Jogos Olímpicos de Paris 2024

O hábito que Yolanda Hopkins mantém, lá longe no Taiti, de ser a melhor surfista portuguesa nos Jogos Olímpicos

O hábito que Yolanda Hopkins mantém, lá longe no Taiti, de ser a melhor surfista portuguesa nos Jogos Olímpicos
BEN THOUARD/Getty
Não se sabe onde vai parar, mas, pela segunda edição seguida dos Jogos, a algarvia que vive no Alentejo será a melhor surfista vinda de Portugal na prova. Após o 5.º lugar e o diploma em Tóquio, Yolanda Hopkins está nos oitavos de final em Teahupo'o, a quase 16 mil quilómetros de Paris e bem dentro da história portuguesa no surf olímpico. E ela avisa, sem cerimónias: “Espero que venhamos a ter melhores ondas, porque quero dar show

O humor cândido, banhado a boa-disposição, nunca dispersa muito para longe de Yolanda Hopkins. Antes de se aventurar, por uma segunda vez, nas águas do Taiti, a surfista que como todos os restantes está literalmente a boiar à margem do seu local de competição, hospedada num cruzeiro luxuoso com vista para a tenebrosa onda de Teahupo’o, decidiu ir às redes sociais anunciar o seu regresso ao mar com uma pitada de gozo próprio: publicou uma fotografia em que surge a dar um salto mortal no ar, a ir de cara à frente ao descolar de uma onda e estatelar-se na água. “Tive que postar esta fotografia primeiro porque está muito boa”, escreveu, fechando a frase com quatro emojis risonhos a atestarem a sua personalidade.

O contraste apareceu na segunda imagem. Yolanda surge com uma mão agarrada à prancha, decidida e composta, a descer uma onda num take-off bem-sucedido e a precipitar-se para dentro de mais uma cova formada por cada abertura de garganta vista em Teahupo’o. “A segunda fotografia é como eu quero que aconteça”, esperançou, ainda no domingo, horas antes de retornar ao mar para fazer acontecer o que desejava e sobreviver à ronda de eliminação da prova de surf.

Na mira das covas do sorriso da portuguesa esteve Saffi Vette, neozelandesa que nas ondas tímidas da madrugada desta segunda-feira não congeminou uma prestação além dos 1,27 pontos e dos 4,27 de Yolanda Hopkins, igualmente humilde no resultado se bem que suficiente para atingir os oitavos de final. “Foi um heat com poucas oportunidades. Acabei por ganhar com estratégia e não só pela força do meu surf”, radiografou a surfista algarvia com residência em Sines, no Alentejo, longe dos holofotes que a vida das pranchas situa uma centena de quilómetros mais a norte, no resto dos dias, meses e anos em que não há Jogos Olímpicos.

Quando se vira a esquina e aparece a excelsa prova, a mais rara e de ardiloso acesso que há, não existe português melhor a fazer-se às suas ondas. Em Tóquio, foi Yolanda, a surfista que então penava por não ter patrocínios, a alcançar as meias-finais e sair do Japão com um 5.º lugar e respetivo diploma olímpico. Agora no Taiti, na assustadora Teahupo’o, onda ainda tímida nas suas espreguiçadelas sobre um fundo de coral que nem a dois metros de profundidade está de dentes afiados, é Yolanda, que nunca se qualificou para o circuito mundial de surf, a única a subsistir em prova.

A irradiar candidez de sorrisos, a surfista de 26 anos vai defrontar a Brisa Hennessy, costa-riquenha que habita no dito Championship Tour da World Surf League (WSL), logo habituado bem mais do que Yolanda Hopkins a saltar para a água de Teahupo’o com um capacete na cabeça. Se tem o mesmo apetite para abocanhar, de dentes afiados, a oportunidade para brilhar, está para ser visto.

As duas vão ao mar pelas 3h da madrugada desta segunda-feira e Yolanda Hopkins, em antecipação, fez figas com vagas maiores, que necessariamente implicam perigos também mais vastos para quem ousa surfar em Teahupo’o, mas ela mira os benefícios antes de atentar aos possíveis trejeitos ameaçadores do lugar. “Espero que venhamos a ter melhores ondas porque quero dar mais show no próximo heat”, garantiu.

E isto são palavras de quem saliva por vincar ainda mais a sua pegada na história, dê os trambolhões nas ondas que precisar de dar.

A eliminação de Teresa Bonvalot

Já Teresa Bonvalot foi afastada da competição pela japonesa Shino Matsuda, na repescagem. A surfista natural de Cascais, nona em Tóquio2020, liderou praticamente o primeiro heat da eliminatória, mas um tubo levou Matsuda para a liderança, com 9,77 pontos (7,67 e 2,1).

“O evento para mim acabou. Claro que queria mais, como qualquer atleta que sonha com isto, mas demonstrei a raça do povo português e a minha raça. Tentei levar a bandeira portuguesa bem alto em condições com que não estamos tão familiarizadas, mas tenho de ser mais meiga para mim mesma e olhar para o lado positivo. Estar aqui e fazer parte destes Jogos pelo meu esforço é algo de que não me irei esquecer. Mas tenho mais vontade ainda de me classificar para os próximos Jogos. Por mim e por todos os portugueses”, salientou.

João Aranha, presidente da Federação Portuguesa de Surf, elogiou o desempenho das surfistas lusas e manifestou confiança num bom resultado de Yolanda Hopkins.

“Estamos a viver momentos históricos nestes Jogos Olímpicos, com a Teresa e a Yolanda a representarem com brio e coragem o nosso país e o nosso surf. Esta onda de Teahupo’o é uma onda única e que requer muita coragem, perícia e alguma sorte. A Teresa não teve a sorte do seu lado, mas só podemos agradecer-lhe o empenho e o trabalho. Faltou-lhe essa ponta de sorte. Felizmente, a Yolanda conseguiu passar esta ronda e continua em prova graças também a uma grande inteligência competitiva e muita atitude. Agora vamos todos torcer por ela, sabendo que tem qualidade para ombrear com as melhores”, referiu.

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