Mundial Feminino 2023

O universo das rainhas do soccer tem câmaras da Netflix, milhões de telespetadores e estantes com livros sobre Alex Morgan ou Rapinoe

O universo das rainhas do soccer tem câmaras da Netflix, milhões de telespetadores e estantes com livros sobre Alex Morgan ou Rapinoe
Robin Alam/USSF

O Portugal-EUA enfrentará mundos diferentes que, durante 90 minutos, se cruzarão em Auckland. As bicampeãs batem recordes de audiências, são seguidas por uma equipa da Netflix para um documentário e arrastam consigo uma pequena multidão de jornalistas, que multiplica por mais de oito vezes o seguimento feito à seleção nacional

É como se tudo o que envolva a seleção dos Estados Unidos da América multiplicasse várias vezes o que é comum ver no Mundial 2023, como se esta equipa fosse um caso à parte nesta competição, uma anomalia estatística. E basta entrar numa sala de conferências de imprensa para o saber.

Na antevisão do encontro contra Portugal, havia entre 50 a 60 jornalistas a seguir o que Vlatko Andonovski e Naomi Girma diziam. Em mais nenhum outro momento destes em que a Tribuna Expresso esteve presente — envolvendo conjuntos tão diferentes como Portugal, Zâmbia, Espanha, Noruega, Filipinas, Suíça, Países Baixos ou Vietname — se encontravam mais de 20 profissionais na sala. As perguntas e respostas duraram 30 minutos, mais do dobro do que é normal (cerca de 10 a 15 minutos, no máximo).

A um canto, qual mosca na parede, estava uma equipa da Netflix, composta por quatro profissionais. Acompanham as bicampeãs mundiais para todo o lado para um documentário que mostrará os bastidores de uma das seleções mais mediáticas, vencedoras e que gera mais aparato do planeta.

Há 89 jornalistas vindos dos Estados Unidos acreditados para o Mundial, aos quais se juntam outros de países como Inglaterra, Espanha ou Suécia que também acompanham as rainhas do soccer. Como comparação, vieram 11 representantes de órgãos de comunicação social de Portugal para seguir as estreantes de Francisco Neto.

Brad Smith/USSF/Getty

O impacto na televisão

O anúncio das 23 convocadas para estarem na Oceânia correspondeu logo à megalomania que envolve esta seleção. Um vídeo com Joe Biden, Taylor Swift, Megan Thee Stallion, Mikaela Shiffrin, Kelly Slater, John Cena ou Lil Wayne revelando o nome de cada uma das eleitas mostra bem que, aqui, holofotes não faltam.

Com quatro triunfos em oito edições de Mundiais, não perdendo na competição desde 2011 e nunca tendo acabado abaixo do terceiro lugar, a popularidade desta equipa está assente no êxito desportivo. E, atrás dele, surgem os números que batem recordes na televisão.

O duelo contra os Países Baixos, da segunda jornada da fase de grupos, teve 6,43 milhões de telespetadores na Fox Sports e 1,16 milhões na Telemundo, em espanhol. Estes números transformaram o jogo no mais visto de sempre numa fase de grupos de um Mundial feminino.

Em Auckland, andar na rua é arriscar um encontro fortuito com alguém com uma camisola de Alex Morgan, Megan Rapinoe ou Rose Lavelle, num sinal da popularidade destes ícones, também, deste lado do mundo. Houve 41.000 pessoas no primeiro duelo dos EUA no Mundial, no Eden Park contra o Vietname, e 27.000 no compromisso frente aos Países Baixos, em Wellington. Face a Portugal, novamente em Auckand, a FIFA espera 43.000 espetadores.

As sempre lotadas conferências de imprensa dos EUA são uma marca do Mundial
Brad Smith/USSF/Getty

Em diversas livrarias de Auckland há estantes repletas de livros sobre Morgan, Rapinoe ou da já retirada Carli Lloyd, feitas símbolo do crescimento do futebol feminino. Várias craques do soccer são, também, imagem de promoção do Mundial em cartazes ou vídeos de publicidade.

Em 2019, a Nike anunciou que a camisola da seleção feminina havia sido a mais vendida de sempre — entre uniformes de equipas de homens ou mulheres — na loja virtual da marca numa só temporada. O crescimento face ao período homólogo de 2015, quando também se disputou um Mundial vencido pelas norte-americanas, foi de 500%.

A força das redes sociais

Quando a USWNT (United States women's national soccer team) ergueu o primeiro título Mundial, em 1991, Portugal nem sequer tinha uma seleção ativa. Segundo a FIFA, há 1,7 milhões de mulheres registadas na federação norte-americana para jogarem, somando todos os níveis. Portugal superou, em 2022/23, as 13.000 praticantes pela primeira vez, chegando a 13.107 — entre futebol e futsal — na temporada que terminou recentemente.

Uma estátua de Alex Morgan foi colocada em Nova Iorque no dia de começo do Mundial 2023
Michael M. Santiago/Getty

A derradeira ilustração da força desta máquina do soccer vê-se pelas redes sociais. Seja qual for a plataforma, as estrelas desta equipa estão no topo da popularidade.

Alex Morgan, com cerca de 10 milhões de seguidores no Instagram, é a quinta desportista do mundo mais popular nesta rede social, numa lista dominada por mulheres do Wrestling. Megan Rapinoe tem dois milhões, o que significa que, as duas juntas, somam quase tanto quanto a conta que junta todas as seleções nacionais da Federação Portuguesa de Futebol, que tem 14 milhões.

Durante 90 minutos, em Eden Park, palco sagrado do râguebi — lá jogaram-se as finais dos Mundiais de 1987 e 2011, ambos vencidos pelos All Blacks, que não perdem no recinto de Auckland desde 1994 —, Portugal cruzar-se-á com um universo distante no planeta do futebol feminino. A tarefa da equipa de Francisco Neto é superar em golos o que não é comparável em mediatismo.

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