Os 13 excelsos jogadores do Europeu (e não se esqueçam de N’Golo Kanté) quando já só faltam sete jogos para mais alguém se destacar
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Já tínhamos 12 nomes escolhidos para a lista dos melhores do Euro 2024 até aos quartos de final e, de repente, tão de repente quanto ele costuma aparecer do nada para resolver um problema na seleção francesa, lembrámo-nos de N'Golo Kanté. O pequeno incansável está ao lado de craques como Nico Williams, Manuel Akanji, Diogo Costa ou Jamal Musiala entre as equipas que ainda estão em prova
Possivelmente o melhor central da competição na Alemanha, consolidando uma candidatura que já vinha apresentando a referência absoluta da posição a nível mundial. A França de Deschamps, sempre com a solidez defensiva como imagem de marca, teve, durante muitos anos, Varane como pilar atrás, mas Saliba parece querer pegar no testemunho do campeão do mundo em 2018.
Depois de duas temporadas de grande nível no Arsenal, Saliba chegou ao Europeu apenas com cinco jogos oficiais a titular com França. No entanto, Deschamps não tem abdicado da dupla de William com Upamecano, ajudando à consistência de um coletivo que, em quatro jogos, só sofreu um golo, no penálti que Lewandowski apontou pela Polónia.
Rápido, ágil e forte no jogo aéreo, Saliba é de Bondy, tal como Kolo Muani e Kylian Mbappé. O pai do atual capitão de França foi, aliás, o primeiro treinador de Saliba. Contra a Bélgica, nos oitavos de final, o gunner passou com distinção no sempre difícil teste de defrontar Romelu Lukaku. Segue-se Portugal.
Saliba impôs-se a Lukaku no França-Bélgica
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Nico Williams (Espanha, extremo, 21 anos)
Nenhuma seleção tem entusiasmado como a espanhola e, para isso, muito têm contribuído os dribles e o futebol supersónico do atacante do Athletic. Símbolo — a par de Lamine Yamal — da agressividade e risco na finta que esta la roja tem, conjugando esse desequilíbrio com a habitual matriz de passe e posse, Nico esteve especialmente em evidência contra Itália, destruindo Di Lorenzo nos duelos individuais, e frente à Geórgia, assistindo Rodri para o 1-1 e apontado o 3-1 que terminou com as esperanças dos estreantes.
Apesar da juventude, Nico parece indiferente aos muitos rumores sobre o seu futuro, sobretudo quanto a uma possível transferência para o Barcelona. Jogador com mais dribles tentados no último terço no Euro 2024 (17, segundo os dados da Driblab), a ameaça que representa para os adversários não se esgota em ações de drible, como se viu pela visão de jogo e pausa que mostrou quando, com a Espanha a perder frente à Geórgia, olhou para trás e encontrou Rodri em posição de remate no meio de uma floresta de defesas.
O super polivalente do Fenerbahçe é uma das revelações do torneio. Se Nico Williams dribla perto da baliza adversária, o turco fá-lo partindo do seu meio-campo, sendo o futebolista do Euro 2024 com mais dribles com êxito no seu próprio meio-campo (seis), segundo os dados da Driblab.
Ferdi gosta de receber a bola na esquerda e levar a Turquia para o ataque, arrancando em condução. É o 12.º jogador do Europeu que, em média, avança mais metros com bola de cada vez que a tem na posse, caracterizando-se por uma espécie de hiperatividade no relvado. Com 42,2 quilómetros percorridos nos quatro desafios que realizou, é o futebolista que mais metros andou em toda a competição.
Kadioglu encaixa bem no caos da Turquia, um coletivo cheio de paixão e energia, capaz de ser o terceiro melhor ataque (sete golos, só superada por Espanha e Alemanha) e a terceira pior defesa (seis sofridos, apenas melhor do que Escócia e Geórgia). Como defesa com técnica para ter papel determinante no futebol ofensivo, Ferdi tem sido uma das melhores armas ao dispor de Vincenzo Montella.
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Manuel Akanji (Suíça, defesa-central, 28 anos)
A calma, serenidade e experiência da Suíça. Numa equipa altamente regular, que há 10 anos que chega sempre às fases a eliminar dos torneios e que, neste Europeu, tem acrescentando renovado brilhantismo e qualidade, Akanji simboliza essa maturidade e consistência: fez todos os minutos de todos os 17 encontros que os helvéticos somaram entre Mundial 2018, Euro 2020, Mundial 2022 e Euro 2024.
Guardiola limou-lhe o conforto com bola e a qualidade de passe e, na equipa de Yakin, Akanji utiliza essas qualidades. Recetor seguro de cada passe, é comum vê-lo iniciar ações ofensivas, regularmente parando o jogo, olhando para o campo e tomando a melhor opção, como fez na génese do 1-0 contra Itália. Como central do meio da linha de três dos suíços, Akanji, que além do City também venceu títulos na Alemanha com o Dortmund e na Suíça com o Basileia, representa a filosofia metódica e racional de um dos mais bem trabalhados coletivos do Europeu.
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Cody Gakpo (Países Baixos, extremo, 25 anos)
Com a devida proporção e ressalvadas as diferenças, existe algo de Arjen Robben a ser canalizado na estirpe de atacante que define o melhor marcador dos Países Baixos: jogando aberto na esquerda, Gakpo é uma seta que dispara mal na direção do adversário mais próximo assim que recebe a bola. Encara, empurra-o área dentro, espera pelo momento certo para lhe trocar os pés, ajeitar a bola para dentro e rematar. Não quer necessariamente fintá-lo, muito menos ultrapassá-lo, apenas tirá-lo da frente para não lhe obstruir a visão para a baliza.
Libertado para ser a gazela em corpo de girafa futebolística que é veloz a tentar executar esta intenção cada vez que uma jogada o lança (ao contrário da sua vida no Liverpool, onde Jürgen Klopp o experimentou muitas vezes ao centro, até como avançado), o neerlandês é um dos atacantes que mais arrelias causa aos adversários neste Europeu. Se a sua algo descaracterizada seleção chegar longe através do lado mais acessível do quadro, muita da culpa estará em Cody Gakpo e na forma que gosta de reservar para as fases finais: entre o último Mundial e este Europeu, o único jogador europeu a marcar mais golos do que ele foi Kylian Mbappé.
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Diogo Costa (Portugal, guarda-redes, 24 anos)
Andava discreto, longe das atenções dispersas por outras posições e jogadores da seleção nacional, o que só podia ser encarado a bem, embora não assim tão bem - porque é bom o guarda-redes não ser mencionado, sinal de que os ‘ai jesus’ nos jogos não o têm requisitado, mas é igualmente bom quando os seus serviços são urgentemente necessários. E melhor ainda quando ele os entrega serenamente, com calma, que nem um carteiro dar recheio às caixas de correio pela manhã.
Os três penáltis parados por Diogo Costa no desempate contra a Eslovénia (um recorde em Europeus) e a bola que defendeu, a cinco minutos de o prolongamento ir dormir, catapultaram o guardião português para os destaques do torneio já depois de muitos antes dele se multiplicarem nos tentáculos: Mamardashvili e Donnarumma, por exemplo, saíram de prova com 29 e 14 defesas feitas, mas Diogo, com mais minutos do que ambos, leva apenas seis.
A sôfrega falta de dinâmicas a atacar a baliza adversária ou as deficiências na transição defensiva para acudir à sua têm alastrado dúvidas à prestação de Portugal no torneio, contudo, na baliza, a aflição frente aos eslovenos cimentou uma certeza. Diogo Costa já pertencia às conversas sobre os melhores guardiões, agora pode procurar mobília para assentar em definitivo na residência que junta as melhores exibições individuais da competição. Tudo enquanto emana calma, imperturbável no olhar enquanto se “mata a trabalhar”.
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Toni Kroos (Alemanha, médio, 34 anos)
Salientar que acertou 416 passes e só falhar 15 em quatro jogos enquanto tocou mais de 500 vezes na bola e manteve uma eficácia 95,8%, a segunda maior entre os mais de quarenta futebolista que fizeram mais de duas centenas de vezes (só fica atrás de William Saliba, um defesa central para quem os passes na sua maioria se resumem à diligência de entregar o centro de tudo a quem passa melhor do que ele) acaba por ser uma incongruência congruente, uma contradição que arranja sentido, por o visado ser Toni Kroos.
Nenhum jogador se vê à lupa dos números, muito menos um nos moldes do alemão que aos 34 anos reservou o seu canto do cisne para este Europeu, mas, tão acentuada é forma como o jogo da sua seleção se molda a ele e Kroos dobra, torce, endireita, destorce e manipula a plasticina das partidas segundo o batuque da receção e passe, receção e passe, que até a estatística que não lhe faz jus acaba vergada à eulogia - o germânico, chegados nós aos quartos de final, vai sendo o mais influente do torneio a fazer do meio-campo a sua olaria pessoal com que molda tudo num jogo.
O dia em que tudo acabará está cada vez mais próximo, seja na final de Berlim ou já em Estugarda, portanto muito em breve e provocado pela Espanha. Em qualquer data soará a desserviço ao que Toni Kroos ainda joga, fresco que nem uma alface, a exercer a sua vontade no controlo das operações quando a bola está com a Alemanha.
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Tijjani Reijnders (Países Baixos, médio, 25 anos)
Poder-se-ia descrever o neerlandês a quem o nome dele não diz nada como um parente afastado de Matheus Nunes na grande árvore genealógica do futebol. Um médio explosivo que solta o seu impacto ao correr com a bola, quando a conduz por ali fora colada ao pé para ultrapassar linhas adversárias. Concentrar Reijnders no que tem de mais forte seria insuficiente quando, por necessidade brotada nos Países Baixos, um maior protagonismo teve de lhe ser depositado.
As lesões que tiraram aos neerlandeses a sua provável tripla de médios titulares - Frenkie de Jong, Marten de Roon e Teun Koopmeiners - pouco antes do Europeu aguçou a profundidade de recursos em Tijjani Reijnders, um factual médio pródigo no transporte de bola, mas a impor-se a olhos vistos também no jogo de passe. Na vitória nos ‘oitavos’, contra a Roménia, o treinador Ronald Koeman puxou-o, de início, para a dupla de médios e o homem do AC Milan destacou-se a pautar os ritmos da sua seleção, passando a bola a preceito. É dos médios cuja influência e preponderância na equipa está a crescer a cada encontro do Europeu.
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Granit Xhaka (Suíça, médio, 31 anos)
Os grandes médios têm alguma dificuldade em ter registos fotográficos onde não estejam com a cabeça levantada. Faz parte da essência da posição monitorizar todas as movimentações da sua cavalaria e, em simultâneo, ter atenção aos defesas que podem surgir de qualquer um dos 360.º. Tudo isto é muita coisa para se fazer de olho pregado no chão.
Estes fundamentos não são algo que se ensine a Granit Xhaka. Há, aliás, pouca coisa que o helvético ainda possa aprender. Emprenhado em ser treinador, vai dando no Euro 2024 lições gratuitas de como bem jogar. Geralmente auxiliado por Remo Freuler, o seu fiel escudeiro, recupera bolas sem grandes correrias e arquiteta sempre a melhor jogada com a precisão cirúrgica do pé esquerdo. É também do centrocampista do Bayer Leverkusen que se fala sempre que é mencionado o agigantamento da Suíça.
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Fabián Ruiz (Espanha, médio, 28 anos)
Lamine Yamal e Nico Williams mudaram o estilo de jogo espanhol. Tornaram-no mais vertical e, mesmo que decisões rápidas sejam sempre bem-vindas, quebraram a lei que decretava ser crime dar mais do que dois toques na bola. É o tiki-taka com pitons como lhe chamam em Espanha. A reconfiguração de algumas definições do aparelho de La Roja não significa uma rutura total com o passado. Isso era mandar para o lixo décadas de jovens a serem formados tendo como referência a seleção que ganhou todos os grandes torneios entre 2008 e 2012.
Fabián Ruiz é um elo de ligação com os tempos antigos. Quer apareça a construir, quer avance para assistir os atacantes no último terço, assegura-se que o rock and roll dos extremos tem que passar pela afinação do seu futebol. A glória europeia que não tem cheirado no Paris Saint-Germain parece mais realista na seleção, onde o protagonismo do jogador formado no Bétis tem subido com Luis de la Fuente.
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Arda Güler (Turquia, extremo, 19 anos)
Sofreu com aquela praga pelo qual são atingidos todos os esquerdinos com o mínimo de talento evidenciado cedo na carreira que é ter vários vídeos no YouTube intitulados “O novo Messi inserir nacionalidade”. Vítor Pereira lançou-o pela primeira vez na equipa principal do Fenerbahçe com 16 anos. Os jornais desportivos portugueses chegaram a cogitar a possibilidade de rumar a Portugal, mas neste mundo quem é que consegue competir com o Real Madrid?
O clube espanhol chegou-se à frente com 20 milhões de euros e deu-lhe a oportunidade de participar em não mais do que 12 jogos (nos quais marcou seis golos) esta época. O pouco uso apontava o Euro como o verdadeiro teste à aplicação das suas competências ao mais alto nível. Ao serviço da Turquia, embora nem sempre constante, tem dado um passo em frente no reconhecimento que lhe é merecido.
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Jamal Musiala (Alemanha, extremo, 21 anos)
Alguém em Inglaterra estará a chorar ao ver o que Jamal Musiala tem feito no Euro? Muito provavelmente, sim. O extremo com tendência para procurar espaços interiores está a ser uma das maiores revelações da competição com a camisola da Alemanha, enquanto que os ingleses desiludem a cada jogo que passa (pelo menos a nível de espetacularidade).
Até aos sub-21, Musiala representou Inglaterra. Em 2019, deixou o Chelsea e mudou-se para o Bayern Munique e automaticamente passou a estar debaixo dos olhares da seleção alemã. Joachim Löw, o então selecionador da Mannschaft, convenceu-o a representar a equipa germânica e em 2021 lá se estava ele a estrear. A partir daí, deixou de haver hipótese de voltar atrás. As três participações em grandes torneios que já leva devem afastar qualquer arrependimento.
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N’Golo Kanté (França, médio, 33 anos)
Esta panóplia de carinhas larocas que destacamos pelos feitos dentro de campo no Europeu era, inicialmente, para ter 12 nomes, até que nos lembrámos do simpático jogador, um tipo de poucas palavras e tímido sorriso, que há um ano acentuou a sua causa de querer surripiar-se pelos pingos da chuva, só que alto aí, N’Golo Kanté foi no verão passado para a Arábia Saudita e regressou agora à Europa em boa-hora, depois de se enturmar entre a trupe de futebolistas de renome que rumaram aos milhões do Médio Oriente.
Tão despercebido gosta de se levar o francês que por um triz se ia escapando a esta lista na qual merece estar de longe, tão longe quanto distam os relvados sauditas onde talvez se tenha passeado e poupado para o que tem andado a fazer neste Europeu: aos 33 anos, Kanté continua a ser a pulga irrequieta e incansável no meio-campo de França, a surgir por entre pernas, sombras e becos para despojar adversários, roubar bolas e livrar a equipa de problemas. Pequeno trabalhador nato no relvado, deu o passe para o golo de Kolo Muani que colocou a seleção nos quartos de final.