Opinião

Olhemos para João Mário com atenção

João Mário afirmou que gostaria de ser uma referência no Benfica. Para um sportinguista pode soar a ingratidão, mas Pedro Boucherie Mendes espera que sim. Significaria que o futebol português se aproximaria de uma certa normalidade geral, em que os treinadores que irrompem pelo campo são severa e rapidamente multados em valores que não façam rir, em que se deixem de simular lesões, em que cartões amarelos protestados sejam decididos em dois dias e não em meses e em que adeptos que façam ameaças provoquem interdições e multas aos clubes

A previsível, clara e afirmativa vitoria do Sporting de Amorim na Supertaça teve características que não vi sublinhadas e, creio, serem de notar.

Foi um jogo aberto, disputado, com bons momentos do Braga e mais bons momentos do Sporting, mas foi sobretudo um jogo sem casos. Como todos devem ser. O surpreendente é essa circunstância não ser referida, porque acho que é de importância primordial para o nosso futebol.

Com um martelo de adepto fanático na mão, será sempre possível encontrar pregos para bater, mas um jogo que valeu um titulo, sem expulsões, empurrões, sucessões de simulações de ambos os lados, deve ser sublinhado. Talvez infelizmente, porque essa deveria ser a regra, mas é mesmo de sublinhar.

O Euro que a Itália venceu foi uma lição nesse particular. Com um VAR rápido e eficiente e árbitros seguros, os erros de avaliação não perturbaram jogadores e equipas. Não houve agressões, casos, empurrões, perdas de tempo, simulações de lesões, berros na cara do árbitro de baliza, braços no ar por tudo e por nada para atrapalhar o raciocínio do árbitro ou treinadores a entrar em campo a espumar de raiva.

Tomáramos nós que a Liga que começa nesta sexta-feira possa ser assim. Desde que há VAR – uma teima de Bruno de Carvalho, o que não pode nem deve ser esquecido – é o Sporting quem tem mais títulos em Portugal, o que não deixa de ser incrível, dado o muito menor orçamento comparando com Benfica e Porto.

A ausência de público no ano passado impediu, quanto a mim, o que chamo de bullying do adepto que (talvez compreensivelmente) influencia arbitragens. É fácil exigir aos árbitros heroicidade a partir do sofá caseiro, mas quando milhares de pessoas assobiam, insultam e ameaçam, quando se receia que família e propriedades possam ser atacadas, talvez seja humano marcar o tal livre meio duvidosa à entrada da área no último minuto dos descontos. Mais do que a ausência de apoio dos adeptos, talvez o que tenha faltado a algumas equipas foi o bullying útil por parte das suas falanges.

Este ano, já com público, servirá para avaliar a pertinência deste meu juízo.

João Mário afirmou que gostaria de ser uma referência no Benfica. Para um sportinguista pode soar a ingratidão, para a imprensa chacal um poço de petróleo a explorar, mas, pela minha parte, espero que sim e espero sobretudo que isso seja possível e atingível pacificamente, assim ele o demonstre dentro do campo.

Foi um grande jogador de verde e branco, campeão da Europa por Portugal, pode agora fazer história vestido de encarnado. Significaria que o nosso futebol se aproximaria de uma certa normalidade geral, em que os treinadores que irrompem pelo campo são severa e rapidamente castigados e multados em valores que não façam rir, em que se deixem de simular lesões, em que cartões amarelos protestados sejam decididos em dois dias e não em meses e em que adeptos que façam ameaças provoquem interdições e multas aos clubes.

O nosso futebol, como muitas outras dinâmicas colectivas portuguesas, podem ser mais limpas, claras e lideradas por instituições fortes, sem medo e sem a obsessãozinha dos consensos medíocres e opacos. Basta começar a querer.
Assim podendo ser, que vença o melhor.

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