Olhar para fotografias de dezembro de 2010, aquando da votação de atribuição dos Mundiais de 2018 e 2022, é como observar imagens de um tempo passado, difíceis de ver hoje. Vladimir Putin plenamente integrado na cena internacional, perto de David Beckham ou de Angela Merkel; Franz Beckenbauer visto como respeitável senador, quase voz de autoridade do jogo; Sepp Blatter dominando a cena, quase sempre ladeado por Michel Platini, que se perfilava como sucessor do suíço quando esteve decidisse abandonar a FIFA.
Tudo isto pode parecer, aos olhos de 2022, distante. Mas tudo isto tem profundas consequências no mundo que vivemos em 2022. A menos de um mês do arranque do Mundial do Catar, saíram daqueles bastidores da FIFA em 2010 os “acordos, duplos acordos e contra-acordos” que determinaram que a bola planetária assentasse, em 2018, em Moscovo e, em 2022, em Doha.
A expressão citada é de Bonita Mersiades. A australiana tem uma vida ligada ao futebol, a qual a levou a ser, entre 2007 e 2010, diretora de comunicação da Federação do seu país, tendo acompanhado a candidatura que o Estado fez à organização de 2022. Testemunhou, da primeira fila, um processo que “não era baseado no mérito", mas sim nos “negócios que poderiam ser feitos nos bastidores”.
Autora do livro “Whatever It Takes: The Inside Story of the FIFA Way”, sobre as práticas da entidade máxima do jogo, Bonita — que também trabalhou no governo australiano e é presidente da Women in Football Australia, uma organização que apoia as meninas e mulheres que joguem futebol no país dos cangurus — foi denunciante no “Garcia Report”. Liderado por Michael J. Garcia, que foi nomeado em 2012 pela FIFA para o trabalho, o relatório deveria investigar as alegações de corrupção no mundo do futebol. Mas Bonita, cujo anonimato não foi preservado no trabalho de Garcia, ao contrário do que lhe foi prometido, opina que tudo se tratou de uma “investigação a brincar”.
Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: tribuna@expresso.impresa.pt