Dez minutos antes dos relógios de Le Mans baterem as 24 horas daquele dia em que as horas não são as horas normais, mas sim as horas das corridas, Henrique Chaves aproximou-se de António Félix da Costa. “Perguntei-lhe: ‘Como é que é? Já está no bolso ou não?’. E ele: ‘Não, não, em Le Mans só acaba depois da bandeira de xadrez’”. Talvez esteja aqui a diferença entre um estreante e um piloto já a participar pela 5.ª vez na mais mítica das corridas de resistência do mundo. Lição número 1 de Le Mans: primeiro é preciso acabar. Quando a ansiada bandeira finalmente surgiu, a alegria foi semelhante para ambos os portugueses: António Félix da Costa venceu na categoria LMP2, a segunda mais importante em Le Mans, e Henrique Chaves, de apenas 25 anos, coroou a primeira participação com uma vitória, nos GTE Am, ao volante de um Aston Martin.
Numa única edição, Portugal junta tantas vitórias como aquelas que já tinha na quase centenária história de Le Mans (a corrida cumpre o 100.º aniversário no próximo ano). Antes de Félix da Costa e Chaves, Filipe Albuquerque tinha sido vencedor nos LMP2 em 2020. O primeiro de todos foi Pedro Lamy. Depois de dois segundos lugares à geral, a vitória chegou em 2012, na categoria GTE Am. O último domingo foi dia de Portugal em Le Mans e não apenas na história deste retângulo. “Estive a ver isso com o meu irmão e se olharmos para os vencedores das quatro classes, a nacionalidade mais representada é a portuguesa”, analisa Henrique Chaves: “Não há nenhuma outra nacionalidade repetida, há dois portugueses a vencer Le Mans e nenhuma outra nacionalidade pode dizer isso este ano”. Em três portugueses na prova, dois deles venceram. “E outro que lá estava [FIlipe Albuquerque] já ganhou. Muitas vezes pensamos que somos pequenos, mas é só em dimensão, não é em valor”.
Sorte e estratégia
Henrique Chaves, que fez equipa com o dinamarquês Marco Sorensen e com o norte-americano Ben Keating na TF Sport, atende a Tribuna Expresso depois de sair do trabalho como responsável de pós-venda numa empresa de software, ligada também ao ramo automóvel. Há um par de dias estava a vencer em Le Mans. Não se queixa. “Gostava de ter tido mais tempo livre e mais descanso, mas é o que é. A verdade é que enquanto há pilotos que terminam a corrida, vão para casa e preparam a próxima, eu tenho de trabalhar”. Um desses privilegiados - e é o próprio que o diz - é António Félix da Costa. A vitória em Le Mans chega após cinco anos de tentativas, com desilusões pelo meio. “Ficámos em 2.º há dois anos, no ano passado fizemos pole, íamos à frente e tivemos um problema… são muitos anos a ficar perto”, conta-nos o piloto que conjuga a Fórmula E (campeonato que ganhou em 2020) com a resistência. Em Le Mans teve a seu lado no carro 38 da Jota o britânico Will Stevens, já com passagem pela Fórmula 1, e o mexicano Roberto Rodríguez.
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