Era uma noite de descanso absoluto para Oleksandr Kilovyi, defesa central dos juniores do Metalist Kharkiv, no leste da Ucrânia. No dia seguinte, a 24 de fevereiro de 2022, tinha uma partida importante contra o Shakhtar Donetsk, um dos principais rivais do campeonato. Por isso, Sasha, então com 17 anos, decidiu ir cedo para a cama, e estava a dormir profundamente quando os primeiros mísseis russos atingiram a cidade.
Às 7h da manhã, o telefone tocou. Era a sua mãe, Olga. Antes de atender, Sasha olhou rapidamente para a camarata de 15m2 que partilhava com três companheiros de equipa. Duas das camas estavam vazias. Estranhou.
“O que estás a fazer a dormir?”, perguntou-lhe a mãe, a partir de Dnipro, cidade natal da família, 220km a sul. “Não viste que começou a guerra e estão a atacar Kharkiv?”. Sasha teve uma resposta desconcertante:
“Mãe, deixa-me dormir que tenho jogo esta tarde e preciso de estar bem.”
Olga não precisou de ouvir mais nada. Enfiou-se no carro com o marido e rumou à segunda maior cidade do país, acelerando a todo o gás no sentido oposto à enorme caravana de automóveis que se afastava do leste, para escapar à loucura sanguinária de Vladimir Putin. “As pessoas olhavam para nós, incrédulas. Não percebiam porque é que estávamos a conduzir em direção aos bombardeamentos”, lembra a mãe do jogador, à Tribuna Expresso, junto à Catedral de Colónia. “Eu só pensava em salvar o Sasha.”
Quando finalmente chegou à academia do Metalist, o seu filho já tinha percebido a gravidade da situação. Estava muito chateado: “Os meus dois companheiros de equipa souberam dos bombardeamentos durante a madrugada, fizeram a mala e foram-se embora, deixando-nos a dormir”, desabafa o defesa, hoje com 19 anos. “Foi a atitude mais egoísta que já vi.”
Convenceu-se de que não ia fazer o mesmo, até porque alguns dos seus colegas de balneário não tinham pais para os resgatar. Meteu os que conseguiu dentro do carro e levou-os para sua casa, onde a segurança era maior. “Um deles hesitou. Queria juntar-se à avó em Izium, localidade que estava a ser invadida. Acabámos por lhe salvar a vida porque, dias depois, a avó foi morta pelos russos”, conta Sasha.
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