O Chaves pode travar o Benfica?
Acho que sim. Sabemos das dificuldades, o Benfica é favorito, não perde em casa há muito tempo, mas o mister quer é que se jogue bem à bola.
Não pediu para jogarem à cautela?
Não. Diz para fazermos o nosso futebol, com algumas diferenças, claro, mas pensando no nosso jeito. Sem pressão. Só isso. Na época passada marquei na Luz e quando joguei no Rio Ave também. Marco sempre e perco sempre. Já fiz dois belos golos, só é pena que nunca tenha ganho.
Falta virar a sorte...
É. Ou não marcar e ganhar.
O Benfica está arredado do título?
Acho que o Benfica vai fazer uma grande segunda volta, até porque não tem provas europeias para atrapalhar.
O favorito é o Porto ou o Sporting?
É o Porto... Mas são duas equipas que têm jogado bem.
Que objetivo pediu Luís Castro à equipa para esta época?
Queríamos fazer uma campanha no mínimo igual à do ano passado e chegar às meias-finais da Taça de Portugal, mas não aconteceu. No campeonato, pretendemos fazer melhor do que na última época. Ficámos em 11º lugar, agora vamos em 7º. O mister diz sempre que temos de dar o melhor espetáculo em campo. Não quer ganhar a todo o custo, mas ganhar bem.
Gosta da ideia de jogo implementada por Luís Castro?
Quando cheguei, gostei logo do jeito do Ricardo Soares, jogávamos bem, embora os resultados não fossem tão bons. Agora com Luís Castro o futebol ainda é mais bonito, agrada aos jogadores e aos adeptos também. Faz-nos sentir confortáveis em campo.
Há demasiadas polémicas no futebol português em comparação com os outros campeonatos em que jogou?
Acho é que se fala em demasia. Acontece um lance do Benfica... e o Sporting fala, o FC Porto fala. Depois há uma jogada do FC Porto... e lá estão os outros dois a falar, a falar. Já viram o Chaves falar mal de alguém? Ou comentar o desempenho de um árbitro? Leio muitas coisas estúpidas, tantas que me cansei de jornais.
É uma característica nossa ou isso também acontece na Bielorrússia, na Rússia, no Cazaquistão?...
Não. Aqui criam polémicas. No Brasil também gostam de falar muito. Não sei se é pelo passado comum... são países irmãos.
Vê programas desportivos de análise da jornada?
Não. Ficam duas horas a falar do mesmo assunto. Agora é dos e-mails. No Brasil também discutem a mesma coisa durante uma hora. Não tenho paciência, nem mais 20 anos de vida. Prefiro cuidar do meu filho Enrico, que tem 2 anos.
Já dá uns pontapés na bola?
Mais do que eu. O menino é fanático, sempre a chutar o dia todo... Pode ser que me ajude na reforma. O pai não deu grande coisa, mas o filho, quem sabe?
Que idade tinha quando começou a jogar?
Tinha 6, 7 anos... Lembro-me de jogar no meio de adultos. Com 8 anos comecei no Atlético de Tubarão. Joguei em todas as categorias de base. Aos 16 anos tornei-me profissional.
Foi sempre médio?
Em pequeno era avançado, depois fui sempre médio ofensivo ou segundo médio.
Como é que, aos 18 anos, vai para a Bielorrússia?
No Brasil havia um clube, o União Barbarense, de São Paulo, que foi comprado por investidores ucranianos. O treinador, que falava português e andava pelo Brasil todo, viajou para Tubarão e chamou-me para me dizer que iam aparecer uns olheiros...
Já tinha empresário?
Não, não tinha. Viram-me em campo durante 15 minutos e disseram logo que eu podia jogar fora do Brasil, tinha estilo para isso, e depois falaram com a minha família.
Não teve receio de arriscar?
Arrisquei. Fui para o FC Gomel, uma cidade a 300 quilómetros de Minsk, bem perto da Ucrânia... a 20 quilómetros de Tchernobyl.
Tinha medo de lá passar?
Nunca lá fomos, é uma cidade fantasma...
Foi para a Bielorrússia sozinho?
Sim, sozinho. Nem tinha namorada. Fui com um tradutor, que ficou lá 15 dias para eu me adaptar.
Do que sentiu mais saudades?
De tudo. Primeiro da família, depois um pouco da comida... Mas nunca fui de muita frescura, de não comer isso e aquilo. O frio foi muito complicado, cheguei no inverno rigoroso. Mas ajudou ter tido no Brasil um treinador que dizia que o ser humano consegue adaptar-se a tudo, se quiser. Se não quiser, não se adapta, nem em Madrid, em Barcelona ou lugar algum. Fiquei com essa frase na cabeça.
Falava inglês?
Falava o básico dos básicos. Era com gestos, com mímica. E lá também poucos falavam inglês. Passados seis meses já entendia mais ou menos russo. Hoje sou fluente. O russo é a primeira língua, o bielorrusso quase ninguém fala. Dava para ir a um restaurante, às lojas, ao mercado...
Onde é que vivia?
No centro de estágio. Morava lá, comia lá, era ótimo.
Como era o seu dia a dia?
Frio rigoroso no inverno, bom no verão. As pessoas não tinham o hábito de convidar ninguém para as visitar ou dizer: “Vamos jantar fora.” Era cada um por si e Deus por todos. Estava muito sozinho. As pessoas são fechadas. Era treino, centro, internet, televisão... Via muitos jogos. Chegava à noite e não tinha nada para fazer, então pegava num caderno e escrevia lá as palavras tal como as escutava.
O que é que o fez naturalizar-se bielorrusso?
Estava no país, e jogar numa seleção é sempre uma montra. Fui campeão três vezes, ganhei uma Taça e duas Supertaças.
Mas como conseguiu a dupla nacionalidade?
No terceiro ano, queriam que eu jogasse pelos sub-21, mas como não estava lá há cinco anos a FIFA recusou. No quarto ano, quando já jogava no Bate Borisov, o presidente do clube falou diretamente com o Presidente da Bielorrússia, e então deram-me o passaporte. Comecei a jogar pela seleção em 2012, na equipa principal, e em julho fui convocado para os Jogos Olímpicos, em Londres. Joguei contra o Brasil e marquei um golo.
Celebrou?
Celebrei. Não acho falta de respeito... é respeito pelas pessoas que me deram a oportunidade de ser internacional. Fiz a mesma coisa quando jogámos contra o Rio Ave: marquei e festejei. Algumas pessoas disseram que era desrespeito. E então os adeptos do Chaves que pagaram bilhete para me ver jogar? E o presidente do clube que me paga todos os meses? Uma coisa é ir provocar, outra é festejar com a equipa e os adeptos.
A inclusão de estrangeiros nas seleções não desvirtua o seu espírito?
Nesse caso, a França ou a Suíça não teriam seleção. Claro que me sinto mais brasileiro. Só vou à Bielorrússia quando sou convocado. Nos últimos jogos não tenho ido, depois de ter fraturado o pé, em maio. Mas já me disseram que vou voltar a ser convocado. Estar em fases finais é um sonho, mas só nos apurámos para Londres.
Foi eleito o melhor jogador do país em 2012...
Foi quando joguei na seleção, mas fui eleito três vezes o melhor do campeonato, em 2010, 20111 e 2012. Em termos de títulos, foram os melhores anos, até porque joguei na Champions. Foi importante em termos de currículo. Mas tive também um ano muito bom no Rio Ave e no Chaves.
Na Liga dos Campeões, no Bate, marcou ao Bayern de Munique. Foi a sua coroa de glória?
Talvez. Também marquei ao AC Milan, ao Valência, e ao PSV na Liga Europa.
Depois foi para o Astana, no Cazaquistão...
Seis meses, depois de jogar na Rússia, no Alania. O clube entrou em falência. Tinha contrato por quatro anos e fiquei lá 10 meses.
Pagaram-lhe?
Não, e tinha um salário de top. Compraram-me por 3 milhões de euros. Só recebi os meses que lá estive.
No Cazaquistão joga-se apenas pelo dinheiro?
Na altura, sim. Agora, o Astana apura-se para a Champions, já jogou contra o Benfica e vai defrontar o Sporting na Liga Europa. No geral, sim, vai-se para lá por dinheiro, financeiramente é muito bom. A cidade de Astana é top, muito moderna, tipo Catar. E havia outros estrangeiros, colombianos, um português, o Cícero, que jogou no Paços e agora está em Arouca... Havia mais convívio.
Aqui ganha-se muito menos?
Não tem comparação.
Onde investe as suas poupanças?
Tenho terrenos, casas e um armazém alugados no Brasil. Já tive 18 anos, agora tenho 29... Isto passa depressa.
O que fazem os seus pais?
O meu pai tem uma fábrica de móveis, já a tinha quando nasci. A minha mãe trabalha em casa. Nunca passei dificuldades, tive uma vida mediana.
Como é que veio para o Rio Ave?
Quando acabei o contrato na Rússia já o Pedro Martins [treinador] tinha ligado ao meu empresário [Oton Pinto] para me levar para o Marítimo, mas pesou a questão financeira. Quis ir para o Rio Ave, pois já estava há oito anos no Leste e a minha família não andava feliz. Queria uma oportunidade aqui, mesmo ganhando menos.
Mas ainda deu um salto ao Chipre.
O Apoel também já me tinha feito uma proposta antes do Astana, e voltaram a ligar logo que fiquei livre no Rio Ave. Era um clube que me permitia voltar a jogar na Champions ou na Liga Europa. E o país também é bom. Fiz uma boa época no Rio Ave, tive propostas para ganhar mais na Arábia Saudita, na Tailândia, mas estava na altura de não decidir só pelo dinheiro. Jogava lá o Mário Sérgio, o Nuno Morais já lá está há 10 anos...
Que tipo de vida é que faz?
Treino, casa. Às vezes, janto com a família e os amigos. Quando quero ir ao shopping vou a Vila Real ou a Guimarães. No verão ia muito ao parque com o meu filho, que tem 2 anos, para brincar. No inverno é frio, mas sempre me dei bem nas cidades frias.
Dá conselhos aos mais jovens no balneário? Ao Matheus, ao Domingos, ao Maras?...
Digo que não sou mau jogador, mas tenho 29 anos. Digo-lhes que, com a qualidade deles, se tiverem a minha cabeça, podem ir muito longe. Podes ser o melhor, mas tens de querer. Como diz o mister: se não se tiver vontade, por melhor que se seja, não dá. Como também não vai dar se se tiver muita vontade e pouca qualidade.