Não estão a ser “considerados” quaisquer investimentos nos estádios da Luz, de Alvalade e do Dragão, os três que vão acolher jogos no Mundial de 2030. E há “uma esperança muito grande” de Portugal ter uma meia-final do torneio, que necessariamente terá de ser em Lisboa, na casa do Benfica, porque o derradeiro dos 104 encontros da prova nunca será cá. Uns cinco meses depois de a FIFA, do nada, atribuir a centenária edição do Campeonato do Mundo à candidatura ibérico-marroquina, realizou-se o primeiro evento oficial da organização e estas são as duas informações úteis e palpáveis que se retiram do que foi dito e mostrado, esta terça-feira.
A versão futebolisticamente aproximada do tudo, em todo o lado, ao mesmo tempo apareceu em outubro. Sem indicação prévia, nem uma pista que o indicasse, a FIFA dispensou as formalidades de uma votação, hábito democrático que já lhe significou chatices com atos de corrupção no passado, e anunciou Portugal, Espanha e Marrocos como os anfitriões do Mundial de 2030. Um torneio especial pelas invenções a que vai dar abrigo: será um Campeonato do Mundo intercontinental com três países organizadores e seis a receberem jogos, porque Uruguai, Argentina e Paraguai também vão receber as três primeiras partidas da fase de grupos. Ao tomar o palco do repleto anfiteatro da Cidade do Futebol, em Oeiras, Fernando Gomes nem o mencionou no lema que quis cunhar: “Três países, dois continentes, uma única missão: organizar um Mundial que fique na memória de todos.”
O presidente da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) foi o primeiro a falar na cerimónia de apresentação da candidatura ao Mundial. “O futebol, não me canso de o dizer, supera preconceitos, constrói pontes e une nações”, começou por referir. Propositado ou inocentemente, essas ligações não chegaram, nas suas palavras, ao lado de lá do Atlântico, apesar de não se esquecer do simbolismo temporal do torneio: “Mais do que apenas a festa do futebol com a celebração do centenário do primeiro Mundial, esta candidatura quer deixar uma marca que o tempo não consiga apagar.”
No primeiro evento conjunto desde que a FIFA confirmou o Campeonato do Mundo tripartido, Fouzi Lekjaa, presidente da federação marroquina, Fernando Sanz, representante da espanhola e António Laranjo, líder da comissão organizadora, imitaram Fernando Gomes. Nenhum mencionou os países sul-americanos que também vão receber jogos do Mundial de 2030, aos quais a FIFA concedeu essa fatia de felicidade - estavam unidos noutra candidatura e a pequena cedência satisfez a pretensão simbólica de Montevidéu, cidade onde se realizou o primeiro torneio da história, ter o jogo inaugural. Numa cerimónia que desvendou o logótipo da prova, o lema que junta “Yalla” ao “Vamos”, palavras sinónimas do português, espanhol e árabe, muito pouco de concreto se acrescentou ao que já se augurava.
Quando se ouviu Fernando Gomes a agradecer ao Sporting, Benfica e FC Porto e às respetivas autarquias, confirmou-se o esperado desde outubro, conhecidas que são as exigências da FIFA em termos de capacidade dos estádios para acolherem jogos em Mundiais. Lisboa e Porto serão cidades-sede no torneio, mas só depois dos três presidentes das federações falarem se deu a palavra a António Laranjo. No meio da pouca informação concreta a ser desvendada, foi o antigo presidente da Infraestruturas de Portugal quem mais revelou, embora sem novidades de maior, quando chegou o momento de responder a perguntas dos jornalistas.
Os três primeiros jogos do Mundial serão repartidos por Uruguai, Argentina e Paraguai, isso é certo com a certeza proclamada por António Laranjo - “o que posso dizer é que vamos ter 101 jogos em Portugal, Marrocos e Espanha.” Quantos serão, onde acontecerão e em que fase do torneio “ainda não é preocupação” dos organizadores, que ainda estão a “fazer avaliações no domínio técnico” e só em julho vão entregar “o dossier” da candidatura à FIFA. No documento constará “a indicação” de quais as cidades-sede e respectivos estádios. Os do Benfica, Sporting e FC Porto, únicos portugueses com capacidade para lá dos mínimos exigidos, estão aptos tal e qual se encontram. “Em Portugal, não estão considerados investimentos, os estádios que estamos a considerar têm dado provas que estão nas melhores condições para receber as provas mais importantes”, garantiu António Laranjo.
Uma meia-final no Estádio da Luz
A comissão de organização já visitou todas as possíveis cidades-sede e o Santiago Bernabéu, recinto do Real Madrid recentemente renovado, será “certamente indicado” para acolher a final. Não podendo Portugal receber a final, tem “uma esperança muito grande de ter uma meia-final” porque “o país que tiver a final terá de deixar para os outros dois as meias-finais”. Houve questões em português, espanhol e francês sobre estádios e o dirigente reagiu sempre da mesma maneira: “Para o Mundial de 2026, só muito recentemente soubemos onde se ia realizar a final e todos os restantes jogos. Daqui até 2030 temos tempo para acertar todos esses pormenores. Portugal tem fundada expetativa para poder acolher uma meia-final.”
António Laranjo revelou que daqui por “um mês, mês e meio” será concluído “um estudo económico” sobre tudo o que estará envolvido na organização do Mundial. Portanto, lá para maio poderá “responder com dados concretos” sobre, por exemplo, “o retorno que os investimentos” terão. Deu conta que as visitas técnicas feitas em Portugal, Espanha e Marrocos foram feitas na lógica do adepto, para quem manda e decide sentir na pele o que quem compra os bilhetes terá de experienciar: “Fizemos viagens em Espanha e Marrocos por TGV, atravessámos os dois continentes em ferry boat, andámos de metro, nas infraestruturas todas que vão estar ao serviço do adepto.” E o responsável pela organização não tem dúvidas: “Os países têm infraestruturas adequadas e necessárias. É, talvez, a grande mais-valia que esta candidatura tem.”
Com tantos milhões de pessoas que se podem esperar, daqui por seis anos, no evento desportivo mais visto do planeta, Fernando Gomes quer “organizar o Mundial mais sustentável de sempre”. Embora sem ser objetivo quanto à forma de o concretizar, o presidente da FPF fixou a exigência: “Não nos podemos limitar a fazer, temos de inspirar e motivar gerações futuras. Não se trata apenas do que construímos ou queremos deixar do ponto de vista material, mas das convicções que transmitimos como legado. O futebol tem de evoluir e inovar em termos ambientais.” Depois, António Laranjo realçou a “neutralidade carbónica” como prioridade, falando em “transportes com baixa emissão de gases poluentes”. Veremos se, em 2030, Portugal estará a postos para respeitar a intenção.