Futebol internacional

Franz Beckenbauer (1945-2024): partiu a lenda maior do futebol alemão

Franz Beckenbauer (1945-2024): partiu a lenda maior do futebol alemão
Peter Robinson - EMPICS
O kaiser, campeão do mundo como jogador e treinador e tricampeão europeu pelo Bayern Munique, faleceu aos 78 anos. Bola de Ouro em 1972 e 1976, a sua influência marcou os últimos 50 anos do futebol alemão
Franz Beckenbauer (1945-2024): partiu a lenda maior do futebol alemão

Pedro Barata

Jornalista

Os horrores da Segunda Guerra Mundial estavam a silenciar-se quando, em setembro de 1945, Franz Beckenbauer nasceu, em Munique. Filho de um trabalhador dos correios que estava longe de ser um apaixonado pelo futebol, o pequeno Franz cresceu a admirar Fritz Walter, herói da seleção alemã de 1954, a primeira a vencer o Mundial. Anos depois, Beckenbauer superaria o seu ídolo, conquistando um lugar único na história do futebol alemão.

Aos 78 anos, morreu Franz Beckenbauer, um dos maiores nomes da história do jogo. A notícia foi avançada pela agência DPA, citando fontes da família do kaiser.

Beckenbauer começou a jogar no SC Munich '06, um pequeno clube onde fez a formação. O jovem era adepto do Munich 1860, mas quis o destino que, em 1958, um encontro entre o Munich '06, em que atuava, e o Munich 1860, do qual era adepto, terminasse com confrontos físicos. Esse episódio seria decisivo para que, anos mais tarde, Franz optasse por rumar ao Bayern, o outro grande de Munique. E o futebol alemão nunca mais foi o mesmo.

Com um estilo autoritário e imponente, partindo da defesa mas avançando com a bola controlada de forma elegante, de cabeça erguida e gesto confiante, Beckenbauer, central com cérebro de médio organizador e pés de craque, dominou o futebol europeu durante vários anos. O primeiro passo foi a hegemonia do futebol alemão: até à chegada do kaiser — alcunha que se deve à sua personalidade e influência no relvado —, o Bayern só fora uma vez campeão nacional. Com Franz, que somou 584 encontros e 74 golos pelos bávaros, conquistou a Bundesliga cinco vezes.

Dominada a Alemanha, o Bayern de Beckenbauer elevou-se para se transformar na grande potência do futebol continental. Liderado pelo herói que nascera em Munique, o gigante da Baviera foi campeão europeu três vezes seguidas, em 1973/74, 1974/75 e 1975/76. A partir daquela era de conquistas, nunca mais o Bayern perdeu o estatuto de temível potência do futebol continental.

A influência da lenda que agora parte estendeu-se à seleção alemã, que representou em 103 ocasiões. Foi campeão da Europa, em 1972, e do Mundo, em 1974, contribuindo para bater, na final, a “laranja mecânica” de Johan Cruyff.

No ocaso de uma carreira em que ergueu 19 títulos, bem como a Bola de Ouro em 1972 e 1976, o bávaro ainda foi jogar para os Estados Unidos da América, na primeira grande vaga de crescimento do soccer. No mítico Cosmos, onde se retirou em 1983, partilhou equipa com Pelé.

A ligação de Beckenbauer ao crescimento do futebol alemão é umbilical, sendo marcada pelo estilo de jogo único do kaiser, pelos títulos ou por imagens como a do grande líder a atuar de braço ao peito, após partir a clavícula, durante a meia-final do Mundial 1970, contra a Itália. Como homem que nunca saiu da primeira cena da relevância futebolística, depois da carreira de futebolista chegou a glória como técnico.

Em 1990, no Mundial de Itália, levou a Alemanha ao título de campeão. Foi o segundo homem a ganhar o troféu como jogador e técnico, depois de Mário Zagallo, que partiu dois dias antes do alemão. Também o francês Didier Deschamps, que ganhou como futebolista em 1998 e como treinador em 2018, logrou a proeza.

Como jogador ou técnico, Beckenbauer catapultou o futebol alemão rumo ao seu estatuto de força internacional, com papel ativo, no campo ou no banco, nos anos 60, 70, 80 e 90.

Controvérsias enquanto dirigente

Na viragem de século, o bávaro trocou o relvado pelos gabinetes, continuando a assumir papéis de destaque. No entanto, a sua vida enquanto dirigente ficou marcada por várias acusações de corrupção ou suborno, nomeadamente devido à atuação enquanto figura dos corredores de poder da FIFA, muito ligado à atribuição dos Mundiais.

O alemão, que foi presidente do Bayern Munique mais de 10 anos na viragem do século, liderou a bem-sucedida candidatura da Alemanha ao Mundial 2006, mas, em 2016, o comité de ética da FIFA abriu uma investigação contra Beckenbauer, devido a suspeitas quanto a pagamentos ilegais feitos pela proposta alemã. Durante a investigação, levantaram-se também dúvidas quanto a uma transferência de €1,7 milhões feita a Beckenbauer, alegadamente pela federação de futebol da África do Sul, que viria a ganhar a corrida para o Mundial 2010. Franz, que não foi condenado em nenhum dos casos, sempre negou qualquer irregularidade.

Em 2014, foi suspenso por 90 dias pelo comité de ética da FIFA por recusar a cooperar nas investigações dos casos de corrupção que envolveram a atribuição dos Mundiais de 2018 e 2022 à Rússia e ao Catar, respetivamente.

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