Senegal

Uma curta história sobre o pequeno grande Mané

Uma curta história sobre o pequeno grande Mané
Laurence Griffiths - FIFA

Esta terça-feira, dia de Champions, joga o Senegal de Sadio Mané, o rapaz que fugiu duas vezes aos pais e a uma aldeia a sul de Dakar para tentar a sua sorte. Hoje, o explosivo extremo é um dos cabeças de cartaz do Mundial 2018

Uma curta história sobre o pequeno grande Mané

Pedro Candeias

Editor de Sociedade

Bambali é uma pequena aldeia nas margens do Casamansa com tons de terracota que fica bem no sul do Senegal, um pouco acima da Guiné-Bissau, a 300 quilómetros de Dakar.

Segundo os últimos censos, 25 mil homens e mulheres fazem lá vida da pesca e do cultivo de bananas e do arroz, e os miúdos andam na escola e jogam futebol na terra vermelha quando não estão na minúscula mesquita a rezar com o Imã.

É de Bambali que vem Sadio Mané, que nunca confundiu o ofício dos livros com o da bola, embora as coisas nunca tenham sido assim tão claras para o pai austero, que era, aliás, o imã daquele lugar.

Por isso, Sadió viveu grande parte da sua meninice a tentar convencer religiosamente o pai-sacerdote de que um dia seria futebolista profissional, um processo atribulado com fugas frustradas para a vitória pelo meio.

Numa, ia ele a caminho de Dakar para treinos de captação quando foi descoberto e levado à família, com um raspanete e alguns estalos que bateram de frente na obstinação.

Houve outra, até Mbour, já com a ajuda do tio, onde apareceu com os calções e a camisola e as chuteiras rasgados no campo. O treinador criticou o equipamento à primeira e gostou dele à segunda, e só então Sadio contornou abençoadamente o obstáculo familiar.

O miúdo discreto e fibroso, que achava um desperdício de tempo tomar banho porque a bola chamava na rua, deu rapidamente nas vistas e pulou para o Génération Foot, a escolinha do Metz no Dakar. Inevitavelmente, sendo ele explosivo e veloz como o vento, seguiu para o Metz pouco tempo depois; e daí para o Red Bull Salzburg (2012-14, 45 golos) e por fim para o Southampton (2014-16, 25 golos), onde entrou para a história como o autor do hat-trick mais rápido - justamente - da Premier League: 4 minutos e 33 segundos para fazer três golos contra o Aston Villa.

Mané podia ter ido para o Dortmund quando deixou a Áustria, mas o encontro com Jürgen Klopp foi adiado para o Kop, em 2016-17, por questões que hoje não importam. A relação entre estes dois fez clique logo que se juntaram em Liverpool (36 milhões de euros), porque Klopp encontrou o seu jogador-tipo: aquele que anula o ego enquanta abraça o futebol enérgico e imparável, e acima de tudo intransigente com os tiques de vedetismo.

Nesta época, a mais exuberante, Sané foi ainda assim o menos berrante de uma espécie de Fab Four de Liverpool que o incluía a ele, Coutinho, Firmino e Salah, uns com as suas tatuagens e penteados e golos, o outro com tudo aquilo que faz um futebolista de elite: andamento, coração, golos e, claro, o exotismo egípcio.

Sané marcou, por exemplo, três golos ao FC Porto nos quartos-de-final da Liga dos Campeões, e marcou igualmente o golo que deu uma ténue esperança aos reds na final perdida contra o Real Madrid.

Se o Senegal procurar uma via aberta para o golo contra a Polónia, será ele a encontrá-la.

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