Presidente da Federação de Desportos de Inverno de Portugal
É errado existirem federações desportivas, infelizmente, sem condições para apoiar os seus atletas e desenvolver as suas modalidades, porque não têm apoio financeiro suficiente para o fazer. O Desporto precisa de mais investimento? Claro que sim. E muito. Mas não será, com toda a certeza, defende o presidente de Federação de Desportos de Inverno de Portugal, apontando o dedo àqueles que estão a fazer o seu caminho e que dependem destas verbas para poderem fazer mais e melhor
Numa altura triste e difícil que vive o Desporto português, marcado pela partida de quem mais nos defendeu, é com lamento que vemos alguém, que já teve responsabilidades no Desporto Universitário, a tentar desunir o que se quer unido.
O Dr. André Reis, ex-presidente da Federação Académica do Desporto Universitário (FADU), organismo que merece o máximo respeito e que tive a honra de representar em 1995, nas Universíadas de Inverno em Jaca - na modalidade de Esqui Alpino -, escreveu um artigo de opinião neste prestigiado órgão de comunicação social intitulado “O Desporto em Portugal: o que os portugueses precisam de saber”. Contudo, em vez de manter uma postura neutra e imparcial, decidiu, a determinado momento, direcionar a sua ira à Federação que presido, demonstrando, infelizmente, parco conhecimento sobre o assunto.
A saber: a Federação de Desportos de Inverno de Portugal (FDI-Portugal) é uma instituição com 32 anos de história, que tutela e desenvolve 12 modalidades no nosso país. Na época desportiva 2023/24 participou em mais de 70 competições e estágios internacionais, incluindo Campeonatos do Mundo, Campeonatos Europeus, Taças do Mundo e Jogos Olímpicos da Juventude, tendo organizado Campeonatos Nacionais e Taças de Portugal das suas modalidades, envolvendo centenas de atletas. Em paralelo desenvolve diversos projetos juvenis por onde passam milhares de jovens de escolas de todo o país, incluindo crianças com necessidades especiais.
Esse trabalho só é possível de concretizar porque a FDI-Portugal deixou de depender exclusivamente do Contrato Programa com o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) - contrato que se mantém inalterado há vários anos e que ronda valores próximos dos 70.000,00€ anuais - e passou em 2019 a receber, de acordo com a lei, as verbas provenientes do Imposto Especial de Jogo Online nas Apostas Desportivas (IEJO).
Tal como nós, também o Futebol recebe da mesma forma verbas provenientes do IEJO através, entre outras, da Liga dos Campeões, o Ténis dos Torneios ATP e o Basquetebol da NBA. Também não são competições organizadas por estas federações. E isso é errado? Claro que não. Estas verbas têm ao longo dos últimos anos permitido a criação de condições para que estas modalidades tenham mais e melhores atletas, mais e melhores infraestruturas e, consequentemente, melhores resultados desportivos, cuja lembrança surge, pontual e lamentavelmente, com mais intensidade de quatro em quatro anos.
O que é errado é existirem federações desportivas, infelizmente, sem condições para apoiar os seus atletas e desenvolver as suas modalidades, porque não têm apoio financeiro suficiente para o fazer. O Desporto precisa de mais investimento? Claro que sim. E muito. Mas não será, com toda a certeza, apontando o dedo àqueles que estão a fazer o seu caminho e que dependem destas verbas para poderem fazer mais e melhor.
Manuel Ramos nos Mundiais de esqui alpino, em 2023.
FABRICE COFFRINI
É também nesse sentido que a FDI-Portugal está a trabalhar para construir uma infraestrutura desportiva de dimensões olímpicas que lhe permita vir a ter em Portugal as condições ideais para desenvolver as suas modalidades de gelo (Hóquei no Gelo, Curling, Patinagem Artística e Patinagem de Velocidade no Gelo) e é rumo a esse fito que nos norteia que as verbas provenientes do IEJO assumem um papel fundamental. Sem infraestruturas disponíveis ou centros de alto rendimento construídos pelo Estado, trabalhamos todos os dias focados neste objetivo e o que há algum tempo era um sonho poderá num futuro muito próximo ser uma realidade. A partir daí tudo mudará e passaremos a poder treinar em Portugal com as mesmas condições que temos noutros países, passaremos a viajar menos, a ter mais crianças e jovens a treinar em academias e a ter os nossos treinadores a trabalhar em Portugal.
Vejamos o extraordinário exemplo do Ciclismo de Pista. Há 15 anos muitas vozes se levantaram contra o enorme investimento que iria ser realizado para construir o Velódromo de Sangalhos, infraestrutura que alguns consideravam megalómana e desnecessária no nosso país. Hoje os que a criticaram aplaudem e percebem que o Ouro e Prata de Paris, que muito orgulho trouxe a todos nós portugueses, não seria possível sem este investimento.
A FDI-Portugal é hoje uma Federação reconhecida pelos seus pares e pelas Federações Internacionais, fruto de muito trabalho de atletas, treinadores, clubes e dirigentes. Somos, por exemplo na Patinagem de Velocidade no Gelo, apontados pela Federação Internacional da modalidade como um caso de sucesso e um exemplo a seguir por outras nações, concretizado na qualificação da cota máxima de atletas (4) para os Jogos Olímpicos da Juventude de Inverno Gangwon 2024 na Coreia do Sul e o diploma Olímpico (6.º lugar) conquistado por Jéssica Rodrigues na Mass Start ou o 9.º lugar de Afonso Silva nos Mundiais Júnior 2024 no Japão. Isto só é possível com o investimento que tem vindo a ser realizado e que depende em grande parte do IEJO.
Entristece-me ver que alguns, embora poucos, preferem criticar quem está a fazer a diferença, alegando agir em defesa do Desporto. Porque Portugal não tem tradição nos desportos de Inverno, dizem os mais céticos. A Jamaica e o Brasil também não têm, mas não é por isso que estes países deixam de investir nas modalidades de inverno. Só nos últimos Jogos Olímpicos de Inverno Pequim 2022, o Brasil qualificou 11 atletas em cinco modalidades diferentes e na última edição dos Jogos Olímpicos da Juventude de Inverno Gangwon 2024 ganhou a sua primeira medalha olímpica em Jogos de Inverno.
Em jeito de conclusão, volto a referir que o Desporto precisa de muito mais investimento. Isso é inegável. Unamos, pois, esforços com vista a objetivos comuns e deixemos de criticar o vizinho do lado.
O Dr. André Reis mostra desconhecimento, o que é dececionante para alguém que aparenta defender o Desporto. Desafiamos o Dr. André Reis a concentrar-se em discutir as verbas que o Desporto gera e que, infelizmente, não são canalizadas para o setor. Isso sim, seria defender os atletas e as modalidades – todas elas.
Termino, deixando saudações desportivas com o desejo de que o Desporto, setor em que Portugal dá cartas, seja cada vez mais forte e consolidado e com um envolvimento cada vez maior da sociedade civil.
Pedro Flávio Martins
Presidente da Federação de Desportos de Inverno de Portugal