Mundial 2018

They're going home

O golo de Mandzukic que decidiu o Inglaterra-Croácia
O golo de Mandzukic que decidiu o Inglaterra-Croácia
Joosep Martinson - FIFA
A Inglaterra pôs-se a ganhar logo no início da segunda meia-final do Mundial 2018, mas isso foi o pior que lhe aconteceu: começou a jogar cada vez menos e a Croácia conseguiu chegar ao empate. E depois, no prolongamento, Mandzukic marcou (2-1) e mandou os ingleses para aquele sítio da música que tanto gostam de cantar: home
They're going home

Mariana Cabral

Jornalista

It's coming home
It's coming home
It's coming
Football's coming home
It's coming home
It's coming home
It's coming
Football's coming home

Em 1996, Inglaterra recebeu o Europeu de futebol com a sobranceria que lhe é habitual. Os ingleses não ganhavam - não ganham - nada desde 1966, mas a música que tomaram então como hino não oficial da prova, da banda Lightning Seeds, já dizia muito sobre o lugar que julgam ter no olimpo futebolístico: "Football's coming home".

Naquele ano, a música foi repetida pelos adeptos ingleses ad nauseam, mas quem levou o futebol para casa foi mesmo a Alemanha - e quem ficou com náuseas foi mesmo Gareth Southgate, que falhou, nas meias-finais, um penálti decisivo frente aos alemães.

"Não consegui ouvir essa música durante 20 anos, sinceramente", admitiu o selecionador inglês antes das meias-finais do Mundial 2018. "Simplesmente saía da sala se a ouvisse. Sei que é uma espécie de hino e que tem seguido a seleção, mas ficou envolvida em alguns momentos difíceis. Tem sensações diferentes para mim, mas é bom ouvir as pessoas a apreciá-la novamente".

É que, para casa do futebol, a Inglaterra pouco tem mostrado no futebol, nas últimas décadas. E é por isso esta seleção de Southgate, que conseguiu atingir umas meias-finais de um Mundial, 28 anos depois, gerou muito, mas muito entusiasmo entre os ingleses - ao ponto da música de 1996 ter voltado aos tops de downloads do Itunes, em Inglaterra.

Finalmente, havia uma seleção inglesa que gerava entusiasmo justificado.

Finalmente, havia um selecionador likeable, que sabia bem o que era passar por momentos difíceis e, por isso, como superá-los.

Finalmente, havia uma renegação da maldição nos penáltis, quando a Colômbia ficou pelo caminho, nos oitavos-de-final.

Finalmente, o futebol ia voltar para casa.

O problema é que, no século XXI, o futebol tem muitas casas.

A meia-final até começou às mil maravilhas para os ingleses. Logo aos cinco minutos, Modric fez algo muito pouco Modric (e bem mais Lovren) e derrubou Dele Alli mesmo à entrada da área croata. Trippier, o lateral que nasceu no mesmo ano em que a Inglaterra tinha chegado a umas meias-finais de um Mundial pela última vez, pegou na bola e imitou um dos jogadores que mais admira: David Beckham.

O momento bend it like Trippier foi inédito para o defesa do Tottenham, que nunca tinha marcado um golo pela seleção, tal como Maguire, que marcou pela primeira vez nos quartos-de-final, frente à Suécia - e que quase voltou a marcar esta quarta-feira, novamente de cabeça, num canto.

Durante a primeira meia-hora, aliás, houve muito mais Inglaterra do que Croácia: os croatas - esta noite com Brozovic no meio-campo, para libertar para tarefas mais ofensivas o magnífico Modric - pareciam algo atordoados por estarem a disputar uma meia-final de um Mundial, algo que só tinham conseguido por uma vez, em 1998, quando perderam contra... França.

Daí que as melhores oportunidades de golo tenham sido inglesas - especialmente aquela dupla ocasião de um homem que hoje vai ter muitas dificuldades em adormecer: Harry Kane. É o melhor marcador do Mundial, sim, com seis golos marcados, mas, isolado por Dele Ali, em frente a Subasic, permitiu a defesa do guarda-redes croata, primeiro, e acertou no poste, depois. O lance acabaria por ser travado por fora de jogo, mas Kane estava em jogo, por isso, se a bola entrasse...

Se. Ou if. É provável que, nos próximos dias, esta palavra seja repetida muitas vezes em Inglaterra. Porque os ingleses, na 1ª parte, tiveram tudo para chegar ao 2-0 e arrumar o jogo (ainda que o meio-campo muitas vezes não tenha aproveitado para sair para o ataque com mais critério, muito por culpa do precipitado Henderson, que usou e abusou das bolas longas para Sterling).

Mas não o fizeram e, na 2ª parte, foram recuando, recuando, recuando. E os croatas foram crescendo, crescendo, crescendo. Tanto que ninguém adivinhava que, tanto nos oitavos-de-final como nos quartos-de-final, a Croácia tinha disputado prolongamentos.

Os croatas tinham mais bola e iam lançando-a, sempre que podiam, para a área, e, ao 24º cruzamento, finalmente conseguiram o que queriam: Perisic antecipou-se a Walker e meteu o pé onde o lateral do Manchester City ia pôr a cabeça - e empatou.

O golo de Perisic que empatou o jogo
Alexander Hassenstein

De repente, a Croácia dominava o jogo (qual amoníaco, qual quê - há lá maior doping do que o golo) e a Inglaterra, que parecia não ter outro plano sem ser aguentar o 1-0, tremia. Perisic - grande 2ª parte - enviou uma bola ao poste e Rebic testou os reflexos de Pickford (provavelmente o melhor guarda-redes do Mundial), mas o empate manteve-se.

E nem num livre enviado para a área, já nos descontos, a Inglaterra conseguiu marcar: Kane cabeceou ao lado.

No prolongamento, num canto, Stones cabeceou bem melhor: enviou a bola para a baliza... mas Vrsaljko estava lá, em cima da linha, a tirá-la.

Do outro lado do campo, era Pickford a salvar: Mandzukic apareceu isolado mas o guarda-redes do Everton roubou-lhe o golo (já disse que este "baixinho" é provavelmente o melhor guardião do Mundial?).

Mas, aos 108 minutos, no meio da confusão, já não houve salvação. Depois de um alívio disparatado de Walker - esta tenta ser uma nova Inglaterra, sim, mas ainda comete muitos disparates -, Perisic cabeceou a bola para a área e Mandzukic rematou-a para dentro da baliza, fazendo o 2-1.

E, depois disso, já não houve mais Inglaterra.

Everyone seems to know the score
They've seen it all before
They just know
They're so sure
That England's gonna throw it away
Gonna blow it away

Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: mmcabral@expresso.impresa.pt