O senhor Aurélio Pereira (1947-2025) e o miúdo com as manhas da rua que não se ficou

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"Quando o Cristiano foi ao Sporting, eu era o responsável por todo o futebol juvenil. Tinha sido treinador durante muitos anos e, na altura, recebíamos muitos miúdos da Madeira e dos Açores, para treinarem connosco e serem observados. Tínhamos uma pessoa na Madeira, um homem muito dedicado, que nos indicava nomes. Vinham muitos prestar provas e, praticamente todos eles, mais de 90%, tinham à volta de 16 anos.
Na altura, não tinhamos academia. Tínhamos um centro de estágio, com algumas limitações. Os miúdos vinham com essa idade porque, mais novos, não podiam estar lá.
Para trás de 2002, quando a Academia foi inaugurada e a entrada de miúdos passou a ser aos sub-14, nunca tivemos, à nossa responsabilidade, uma criança com 11 ou 12 anos. Mas aconteceu uma exceção, mais única do que rara.
Eu tinha em meu poder um dossier do gabinete jurídico, que estava pendente. Era a questão de uma dívida de cinco mil contos, o que, na altura, era muito dinheiro, que o Nacional da Madeira tinha para connosco. E veio cá um miúdo com uma intenção - ou ele ficava, ou o Nacional nos pagava o dinheiro. Esse miúdo chegou sem saber ao que vinha, coitado, e numa missão quase impossível.
Quando o presidente do núcleo da Madeira, que ao mesmo tempo era sócio do Nacional, me colocou essa situação, só aceitei por uma questão de respeito ao homem. Porque chegavam cá miúdos com 15 ou 16 anos que, no dia seguinte, já tinham a mala feita para irem embora.
Mas, à vista desarmada, ter um miúdo que, antes, fez uma série de coisas para deixar algumas pessoas impressionadas, é uma coisa; perceber o que está dentro do ser humano, é outra. Hoje há uma certeza que tenho - é a que tenho dúvidas. Há muitos aspetos que influenciam a carreira de um miúdo para o bem, ou para o mal. O sucesso, às vezes, está por um cabelo. Portanto, tendo eu essa responsabilidade, com o miúdo já em Lisboa, tive o bom-senso de ir ver o miúdo.
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