UEFA Euro 2024

Os números coletivos da fase de grupos do Europeu: passividade francesa, agressividade austríaca, domínio alemão. E avisos para Portugal

Os números coletivos da fase de grupos do Europeu: passividade francesa, agressividade austríaca, domínio alemão. E avisos para Portugal
Stefan Matzke - sampics/Getty

A Áustria comete muitas faltas, a Alemanha tem muito a bola e farta-se de rematar, os franceses não pressionam nem marcam. E ainda Portugal, com luzes e sombras. As estatísticas na antecâmara dos oitavos de final revelam a identidade vincada de várias seleções, dando pistas para o que poderemos ver nas eliminatórias do Euro 2024

Os números coletivos da fase de grupos do Europeu: passividade francesa, agressividade austríaca, domínio alemão. E avisos para Portugal

Pedro Barata

Jornalista

O Europeu na Alemanha joga-se ao ritmo da Alemanha. Segundo os dados da Driblab Pro, empresa especializada em estatística avançada, nenhuma equipa permitiu que os adversários, em média, tivessem menos posse de bola (30,6%), nenhuma fez mais remates por cada 90 minutos de jogo (19), nenhuma trocou mais passes de cada vez que teve a bola (7,68 em média).

A equipa de Julian Nagelsmann entrou em grande no torneio, goleando a Escócia. Seguiu-se novo triunfo contra a Hungria e, depois, um empate contra a Suíça, partida que ressuscitou dúvidas recentes na mannschaft. Os resultados foram variando, mas o domínio dos anfitriões verificou-se como em mais nenhuma das 24 equipas.

Com oito golos, ninguém festejou mais vezes do que os alemães. Também em golos esperados — medem a probabilidade de um remate dar golo, atribuindo-se um valor entre 0 e 1 a cada disparo — há domínio dos da casa, com 1,68 golos esperados, em média, por 90 minutos.

A capacidade de submeter o adversário começou a notar-se através da tão alemã reação à perda de bola: foram a seleção com maior percentagem de ações defensivas em zonas subidas do terreno (57,7%), a que permitiu menos passes do opositor por cada ação defensiva que realizou (6,95 passes do adversário por cada interceção, corte ou recuperação alemã) e a segunda que fez mais recuperações de bola no meio-campo ofensivo por cada 90 minutos (16).

Portugal em destaque

A seleção nacional teve uma fase de grupos de altos e baixo. Garantiu precocemente o primeiro lugar, mas sofreu muito para bater a Chéquia e acabou a perder com a Geórgia.

Ainda assim, Portugal foi, sempre, uma equipa a exercer grande domínio face aos adversários, algo normal tendo em conta a diferença de valia individual entre as seleções do grupo e acentuado pela circunstância de Geórgia e Chéquia terem estado durante todo o jogo com resultados que lhes eram favoráveis (a vitória para uns, o empate/vitória para outros).

Ora, Portugal foi a segunda equipa com maior posse de bola média na fase de grupos (67,5%), a segunda com mais disparos (16,7 por partida em média), a segunda que permitiu que os adversários tivessem menos golos esperados (0,45, em média, por ronda). Depois da Alemanha, a seleção nacional surge logo atrás nisto de dominar quem está do outro lado.

Apesar de ser a quinta equipa que menos faltas comete por 90 minutos, Portugal é a terceira seleção, entre as que estão nos oitavos, com mais amarelos
Angel Martinez - UEFA/Getty

Portugal é das equipas que mais troca a bola. É a terceira que mais passes faz por cada posse de que dispõe (6,5, com a Alemanha, claro, a liderar este parâmetro) e a terceira que mais passes realiza até fazer um lançamento longo (17, num claro contraste com o próximo adversário, mas já lá vamos). É, também, a terceira que coloca a linha defensiva mais distante da sua baliza, com uma média de 44,3 metros. Quem tem a sua última linha mais longe da própria baliza? Isso, a Alemanha, com 48 metros.

Não obstante, há sombras nesta equipa portuguesa. Desde logo, a insistência nos cruzamentos, como se vê pelos 81 feitos nesta fase de grupos. Comparando com as outras equipas que lideram a maioria dos rankings de domínio de jogo, a Alemanha fez 75 e a Espanha 49.

Também nesta linha, nenhuma seleção teve mais do que os 8,3 cantos que, em média, Portugal dispôs. No entanto, criou apenas 0,23 golos esperados na sequência de bola parada por encontro, somente o 16.º melhor registo.

Atenção aos cartões e ao jogo direto esloveno

Um dado curioso, mas que também convida à reflexão, são os cartões amarelos. Portugal comete, em média, nove faltas por jogo, o terceiro valor mais baixo da competição (Albânia tem 8,67 e Inglaterra conta com 8,33). Apesar das poucas infrações que comete, entre as seleções que passaram só a Turquia, com 16 amarelos, e a Áustria, com 10, têm mais cartões que os sete de Portugal.

Ter três amarelos por simulação e um por protesto — numa competição em que se é suspenso ao segundo cartão — não é positivo, fazendo com que, frente à Eslovénia, muita gente esteja em risco de falhar uns possíveis quartos de final (Rúben Neves, Ronaldo, Pedro Neto, João Palhinha e Francisco Conceição).

Sesko e Sporar disputando duelos aéreos, um clássico do jogo esloveno
picture alliance/Getty

Falando em Eslovénia, a antiga república jugoslava terá, nos oitavos de final, o encontro mais importante da sua história. Será a estreia numa partida a eliminar de um Europeu ou Mundial e, para tentar incomodar Portugal, é de esperar uma repetição do padrão de jogo da equipa neste Europeu: bloco baixo, equipa compacta e jogo direto.

A Eslovénia aposta muito nas bolas longas para Sporar e Sesko, os seus pontas de lança, e os números mostram-no: é a equipa do Europeu que menos passes faz até colocar uma bola longa (7,5) e a que tem uma distância média de passe maior (21 metros).

O conjunto liderado por Kek é um coletivo passivo, que se instala atrás e pouco pressiona. É a seleção do Europeu com menos posse de bola média (33,1%), a terceira que permite que o adversário faça mais passes até realizar uma ação defensiva (28,1 passes até fazer uma interceção, corte ou desarme) e a quarta que troca menos passes por cada vez que tem a bola (3,20). Jogo direto e bloco baixo, obstáculos que Portugal terá de contar.

Áustria e França, extremos opostos

A Áustria de Ralf Rangnick tem sido uma das boas surpresas do Europeu. Com uma postura agressiva e pressionante, fiel ao ideário do técnico alemão, a equipa austríaca venceu um grupo onde estavam França, Países Baixos e Polónia.


A pressão e agressividade da Áustria tem sido um dos destaques do Europeu
Jürgen Fromme - firo sportphoto/Getty

Todo o jogar da Áustria remete-nos para gegenpressing que o seu técnico ajudou a criar e popularizar. É a equipa que mais faltas comete por 90 minutos (16,7), a terceira que permite que os adversários façam menos passes por cada ação defensiva (9,74), a quarta que mais recupera a bola no meio-campo ofensivo. É, somente, a 15.ª equipa que faz mais passes por posse (3,67), evidenciando o gosto por um futebol direto, rápido, que chegue à baliza rival sem elaborar muito as ações de ataque.

Se a Áustria é vertigem e agressão, a França tem sido passividade e monotonia.

Os vice-campeões do mundo foram a única equipa do Europeu a não marcar qualquer golo sem ser de penálti ou auto-golo. Pressionam pouco — 20.ª equipa com maior percentagem de altas ações defensivas, 19.ª em passes por ação defensivas, 11.ª em recuperações na metade ofensiva — e têm marcado pouco.

Com uma defesa colocada, em média, a 33,7 metros da sua baliza, são a sexta equipa que estaciona o bloco mais atrás, com valores semelhantes aos da Roménia (33,5 metros) ou da Hungria (33,2 metros). Didier Deschamps não tem mostrado preocupação com o nível da sua equipa, talvez consciente que, agora, começará outro Europeu. Para Mbappé, Griezmann e companhia, esta fase inicial pareceu um suave e lento aquecimento.

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