Euro 2020

Vêm aí os oitavos: o que podemos esperar? - Parte I

Vêm aí os oitavos: o que podemos esperar? - Parte I
Alex Pantling

Terminada a competitiva e benevolente fase de grupos, o Euro 2020 começa agora a aquecer, finalmente com jogos a eliminar: País de Gales-Dinamarca, Itália-Áustria, Países Baixos-República Checa e Portugal-Bélgica são a primeira fornada, já no sábado e domingo

País de Gales-Dinamarca

26.06 - 17h
@ Johan Cruijff Arena, Amesterdão

É bem provável que a seleção dinamarquesa seja a segunda equipa de todos os europeus depois daquele incidente com Christian Eriksen. Depois de duas derrotas, com Finlândia (0-1) e Bélgica (1-2), o fado parecia estar traçado. Mas uma goleada à Rússia (4-1) mudou tudo, e que festa se deu naquele Parken, em Copenhaga. O que não foi preciso mudar foi a qualidade de jogo: pressionantes, com energia e bons de bola, têm ideias e um coração grande. Sem Eriksen, é o miúdo Mikkel Damsgaard, de 20 anos, a espalhar magia. Com o número 14, tal como Michael Laudrup em 1984, quando voava com a danish dynamite, Damsgaard fez um golaço de craque aos russos. Está aqui uma bela equipa.

País de Gales teve uma vida mais pacata na fase de grupos, começando com empate com a Suíça (1-1) e uma vitória com a Turquia (2-0). Na derradeira jornada perdeu com a Itália (0-1), mas só através de um golo de bola parada, mesmo estando com menos um jogador desde os 55’. É uma equipa competitiva, a ser levada em conta. Aaron Ramsey, Gareth Bale e Daniel James são ameaças constantes. Mais atrás, a fechar os caminhos pelo corredor principal até à baliza, estão os competentes Joe Morrell e Joe Allen. Uma das grandes armas deste País de Gales, que até ficou no banco com os italianos, é o gigante Kieffer Roberto Francisco Moore, um avançado de 1.95m que até é bom de bola e que fez um golo à Suíça. O jogo terá momentos eletrizantes, certamente. Há pedalada, dois coletivos que parecem bem organizados e habitam bons pés dos dois lados da barricada.

Itália-Áustria

26.06 - 20h
@ Wembley, Londres

Bela, bela, é a Itália de Roberto Mancini. Quase sempre dona da bola, onde já se viu?, esta seleção é talvez a que está a encantar mais no Europeu. É certo que os rivais foram Turquia (3-0), Suíça (3-0) e País de Gales (1-0), mas a semente do bom jogo está lá desde que Mancini aterrou naquele gabinete. São já 30 jogos sem perder e 11 vitórias consecutivas (sem sofrer golos). Ou seja, apesar do jogo positivo, ainda existe o famoso rigor defensivo de tempos idos, com Giorgio Chiellini e Leonardo Bonucci (e a grandíssima opção, Bastoni) a protegerem o maduro Gigi Donnarumma - ajuda ter a bola mais longe da baliza também, jogar bem não é um capricho folclórico e os números demonstram-no. O meio-campo goza da qualidade de gente como Jorginho, Verratti, Barella e Locatelli. Na frente há Insigne, Immobile e Berardi ou Chiesa. Não é só como jogam, a fineza do toque, é a variabilidade do jogo. Têm muitas formas de chegar à baliza e isso é uma virtude imprescindível no futebol de hoje.

A Áustria começou bem o torneio, apesar do golo do histórico Pandev, e venceu a Macedónia do Norte na jornada inaugural (3-1). Depois perdeu, sem surpresas, com os Países Baixos (0-2). Franco Foda, o selecionador austríaco, parecia ainda não ter dado com a tecla, principalmente quando o provável melhor jogador da equipa e futuro jogador do Real Madrid, David Alaba, estava preso à defesa de três, ao centro ainda por cima, ou seja, sem possibilidades de levar a bola para a frente. Contra a Ucrânia (1-0), a boa Ucrânia de Shevchenko, o canhoto jogou pela esquerda e as coisas melhoraram, até porque a equipa mudou o desenho e foi mais pressionante. A mudança de Foda para o 4-3-3, dizem os entendidos, valorizou e potenciou a equipa. Marcel Sabitzer é um grande futebolista. Será que a Áustria vai tentar deixar desconfortáveis os italianos na saída de bola e pressionar à frente ou vai esperar e tentar morder depois com saídas rápidas?

Países Baixos-República Checa

27.06 - 17h
@ Puskás Aréna, Budapeste

Não é a soberba e sumarenta laranja de 1974, nem a potência da técnica nem a técnica da potência de 1988, não tem o talento de 100 homens em poucos como em 1998, mas é uma seleção interessante. Os Países Baixos, com o talento e inteligência de Frenkie de Jong no centro de tudo, despacharam o grupo com três vitórias, oito golos marcados e dois sofridos: Ucrânia (3-2), Áustria (2-0) e Macedónia do Norte (3-0). Georginio Wijnaldum está sempre bem, Memphis Depay idem, Daley Blind é importante na construção, mas é Denzel Dumfries, com dois golos, que tem surpreendido com o seu novo papel, como ala direito. Sim, como tantas, esta equipa também joga com três centrais.

A República Checa não precisou de muito para enamorar logo, logo as gentes que gostam da bolinha. O afinado Patrik Schick, honrando a memória de gente boa como Antonín Panenka e Karel Poborsky, vislumbrou uma bola solitária e à deriva, um pouco depois do meio-campo, e bateu nela com a canhota como batem os grandes. O arco que a bola fez foi maravilhoso, foi um chapéu eterno, e ali estava, perante a Escócia, um dos melhores golos do torneio. Não é das melhores a jogar futebol, mas tem momentos vários de valentia, pressiona e quer extrair algo dos jogos, com Vladimír Darida, Jakub Jankto e Lukáš Masopust, este com nome de lenda, a tentarem inventar alguma coisa na frente. O lateral Vladimír Coufal tem pedal para andar até amanhã de manhã. A seleção, que somou uma vitória (Escócia, 2-0), um empate (Croácia, 1-1) e uma derrota (Inglaterra- 0-1), joga em 4-2-3-1.

Bélgica-Portugal

27.06 - 20h
@ Estádio Olimpico de La Cartuja, Sevilha

Quem ultrapassa, ainda que em terceiro lugar, um Grupo F com Alemanha, França e uma competitiva Hungria, sente que está pronto para tudo, certo? Portugal aprendeu muitas lições sobre si, como a falta de criatividade e busca de espaços nos últimos 40 metros contra os húngaros (3-0), e principalmente depois do bigode tático dos germânicos, que fizeram o que quiseram no meio-campo, atraindo os portugueses a um lado, ocupando e fixando a defesa com aquelas espécies de três falsos 9, soltando depois para Robin Gosens, que recebeu sempre à vontade, massacrando a área lusitana. A fé não chega, falta ajustar ou condicionar. O que deveria ter acontecido? O extremo acompanhava Gosens ou deveria ter havido uma linha de cinco defesas para ocupar o campo todo lá atrás? Ou outra solução? Enfim, com a França surgiram João Moutinho e Renato Sanches e a música foi outra, é certo, houve rigor no passe e mais energia para morder os calcanhares gauleses. Bernardo esteve mais ativo, é chave para dar oxigénio e qualidade à posse de bola. Portugal encontrou-se, parece, e esteve mais perto do que Fernando Santos quer, admitiu o próprio.

A Bélgica até tem um desenho tático que se pode aproximar ao da Alemanha, mas a ideia de jogo é diferente, é mais urgente. Foi assim que ganharam os três jogos do grupo: Rússia (3-0), Finlândia (2-0) e Dinamarca (2-1), com quem Youri Tielemans e Leander Dendoncker tiveram problemas graças à mobilidade dos médios dinamarqueses (Axel Witzel, titular com os russos, está à espreita). Os belgas gostam mais de ataques rápidos e contra-ataques. Isto é, é provável que os alas não façam o que Kimmich e Gosens fazem, dando largura máxima, esticando a defesa rival (ou aproveitando o espaço). O veneno está nas botas de Kevin de Bruyne, que tanto pode estar no meio-campo como atuar como falso 9, ou na zona 10, claro. O talento, sempre intermitente e esperançoso, convive em harmonia com Eden Hazard, finalmente a aparecer no torneio. A vertigem obedece a Carrasco, Thorgan Hazard e Mertens. A grandeza, espiritual e futebolística, está debaixo da camisola 9. É o senhor Romelu Lukaku, que leva já três golos, joga e faz jogar e que usa os outros como rotundas, quando, inocentes, se colam a ele com a ambição de lhe roubarem a bola. É uma Bélgica que pode sonhar com o que fez a geração de 1980, que chegou à final do Europeu, melhorando aí a marca de 1972, quando acabaram em terceiro lugar, caindo apenas com a futura campeã europeia, a Alemanha de Beckenbauer e Gerd Müller.

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