O mergulho solitário de Katie Ledecky, a imbatível da maratona na piscina
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Nos 1.500 metros livres, prova que domina há mais de uma década, a norte-americana sagrou-se, pela oitava vez, campeã olímpica, chegando às 12 medalhas em Jogos. Foi, como quase sempre com ela nesta distância, um esforço praticamente feito a solo. Anastasia Kirpichnikova foi prata, Isabel Gose foi bronze
Nadar 30 vezes uma piscina que, de uma ponta à outra, mede 50 metros é muito nadar. São muitos minutos. Em certo dia de 2013, uma jovem de 16 anos recém-feitos fê-lo em 15:36.53 minutos, a marca mais rápida de sempre para qualquer nadadora. Essa rapariga já conquistara, um ano antes, um ouro olímpico. Dois registos históricos para uma miúda do secundário.
Essa miúda tornou-se mulher. Uma mulher que, por sinal, não deixa que calem a sua voz. Uma mulher que não parou de ganhar. Lembram-se do tal recorde de 2013? Bateu-a uma vez. E outra. E outra. E outra. E mais uma. Superou-o cinco vezes, até chegar aos 15:20.48 minutos, 16 segundos abaixo do seu recorde inicial, é o melhor tempo de sempre numa mulher nos 1.500 metros livres.
Aquela jovem estrela tornou-se lenda. Uma lenda ao nível das maiores lendas. Lembram-se daquele ouro olímpico de 2012, com 15 anos? Seguiram-se mais sete, num total de 12 medalhas olímpicas.
O último ouro foi, claro, nos 1.500 metros livres, a sua prova. Pelos terceiros Jogos Olímpicos seguidos, Katie ganhou a distância mais longa da piscina, esta prova-maratona.
Na La Defénse Arena, Ledekcy fez a prova esperada. Concluído o primeiro terço da competição, a vantagem que detinha já era enorme, levava já mais de um corpo de vantagem para toda a gente. Ganhou com 15:30.02, novo recorde olímpico, a uma enorme diferença das restantes competidoras, um passeio envolto numa maestria suprema para uma das maiores figuras da história olímpica. Anastasia Kirpichnikova deu mais uma prata para a França, com 15:40.35, Isabel Gose, alemã, foi bronze, completando as 30 piscinas em 15:41.16.
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Desde cedo que o ambiente no enorme pavilhão que recebe a natação era de noite histórica. Afinal de contas, aqui nadaram ou nadarão, separados por menos de duas horas, León Marchand, Zac Stubblety-Cook, David Popovici, Pan Zhanle ou Kyle Chambers.
Talvez uma boa forma de aferir a importância de um evento nesta Paris olímpica seja a segurança. Sim, em qualquer local é preciso passar controlos e controlos, barreiras e barreiras, mas, nesta sessão noturna na La Defénse, foi tudo ainda mais apertado, ainda mais exigente, ainda mais desconfiado.
A primeira campeã olímpica do serão foi Sarah Sjöström, sueca que se impôs nos 100 metros livres, repetindo o triunfo de 2016 e obtendo a quinta medalha olímpica, ela que tem a incrível marca de 23 caricas individuais em Mundiais. A prata foi para Torri Huske, dos EUA, e o bronze para Siobhán Haughey, de Hong Kong.
Às 21h16 locais, chegam as oito finalistas dos 1.500 metros livres. Ledecky é, de longe, a mais aclamada, louvada por um público que a ama, não só gente dos EUA, mas de todo o mundo. É um ícone, um símbolo olímpico.
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Antes de se ouvir o sinal de partida, faz-se silêncio. Aquele instante enche a arena de silêncio. Ouve-se a alemã Isabel Gose a bater violentamente com os braços nas pernas e arrancam.
Arrancam para a viagem solitária de Katie Ledecky, mais de 15 minutos de esforço sem companhia, sem nenhum mulher por perto. A meio da prova, a segunda classificada, a francesa Anastasia Kirpichnikova, já está a seis segundos da mulher dourada. Em que pensará Ledecky ao nadar tanto tempo sozinha?
Enquanto a marcha solitária de Ledecky prosseguia, era impossível não contemplar a grandeza que, naquelas águas, deslizava, sem atrito, tecnicamente perfeita. Contabilizando apenas Jogos de verão, só Phelps (23 ouros), Carl Lewis (nove), Mark Spitz (nove), Paavo Nurmi (nove) e Larisa Latynina (nove) foram mais vezes campeões que ela. Katie é, também, um tributo à longevidade. Anda nisto há tanto tempo que é possível vê-la num vídeo de 2012, cara de criança, numa coreografia que a equipa de natação dos EUA fez para os Jogos de Londres ao som de “Call me Maybe”.
Atrás da vencedora que o era antes de começar, Kirpichnikova, Simona Quadarella e Isabel Gose protagonizaram uma intensa disputa pelo pódio. Ledecky teve tempo de terminar, encostar-se às pequenas bóias que separam cada pista e assistir à disputa. Seria a francesa a terminar em segundo, mais uma medalha para a festa dos anfitriões, que andam cheias delas por estes dias. A alemã foi terceira.
Todas longe, muito longe de Ledecky. Há 12 anos, em Londres, uma adolescente iniciava uma viagem olímpica. Agora, em Paris, uma mulher prossegue-a, oito ouros e 12 medalhas depois