O Real Madrid não gostou da ideia com que a La Liga engraçou, ao tê-la aprovado, de realizar um jogo do campeonato espanhol no estrangeiro, em específico o Barcelona-Villarreal, marcado para a 17.ª jornada. Tanto os clubes como a entidade que organiza a prova, além da Federação Espanhola de Futebol (RFEF) aprovaram que a partida seja deslocada para Miami, nos EUA, mas os merengues torcem o nariz à proposta, criticando que coloca em causa “a integridade da competição” ao ameaçar “o princípio essencial da reciprocidade territorial”.
Que é como quem diz: desvirtua uma das bases aceites de um campeonato onde os adversários se defrontam duas vezes e cada um o faz com um encontro no seu estádio, condição comum a todas as equipas. “Alterar unilateralmente este regime rompe a igualdade entre os competidores, compromete a legitimidade dos resultados e cria um precedente inaceitável que abre a porta a exceções baseadas em interesses alheios ao estritamente desportivo”, contestou o Real Madrid, piúrço ao defender que se a partida se realizar nos EUA tal representará “um antes e um depois no mundo do futebol”.
Espanha nem é estranha a exportar jogos de competições nacionais, muito menos o Real Madrid é alheio a tal: desde 2019 que um reformulado formato da Supertaça do país, em regime de final four, é disputado, a meio da época, na Arábia Saudita.
E este é o mesmo Real Madrid que pretendia algo nesses moldes há uns anos, quando, em abril de 2021, empunhando a ideia da Superliga, desafiou a lógica atual das provas europeias de clubes, ao ser um dos defensores-mor da ideia de criar uma competição privada, fora da esfera da UEFA, que juntasse as supostas 'melhores' equipas do continente, escolhidas a dedo para uma prova fechada, sem direito a promoções ou despromoções. O mesmo Real Madrid que caso levasse a sua avante, seria castigado pela UEFA com a proibição de jogar na La Liga e em qualquer prova do futebol espanhol.
Nesta circunstância, é do Real Madrid a voz institucional que mais se está a opor a uma ideia aprovada pela La Liga e RFEF, numa simbiose de intenções que não se verificou no final da década passada. Durante a época 2018/19, a entidade que regula o campeonato espanhol autorizou que o Girona-Barcelona pudesse ser disputado também nos EUA, mas a federação rejeitou a proposta, que depois chegou aos tribunais para a justiça do país acabar por bloquear o intento.
Viviam-se, contudo, outras lideranças das entidades, por arrasto outros contextos: quem mandava na La Liga já era Javier Tebas e era conhecida a animosidade que partilhava com Luis Rubiales, o então presidente da RFEF, entretanto caído em desgraça devido ao caso de assédio sexual vindo do polémico beijo que deu à jogadora Jenni Hermoso, na final do Mundial feminino de 2023.
As faíscas relacionais de hoje afetam mais o que existe entre a cúpula da Federação Espanhola de Futebol e Florentino Pérez, presidente do Real Madrid, em particular desde a súbita erupção, em 2021, da vontade em criar uma Superliga, projeto ainda apoiado pelo clube merengue e que desde o primeiro momento recebeu o público e voraz antagonismo da parte de Javier Tebas.
No caso deste Barcelona-Villarreal da 17.ª jornada da La Liga, que seria jogado a 20 ou a 21 de dezembro no Hard Rock Stadium - onde se realizou o encontro inaugural do Mundial de Clubes -, as únicas vozes presentes no processo de decisão que votaram contra a ideia, escreveu o “El País”, foram as de David Aguanzo, representante da Associação de Futebolistas Espanhóis que se queixou de os jogadores não serem ouvidos, e de Miguel Ángel Nadal, antigo internacional (e tio de Rafael Nadal) e dirigente da RFEF encarregue de trabalhar para o desenvolvimento da seleção nacional.
A contestação feita pelo Real Madrid à exportação para Miami, cidade onde a comunidade da América Latina tem uma forte presença, do jogo da La Liga, assenta igualmente na carência de “um acordo expresso e unânime” entre todos os 20 clubes do campeonato espanhol. Mesmo aprovado pelas duas maiores entidades do futebol em Espanha, a deslocação da partida terá de receber o aval da UEFA para que essa petição seja enviada à FIFA, a que compete dar o definitivo aval à proposta.
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