Luís Franco-Bastos

“Estado Puro” #14. Humildes e com as poucas armas que tínhamos, vulgarizámos o poderoso Irão (por Luís Franco-Bastos)

“Estado Puro” #14. Humildes e com as poucas armas que tínhamos, vulgarizámos o poderoso Irão (por Luís Franco-Bastos)
Hector Vivas

Luís Franco-Bastos nasceu em Lisboa, nomeadamente num hospital privado. Licenciou-se em Ciências da Comunicação na Universidade Nova de Lisboa e a média com que concluiu o curso é, no seu entender, um assunto do foro privado. É humorista e proprietário de imóveis, mas sobretudo humorista. Foi contratado só para esta crónica e, se alguém do Expresso tiver dois dedos de testa, não se seguirá mais nenhuma colaboração

Duas horas antes do Portugal-Irão, fiz a antevisão do jogo na SIC. Soube no programa, em directo, os onzes iniciais das duas equipas e, perante isso, todo o meu comentário na antevisão consistiu essencialmente em afirmar que a troca de Bernardo Silva por Quaresma não fazia sentido.

Reiterei, aliás, que me parecia uma decisão racista por parte de Fernando Santos. “Quaresma é cigano, joga na Turquia, os adversários são iranianos, logo ele conhece-os dos almoços de família e oferece mais garantias que Bernardo Silva” - esta foi a minha interpretação das escolhas de Fernando Santos e repudiei-as veementemente. Por esta altura, só tenho pena que não tivesse sido mais racista ainda, porque faltaram mais 10 Quaresmas na Mordovia Arena.

Apesar de tudo, sou obrigado a admitir que Fernando Santos fez bem o trabalho de casa: Portugal, muito unido, com as armas que tinha, vulgarizou o poderoso Irão. Somos a prova de que, uma pequena equipa, como nós, pouco experiente, sem campeonatos da Europa conquistados recentemente nem grandes estrelas e muito distante dos lugares cimeiros do ranking da FIFA, com esforço, quase consegue ombrear com Irão e Marrocos, potências do futebol mundial.

Dificilmente algum dia os apanharemos no Ranking, mas isso são outros quinhentos. Estamos nos oitavos e todos nos perguntamos até onde pode ir este Portugal, uma equipa “pragmática”, que é o termo que se arranjou em 2018 para equipas que praticam um futebol miserável e, de alguma forma, se vão safando.

Fernando Santos lembra-me Jason Statham em “Crank”, um péssimo filme que recomendo a todos: a sua personagem, Chev Chelios, acorda um dia sabendo que foi envenenado e só tem uma hora de vida, e a única forma de o veneno não fazer efeito é manter um nível elevadíssimo de adrenalina no seu corpo.

Suspeito que o nosso seleccionador foi envenenado com a mesma droga: se, por ventura, tivermos um resultado que não seja absolutamente arrancado a ferros ao longo de 90 minutos do mais puro sofrimento e da mais inestética das exibições, em que ganhemos com um mínimo de tranquilidade, o seu coração pode parar. Daí engendrar este modelo de jogo que nos faz sofrer sem necessidade nenhuma contra quem quer que seja sem, porém, nunca perder. Assegura a sua sobrevivência, e também a nossa. De génio.

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