literal e metaforicamente a andar para trás no relógio, a jogar em outro fuso horário, a menos uma hora do continente.
Vasco Matos, sentindo o início do desespero, lançou Brenner, tão fresco quanto rápido. O brasileiro procedeu a ter um primeiro lance de perigo, em que rematou ligeiramente ao lado e, depois, a expulsar Maxi, obrigado o uruguaio a travá-lo à entrada da área, quando seguia isolado, após uma catadupa de erros (Diomande, Inácio) e de um ressalto na relva. E foi com o Santa Clara animicamente por cima que quem de direito viu um corte onde aconteceu um ressalto, viu um canto onde não existia nada mais do que um proverbial pontapé de baliza.
O cosmos terá tentado equilibrar, dando a primazia de fazer o golo a Hjulmand, mas nada disso valerá à equipa da casa, num inglório final de jogo. Mesmo que sem asteriscos ou estrelinhas.