Magnus Carlsen, de 31 anos, campeão do mundo de xadrez, enfrentava, na Sinquefeld Cup de 2022, um jovem norte-americano de 19 anos, Hans Niemann, o pior classificado do ranking presente no torneio online. O resultado era previsível, tendo em conta a diferença de estatutos. Mas o norueguês, que levava 53 jogos sem derrotas e que até ficara com as peças brancas - ou seja, jogava primeiro - foi decaindo rapidamente e acabou por desistir.
Pouco depois do jogo, Carlsen deixou o torneio sem dar qualquer explicação. Faltavam seis rondas e o mundo da modalidade estava de boca aberta. Entretanto, o norueguês publicava nas redes sociais um vídeo de José Mourinho, em que este dizia: “Se eu falar, estou em grandes sarilhos”. A mensagem foi encarada como uma suspeita de batota. A 8 de setembro, a Chess.com, a maior plataforma online de xadrez, confirmou ter removido Niemann por batota do seu site.
O jovem norte-americano admitiu ter jogado menos limpo em duas ocasiões, através da ajuda do computador, mas nunca no tabuleiro. Niemann acusou então Magnus Carlsen de tentar destruir-lhe a carreira, chegando a dizer: “Se eles quiserem que eu me ponha todo nu, eu faço-o” - esta resposta terá vindo no seguimento de rumores de que Niemann usaria um brinquedo sexual anal para receber informações. “Não me interessa, porque eu sei que estou limpo. Querem que eu jogue numa caixa fechada sem transmissão eletrónica, não me interessa. Estou aqui para ganhar e esse é o meu objetivo, independentemente [do resto]”, disse o americano, citado pela BBC.
A Federação Internacional de Xadrez (FIDE) acabaria por repreender Carlsen por ter concedido abruptamente um jogo online a Hans Niemann. Numa declaração feita na sexta-feira, o organismo disse ao norueguês que “havia melhores formas de lidar com a situação”. No entanto, os responsáveis pelo xadrez mundial acrescentariam que partilham as preocupações de Carlsen acerca da batota no desporto e reiteraram uma “política de tolerância zero”.
Agora, Magnus Carlsen veio finalmente quebrar o silêncio, emitindo um comunicado em que tenta explicar o que aconteceu. “Sei que as minhas atitudes frustraram muita gente (…). Estou frustrado. Quero jogar xadrez”, diz o campeão.
“Acredito que a batota no xadrez é algo importante e uma ameaça existencial ao jogo. Creio também que os organizadores e todos aqueles que se preocupam com a ‘santidade’ do jogo que amamos deveriam considerar seriamente o aumento das medidas de segurança e dos métodos de deteção de batota no tabuleiro”, explica Carlsen, que confessa ter considerado a não participação na Sinquefeld, “quando Niemann foi convidado à última hora”. Acabou por participar.
Seguem-se as acusações graves: “Creio que Niemann tem feito mais batota – e mais recentemente – do que admitiu publicamente. A progressão dele no tabuleiro tem sido fora do comum. Ao longo do nosso jogo na Sinquefeld Cup, tive a impressão de que ele não estava tenso ou mesmo completamente concentrado”.
O norueguês diz que “algo deve ser feito acerca da batota”. “Não quero defrontar pessoas que jogaram repetidamente de forma menos limpa no passado, porque não sei o que serão capazes de fazer no futuro”, admite Magnus Carlsen, com um alvo implícito.
O jogador assume que teria mais para dizer, mas está “limitado” ao que pode revelar “sem a autorização explícita de Niemann”. “Até agora, apenas consegui exprimir-me com as minhas ações (…) que dizem que eu não estou disposto a jogar xadrez com Niemann. Espero que a verdade sobre o assunto venha ao de cima, qualquer que ela seja”, conclui o campeão do mundo de xadrez.
Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: piquete@expresso.impresa.pt