Rui Pinto, o português que está em prisão preventiva acusado de 147 crimes relacionados com o Football Leaks, revelou ter sido um dos denunciantes dos Malta Files, investigação jornalística conduzida pelo consórcio EIC – European Investigative Collaborations que em 2017 expôs dezenas de casos envolvendo estruturas empresariais em Malta, muitas das quais associadas a estratégias de evasão fiscal.
A revelação de Rui Pinto foi feita esta quinta-feira numa publicação na rede social Twitter, num perfil que lhe está associado e que os seus advogados nunca contestaram.
“De acordo com o último relatório de combate à fraude e evasão fiscal elaborado pela Autoridade Tributária, e citado pelo semanário Expresso na sua edição do passado sábado, foram desencadeadas ações de investigação tributária no âmbito de casos mediáticos como o Swiss Leaks, Malta Files e Panama Papers. Aproveito então para revelar que sou um dos denunciantes dos Malta Files”, pode ler-se na mensagem de Rui Pinto.
Preso preventivamente em Lisboa desde março, depois de ter sido detido em Budapeste em janeiro, Rui Pinto é acusado pelo Ministério Público de um total de 147 crimes, incluindo extorsão na forma tentada, sabotagem informático, acesso ilegítimo e violação de correspondência. A acusação baseia-se na informação recolhida pela Polícia Judiciária e pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) após queixas feitas em 2015 pelo fundo de investimento Doyen e pelo Sporting, na sequência de ataques aos seus sistemas informáticos que culminaram com a publicação de dezenas de documentos no blog Football Leaks.
Rui Pinto já se defendeu, em interrogatório, admitindo ser um dos denunciantes do Football Leaks, mas não o único. Os seus advogados pediram que na fase de instrução seja declarada a nulidade de dezenas de crimes de violação de correspondência relativos a pessoas (sobretudo do Sporting e da sociedade de advogados PLMJ) que declararam não pretender agir judicialmente contra Rui Pinto. A defesa de Rui Pinto também alega que ele não pode ser julgado em Portugal por tentativa de extorsão à Doyen, já que quando o ataque informático ocorreu Rui Pinto não estava em Portugal e a Doyen também não tem qualquer presença no nosso país. Recentemente, Rui Pinto admitiu que alguns dos seus atos possam ser considerados ilegais, mas criticou o que diz ser “uma perseguição violenta” do Estado português.
Na sua última publicação no Twitter Rui Pinto questiona também o interesse das autoridades portuguesas no combate à corrupção. “Até quando o Ministério Público português vai continuar a ignorar diretivas comunitárias e convenções internacionais como a convenção de Mérida?”, pode ler-se na mesma mensagem. A convenção de Mérida foi assinada nesta cidade mexicana em dezembro de 2003, sendo formalmente designada “Convenção da ONU contra a Corrupção”, tendo levado as Nações Unidas a apontar o dia 9 de dezembro como Dia Internacional de Luta contra a Corrupção.
Os Malta Files foram uma investigação jornalística levada a cabo pelo EIC, de que o Expresso faz parte, em 2017, identificando dezenas de cidadãos e empresas de vários países com sociedades em Malta, muitas delas aproveitando a possibilidade de reduzir a 5% a taxação efetiva dos seus rendimentos.
Um dos artigos então publicados pelo Expresso revelou como 48 sócios portugueses da Deloitte montaram uma estrutura empresarial em Malta para a partir daí distribuir para as suas empresas em Portugal mais de 50 milhões de euros de rendimentos provenientes principalmente de Angola.
A história revelada pelo Expresso levou a Autoridade Tributária a desencadear uma inspeção que permitiu ao Estado recuperar, em 2018, um total de €9 milhões junto dos sócios portugueses da Deloitte, que em face da iniciativa do fisco voluntariamente decidiram pagar aquele montante e evitar que o processo chegasse aos tribunais.
A arrecadação destes €9 milhões na sequência dos Malta Files foi o maior resultado conseguido pela Autoridade Tributária no âmbito das ações especiais que o fisco desencadeou após uma série de investigações jornalísticas, superando inclusive a receita fiscal conseguida nos processos tributários resultantes dos Panama Papers e do Swiss Leaks. A Autoridade Tributária não detalhou quaisquer resultados associados ao Football Leaks.
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