Jogos Olímpicos de Paris 2024

Há 10 anos, Mollie O’Callaghan não tinha dinheiro para competir. Agora, é recordista olímpica ao lado da amiga

Há 10 anos, Mollie O’Callaghan não tinha dinheiro para competir. Agora, é recordista olímpica ao lado da amiga
Sarah Stier

Uma década depois de a mãe ter precisado de angariar fundos junto da vizinhança para que ela pudesse competir, Mollie O’Callaghan tornou-se recordista e campeã olímpica nos 200 metros livres. Para isso, destronou Ariarne Titmus que, mesmo perdendo, ficou feliz pela amiga que também é sua rival

Mollie O’Callaghan é uma daquelas nadadoras que não espera pela voz robótica que diz take your marks para fletir os joelhos e agarrar a ponta do bloco de partida. A postura cria um falso sentimento de estar um passo à frente da concorrência. Na pista do lado esquerdo de O’Callaghan, na final dos 200m livres, a australiana tinha a compatriota Ariarne Titmus, campeã olímpica que, 1:53.27 depois, deixaria de o ser.

Assim que mergulharam, foram a sombra de fato verde e touca amarela uma da outra. A chegada ao sensor ditou uma separação de cerca de meio segundo. Mollie O’Callaghan bateu o recorde olímpico e arrecadou a medalha de ouro. Ariarne Titmus ficou-se pela prata. A vizinhança das pistas permitiu-lhes de imediato partilharem um abraço antes de saírem da água e celebrarem em conjunto.

No pódio, o hino tocado serviu o interesse musical de ambas. O treinador, Dean Boxall, conhecido pelas comemorações excêntricas, também não terá ficado desagradado, até porque a estratégia utilizada na preparação das duas atletas foi feita a pensar naquele momento. No St. Peters Western Swim Club, em Brisbane, um complexo desportivo ao ar livre, foi colocada uma maquete da Torre Eiffel para acicatar o desejo por medalhas nos Jogos Olímpicos de 2024

Para já, esse vai sendo um objetivo conseguido por parte de Dean Boxall. Ariarne Titmus brilhou em Tóquio com medalhas nos 400m livres, onde bateu Katie Ledecky, e nos 200m livres. No Japão, Mollie O’Callaghan só tinha mesmo alcançado o pódio nas estafetas. Explodiu mais tarde nos mundiais de Fukuoka e Budapeste pelo que Paris está a ser o seu momento de afirmação olímpica.

Em 2014, Toni, a mãe de Mollie, teve que organizar uma angariação de fundos de modo a conseguir o dinheiro suficiente para que a filha estivesse presente nos campeonatos australianos de desporto escolar, em Melbourne. Os custos estimados eram de cerca de 3.000 euros. Só um fato minimamente adequado para competir ao mais alto nível rondaria os 180, um preço elevado para a família oriunda da região rural de Logan City, cidade na periferia de Brisbane. O dinheiro obtido com a ajuda da vizinhança permitiu a Mollie ir vestida a rigor para a competição. Uma década depois, está a sentir a aragem que sopra no topo.

“Ver a minha mãe e o meu pai mexeu um pouco comigo, nado principalmente para eles. Eles dedicaram muito tempo para eu poder nadar em criança. Não estaria aqui sem eles”, confessou O’Callaghan no canal australiano 9News.

A relação com Ariarne é tão próxima que até a flash interview depois da prova foi realizada em conjunto. “Eu sei o que é ser campeã olímpica e estou feliz que a Mollie esteja a sentir isso agora”. Titmus disse ser “especial” subir ao pódio com uma colega de equipa, parecendo que não a incomodar ouvir o hino australiano a partir de uma plataforma mais baixa. “Estou muito orgulhosa por fazer parte desta era da natação e estou na lua com a prata”.

Mollie O’Callaghan tem apenas 20 anos. Ariarne Titmus já vai nos 23. Neste momento, a rivalidade saudável de ambas implica que, para uma ganhar, a outra tenha que perder. Num embate que está para durar, é este o perigo de se fazer amigos no outro lado da barricada.

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