Jogos Paralímpicos

Do reality show às medalhas no voleibol adaptado: Morteza Mehrzadselakjani, o segundo homem mais alto do mundo, que dorme no chão em Paris

Do reality show às medalhas no voleibol adaptado: Morteza Mehrzadselakjani, o segundo homem mais alto do mundo, que dorme no chão em Paris
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Mede 2,46m e houve tempos em que se isolava para evitar que, na rua, comentassem a sua altura. Depois de aparecer na televisão, foi contactado pelo selecionador nacional de voleibol sentado do Irão que quis contrar com ele na equipa. Os Jogos Paralímpicos de Paris podem dar-lhe a terceira medalha de ouro consecutiva

Hadi Rezaeigarkani perscrutava o televisor. A atenção que importantes tarefas pudessem estar a requerer naquele momento não merecia relevo. A caixa mágica mostrava-lhe um reality show que dava a conhecer pessoas com dificuldades atípicas no dia a dia. À sua frente, estava colocado um indivíduo de 2,46m e com a perna direita 15cm mais curta do que a esquerda. Era mesmo de alguém com aquelas medidas que estava a precisar para a sua equipa de voleibol sentado, desporto paralímpico.

A valiosa figura chamava-se Morteza Mehrzadselakjani. Estava a partilhar o testemunho de alguém sobredimensionado e sem escudo para se defender dos olhares alheios. Para si, parco em extravagância, tamanho chamariz era indesejado. Paupérrimo em soluções que contrariassem a vistoria de que era alvo, o interior de casa ficou com a exclusividade da sua presença. Isolado até então, o contacto de Hadi Rezaeigarkani mudou-lhe a vida.

Rezaeigarkani já era selecionador nacional de voleibol sentado do Irão. A abrangência dos braços de Morteza Mehrzadselakjani podia ser útil na sua equipa. Tratando-se do segundo homem mais alto do mundo, era improvável que qualquer adversário colocasse do outro alguém com igual capacidade de fazer a diferença por cima da rede. Morteza padece de acromegalia, uma doença que resulta da produção de hormonas de crescimento em excesso e, aos 15 anos, um acidente de bicicleta lesionou-lhe a bacia, motivo pelo qual a perna direita deixou de crescer.

Andy Lyons

Mesmo que sentando centímetros que ultrapassam a barra de uma baliza de futebol, a envergadura do oposto é uma ferramenta útil para fazer a bola cair no campo contrário. Os resultados por ela obtidos já vão sendo alguns. Nos Jogos Paralímpicos de Paris, o Irão pode conquistar a terceira medalha de ouro consecutiva. Além disso, desde que Morteza Mehrzadselakjani se estreou na equipa, em 2016, a seleção asiática venceu duas vezes o Mundial e duas vezes o torneio continental.

Foi no voleibol que o jogador de 36 anos encontrou uma maneira de se sentir incluído e, pela primeira vez, percebeu que o seu tamanho poderia ser usado de forma positiva e não meramente para ser contemplado sem consentimento. Porém, nem tudo na sua vida passou a decorrer com normalidade. A assimetria das pernas obriga Morteza Mehrzadselakjani a ter que alternar entre a cadeira de rodas e as muletas para se deslocar.

O Irão venceu os três jogos no grupo B dos Jogos Paralímpicos, terminando a fase inicial em primeiro lugar. Na meia-final, a equipa do Médio Oriente vai defrontar o Egito, enquanto que, no outro jogo, a Bósnia mede forças com a Alemanha. Ao longo dos dias de competição, Morteza Mehrzadselakjani tem dormido no chão, porque as camas disponibilizadas pela organização de Paris 2024 não se adaptam o seu corpo. “Ele tem um objetivo mais importante”, desvalorizou Hadi Rezaeigarkani ao “Olympics.com”. “Não importa se ele se vai deitar no chão ou se não vai ter comida suficiente. Ser campeão é o que lhe está na mente.”

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