Em Portugal há um árbitro para cada 50 jogadores. Há uma crise de recrutamento de árbitros?
Há o hábito de dizer que temos um problema de recrutamento: nós não temos um problema de recrutamento, nós temos é um problema de retenção. Conseguimos ter muitos jovens a quererem tirar os cursos de árbitro, temos todos os anos cerca de mil jovens, mil e duzentos jovens que querem tirar o curso de árbitro, o que era muito bom se nós tivéssemos uma taxa de retenção muito alta. É difícil, está a ser muito difícil nós conseguirmos reter estes jovens, que até têm o bichinho de arbitragem, que querem saber mais de arbitragem, que querem experimentar. E esse é o problema.
Que problemas surgem a montante desta dificuldade na retenção?
Esse problema faz com que os poucos que ficam acabam por ser muito sobrecarregados com jogos, o que vai fazer com que, mais ano, menos ano, eles acabem por se saturar. Essa proporção que estava a dizer, um árbitro para 50 jogadores, preocupa-nos porque obriga a que os árbitros tenham cinco, seis, sete jogos por fim de semana. E é impossível que jovens com cinco, seis, sete jogos por fim de semana consigam estar motivados, consigam fazer isto durante uma época, duas épocas, três épocas. E depois também naturalmente não ajuda nada nos desempenhos que eles acabam por ter em campo, porque sentem cansaço. Isto é o mesmo que dizermos que os jogadores também podem fazer durante um fim de semana cinco, seis jogos. Nós na arbitragem estamos com esse problema. Nós no recrutamento estamos a fazer várias iniciativas, a federação fez grandes iniciativas para se tentar recrutar, nós também estamos a fazer a nossa parte com outras iniciativas, mas o nosso problema está a montante, está no tema da retenção. Continuamos a fazer um bom recrutamento e não estamos a conseguir reter.
Têm noção quando é que um árbitro normalmente decide deixar a atividade?
Nós tínhamos até há muito pouco tempo uma tipologia, ou seja, nós conseguimos perceber que, como os árbitros, há 10, 15 anos vinham muito mais tarde para a arbitragem, aguentavam-se muito mais anos. Decidiam abandonar quando tentavam subir para os quadros da federação e não o conseguiam. Faziam o processo nas associações de futebol distritais e depois quando era para tentar serem candidatos à Federação Portuguesa de Futebol isso não acontecia e eles acabavam por abandonar. Nos últimos anos tem vindo a mudar muito o paradigma. Nós cada vez temos mais jovens a tirar o curso de árbitros, mas depois isso também faz com que tenham muito mais limitações. Chegam aos 18, 19 anos, quando vão para a universidade e passam a estar muito mais limitados no tempo e como também são muito mais requisitados nas associações de futebol, acabam por se cansar e ir embora. Também os vários problemas que vão existindo, de falta de acompanhamento, ou a inexistência de outras condições mais adequadas, o problema da fiscalidade, o problema da falta de segurança, ou seja, estes pequenos pormenores, que não são pormenores, são problemas muito estruturais, mas que acabam por ser ainda mais um ponto que os vai fazendo abandonar. Em suma, hoje em dia abandonam muito mais cedo, porque também começam, efetivamente, muito mais cedo.
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