Futebol internacional

Isto é o fim, bonito amigo. Lionel Messi já não era do Barça e não voltará a ser

Isto é o fim, bonito amigo. Lionel Messi já não era do Barça e não voltará a ser
PAU BARRENA/Getty

Não é que fosse há muito anunciado, mas, em anos recentes, já tinha ficado no ar a ideia de que o argentino poderia sair do Barcelona. Desde 1 de julho que, na prática, não há contrato que ligue jogador e clube, mas agora, apesar de terem acordo para renovar contrato, houve "obstáculos económicos e estruturais" da La Liga a confirmarem a separação. E o Barça oficializou-o: Messi não vai mesmo renovar com o único clube pelo qual jogou enquanto sénior

A memória pode ser matéria ferrugenta no cérebro, pelo menos poderá ser empoeirada, mas, feito um leve sopro, todos sabemos o que aconteceu no verão passado, quando também era agosto e uma bomba figurada rebentou com ondas de choque no futebol, numa modalidade inteira, até nos alcances do léxico: Lionel Messi enviara um burofax a informar o Barcelona de que iria acionar uma cláusula no contrato para abandonar o clube.

O termo não era mais do que uma espécie de carta registada e o imbróglio calamitoso com Josep María Bartomeu, o então presidente do Barça, resolver-se-ia com tréguas - seria ele, com quem as agulhas do argentino não se acertavam, a ir embora. O clube já endividado até ao tutano, cambaleante desportivamente e caótico na gestão fora do campo ficou com sua coqueluche por mais uma temporada.

O que antes parecia um casamento infinito era, cada vez mais, uma relação barrenta. Mas Lionel Messi permaneceu no Barcelona por mais uma época, salpicando o relvado de Camp Nou com uma triste genialidade, triste por não ser presenciada, há sempre alguma dose de tristeza quando a arte é feita para ninguém a ver de perto.

E nesta quinta-feira de verão, quase um ano depois, ficou confirmado que Messi equipado à Barça, a jogar pelos catalães, já é coisa de miragens. O clube confirmou que não haverá renovação de contrato com o argentino, seria a 10.ª, devido a "obstáculos económicos e estruturais" relativos a "uma normativa da La Liga", toda uma justificação que é um chapéu a dar sombra a vários problemas.

O sóbrio comunicado através do qual o clube o anunciou é o cume de vários erros: na gestão desportiva, nas compras que não compensaram vendas, nos salários exorbitantes dados a jogadores que pouco acrescentaram em campo, na escolha de treinadores, nas contas endividadas do clube e, enfim, no contexto que se foi colocando a desajeito para uma equipa de futebol render o que deveria.

Ainda mais, uma equipa que tem Lionel Messi e logo fica quase obrigado a ganhar todos os jogos e competições, condição que o argentino é conhece desde 2001/02, quando chegou adolescente e carente de injeções hormonais a Barcelona para crescer, e como ele cresceu. Foram quase 20 anos de um delírio epicamente concretizado com uma bola nos pés do argentino, a quem as 10 ligas espanholas, as quatro Liga dos Campeões ou as seis Bolas de Ouro continuam a não fazer jus.

Antes de o ver a ganhar via-se Lionel Messi a jogar, à falta de melhor termo, porque jogar pareceu muitas vezes ser o que todos os outros homens que coincidiam com o argentino em campo estava a fazer enquanto ele fazia outra coisa que não era só jogar. Era ser Messi.

LLUIS GENE/Getty

E o tempo, o sucesso, a sua genialidade e os bolsos que o Barcelona lhe foi enchendo (porque sim, o futebol é uma profissão), por vezes davam a impressão que a lenda do argentino iria acabar onde começara, mesmo com o que sabemos que Messi fez no verão passado.

Lionel quis mesmo ir embora e abdicar dos cerca de €138 milhões que recebia por ano, quantia que estaria disposto a cortar em metade, escreve o "El País", para agora renovar contrato com o Barcelona, já presidido de novo por Joan Laporta. Nem um líder que cai no goto do argentino impediu o fim anunciado.

Porque a 1 de julho isto já tinha acontecido, esse foi o dia até ao qual o contrato entre Messi e o Barcelona vigorava, mas a relação entre jogador e clube, mesmo depois de tanto, ainda era tão percecionada como umbilical que nem assim eles pareciam ter acabado.

Terão acabado, defende o Barça, por causa dos tais "obstáculos" erguidos pela "normativa da La Liga", que mais não são do que um teto salarial imposto - tendo gastado €506 milhões em ordenados na última época, o clube não poderia ultrapassar os €347 milhões nesta que se está a iniciar. Nem com as supostas cedências do argentino houve jogo na cintura do clube para destapar outros sítios para tapar o que pediria o futebolista.

As duas partes, contou o Barça, "lamentam profundamente que finalmente não se possam cumprir os desejos tanto do jogador, como do clube", algures neste palavreado estará a verdade que sucederá ao que, pela primeira vez, já não é um rumor escrever sobre Lionel Messi - não é jogador do Barcelona.

Agora haverá mesmo um Futebol Clube Sem Messi, o dia haveria de chegar e sempre se julgou que chegaria não sem antes a idade ganhar ao argentino, ou ser a saudade da pátria a ganhar-lhe. Lionel Messi tem 34 anos, a flor da idade já murcha, mas sugerir que não será titularíssimo e jogador-sol para qualquer equipa do mundo orbitar à sua volta seria escrever uma mentira.

Foram 778 jogos e 672 golos na bonita amizade futebolística entre Lionel Messi e o Barcelona. Ela acabar, à falta de outras razões conhecidas, por causa de um teto salarial é uma tragédia anti-natura no futebol. Afinal, talvez não seja suficiente atirar dinheiro para cima dos problemas à medida que forem aparecendo.

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