Exclusivo

Expresso

Afonso Taira: “Há sempre um peso. A vulnerabilidade não é aceite no futebol, é suposto sermos muito fortes, mas nem sempre dá”

Afonso Taira: “Há sempre um peso. A vulnerabilidade não é aceite no futebol, é suposto sermos muito fortes, mas nem sempre dá”
Nuno Botelho
Chegou a Pina Manique nos últimos suspiros do mercado de verão e tornou-se uma peça fundamental para a subida do Casa Pia à 1.ª Liga, 83 anos depois. Aos 29 anos, Afonso Taira relata à Tribuna Expresso alguns momentos-chave da temporada, reflete sobre futebol, a saúde mental, o "implacável" mercado e explica o que vem aí
Afonso Taira: “Há sempre um peso. A vulnerabilidade não é aceite no futebol, é suposto sermos muito fortes, mas nem sempre dá”

Nuno Botelho

Fotojornalista

Como foi a festa no balneário depois do jogo?
Foi a loucura, uma explosão. Eu vou falar sem ter lá estado, na verdade, estive no controlo antidoping durante uma hora e meia [ri enquanto torce o nariz], mas já vi imagens e vídeos. O que ouvi foi: garrafas pelo ar, roupa por todo o lado, gritaria, abraços, muita água, muita emoção. O que houve no campo continuou no balneário e no autocarro. Foram quatro horas com o pessoal em pé sem parar quieto, só a dançar, saltar e gritar. Quem ia no carro, atrás do autocarro, a dançar e a andar aos "S". Foi uma boa loucura.

Quem é o rei da galhofa?
O pessoal mais animado é o [Ângelo] Neto, [Ricardo] Batista e Derick Poloni. O ano todo. O Batista, então, é perigoso...

Qual foi a ideia de ir para o Casa Pia? Baixaste um escalão.
Foi mais pessoal. O treinador que eu tinha no clube anterior passou a achar que o meu papel não ia ser tão importante ou preponderante na equipa, e isso não me agradou. Fez-me perceber que gostaria de procurar um sítio onde me sentisse mais importante. Pouco depois, apareceu o Casa Pia como solução. Explicaram-me que tipo de jogador estavam à procura e para quê. Rapidamente percebi que a equipa já estava muito bem montada, que estava tudo bastante organizado, tanto equipa como estrutura e clube. Disseram-me que seria uma peça que estava a faltar naquele momento, isso acabou por me agradar em todos os sentidos, não só no tipo de valorização que me estavam a apresentar, no que podia trazer ao clube e equipa dentro e fora do campo, como a organização que o clube já tinha, a estrutura que já tinha para tentar ambicionar o que acabámos por fazer.

Já olhavam para cima, então?
Já olhavam para cima de uma forma muito cautelosa, cuidadosa, consciente até. A estratégia era mesmo que a equipa crescesse nessa ambição, como outsider, mal ou bem o Casa Pia estava na II Liga há muito pouco tempo. Era importante essa ambição crescer de dentro para fora e de baixo para cima e não o contrário. Portanto, sim, falámos sobre isso nos primeiros momentos de conversa, de uma forma de construção, de sonho. Para mim, isso foi logo muito apelativo, não só pela ambição, mas porque se sabia o que se estava a fazer e não se ia ao sabor do sonho só porque é um sonho. Todos os anos, a II Liga inicia com 10 ou 12 equipas que dizem que vão subir de divisão e não foi bem isso que me pareceu que estava a acontecer aqui.

O Filipe Martins falou numa ida ao Centro Cultural Casapiano a meio da época. Como é que foi esse episódio?
Foi muito importante para a nossa época. Estávamos já a fazer coisas boas, sim, estávamos a sentir-nos capazes de lutar mais a sério, como equipa, mas isso era de um ponto puramente desportivo, de treino e jogo. Todos nós sabíamos que o Casa Pia era um clube com muita história, sim, e sabíamos que não era um clube qualquer, mas é completamente diferente achar que sabemos que o Casa Pia é uma grande instituição e ir e ver o quão grande é, a responsabilidade que tem, aquilo que pode influenciar e que influencia, influenciou tantos anos, não sei quantas vidas, não sei quantos jovens que precisavam dessa ajuda. Isso é marcante para qualquer pessoa. Há vários pontos de vista para marcar, uns já são pais, irmãos ou filhos. De todas essas formas percebemos o tipo de instituição que é muito mais a fundo, que tipo de pessoas ajudam, e daí a ligação depois ao futebol e toda a história que tem associada ao futebol. Mesmo sabendo que o Casa Pia tem muita história, acho que nenhum de nós sabia a dimensão e a extensão onde chega a influência do Casa Pia no futebol português. Foi um momento de "ok, estamos a fazer uma grande coisa, mas vamos fazer uma grande, grande, grande coisa". Isso foi muito motivante.

Consegues definir como se joga a II Liga? Quão diferente é da I Liga?
A única diferença que eu apontaria com relevância é que, na I Liga, encontram-se mais jogadores com capacidade de desbloquear o jogo de um momento para o outro. E não tem de ser fazer o golo, a assistência ou ganhar o jogo sozinhos, mas muitas vezes o simples facto de a bola vir torta e eles conseguem, naquele momento, resolver aquele problema, seja ele qual for, sozinhos. Defensivamente, a mesma coisa, seja porque roubaram uma bola, dominaram uma bola ou fizeram um passe que era mais difícil. Existem mais momentos desses, existem mais jogadores com essas capacidades. De resto, o nível não é muito diferente, nem em termos de organização das equipas, nem das equipas técnicas.

Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para continuar a ler

Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: htsilva@expresso.impresa.pt