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Jogos Paralímpicos

Oksana Masters foi vítima de abusos e da radiação de Chernobyl. Nos Jogos Paralímpicos, quer o ouro e continuar a ser uma rosa

Oksana Masters foi vítima de abusos e da radiação de Chernobyl. Nos Jogos Paralímpicos, quer o ouro e continuar a ser uma rosa
Tom Pennington

Nasceu na Ucrânia com deficiências provocadas pelo desastre nuclear. Depois, foi entregue pelos pais biológicos a um orfanato, porque achavam que não ia viver durante muito tempo. Entre os cinco e os sete anos foi agredida sexualmente todas as noites. Oksana Masters foi adotada sabendo que as suas duas pernas teriam que ser amputadas. Ao serviço dos Estados Unidos, com 35 anos, vai a Paris em busca de novo ouro no paraciclismo

“Tinha seis dedos em cada pé e achava que era a coisa mais cool do mundo.”

A fotografia foi tirada a preto e branco. Oksana Masters fitava a objetiva num registo intenso, implacável, bruto. Deixara de existir inocência nos olhos desobstruídos pela franja bem aparada. Os lábios, aos quais parecia ter sido negado o direito a sorrir, desenhavam uma linha reta. As sobrancelhas estavam contraídas. Era com um dócil vestido salpicado de corações e com um laço atado numa latitude ligeiramente acima da cintura que a figura insensível se vestia.

Foi através daquela imagem que Gay Masters soube que queria adotar a criança que nela se apresentava, resgatando-a de um orfanato ucraniano. Foi a quem viu algo para lá do seu aspeto que Oksana mais agradeceu, décadas mais tarde, em 2020, quando ganhou o prémio Laureus atribuído à melhor atleta com deficiência. “Muito obrigado à pessoa número um de toda a minha vida. Mãe, obrigado por estares aqui. Obrigado por me salvares e me dares uma segunda oportunidade.”

Na mesma fotografia em que Gay Masters viu a cara séria de Oksana e a aperaltada indumentária também estavam as pernas torcidas e as mãos enrugadas com dedos de um tamanho desproporcional para a idade. Oksana nasceu em 1989, três anos depois do desastre nuclear de Chernobyl e coube-lhe herdar os efeitos da radiação.

Nos Jogos Paralímpicos 2024 vai representar os Estados Unidos no ciclismo com uma tatuagem de uma rosa a desfalecer – metade vermelha, metade preta e branca –, que toca na cicatriz ao fundo da barriga. Picotada junto da flor está a legenda: “Uma rosa ainda é e vai ser sempre uma rosa.” De próteses cruzadas, Oksana explicou numa entrevista ao programa “In Depth”, do jornalista Graham Bensinger, que eternizar o desenho na pele foi uma forma de “rescrever” a sua história de vida. Por muito que o seu corpo esteja “manchado”, ainda se considera “merecedora” de se “sentir amada e bonita”.

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