Opinião

Os árbitros da Premier League vão ter de divulgar as suas simpatias clubísticas. Medida discutível mas que mata focos de especulação

Os árbitros da Premier League vão ter de divulgar as suas simpatias clubísticas. Medida discutível mas que mata focos de especulação

Duarte Gomes

ex-árbitro de futebol

Duarte Gomes fala da medida da PGMOL, empresa que gere a arbitragem na Premier League, liderada pelo ex-juiz internacional Howard Webb

A PGMOL, empresa que gere os árbitros do futebol profissional da Premier League inglesa, tem tentado de tudo para melhorar o nível da sua arbitragem.

A entidade gerida por Howard Webb (a quem tenho o privilégio de chamar amigo) tem agora divulgado um conjunto de iniciativas que assentam na tentativa de credibilização da classe junto dos diferentes atores do espetáculo.
Webb, dirigente experiente e de reconhecida competência, sabe bem que parte do sucesso do setor passa (também) pela forma como é percecionado cá fora.
Se clubes, imprensa e adeptos acreditarem que os árbitros são pessoas de bem que apenas tentam dar o seu melhor, o ambiente será menos tenso e crispado. A pressão negativa, a desconfiança e os ataques tenderão a diminuir, o que lhes dará mais "liberdade" para fazerem o seu trabalho com outro foco e motivação.
É quase matemático e só não percebe isso quem não percebe nada disto.
Depois de optar por falar abertamente (na televisão) sobre lances discutíveis e de ter tornado públicos áudios de conversas entre árbitros e VAR's, o ex-internacional inglês prepara-se agora para divulgar lista com as simpatias/preferências clubísticas dos seus árbitros, numa declaração de interesses que será o mais transparente possível.
A ideia surgiu na sequência de críticas do Nottingham em relação a Stuart Attwell, alegadamente adepto do Luton Town, nomeado como vídeo árbitro numa derrota controversa do Forest com o Everton (jogo da época passada). Na altura as três equipas lutavam para evitar a despromoção.
A medida é muito discutível, mas não deixa de matar pela raíz eventuais focos de especulação que não fazem qualquer sentido por estes dias: se jogadores, treinadores e jornalistas têm geralmente um "clube do coração" não permitindo que isso belisque o seu brio profissional, porque seriam os árbitros os únicos a deixar-se afetar por esse facto? Uma idiotice com prazo de validade (há muito) ultrapassado.
Gerir arbitragem de futebol de topo nos dias de hoje é um exercício de grande dificuldade. As maiores preocupações são obviamente as internas: primeiro profissionalizar os árbitros de elite e dar-lhes meios, recursos e condições para se dedicarem em exclusivo à função. A partir daí exigir-lhes trabalho, compromisso e responsabilidade. Os treinos em sala e em campo devem ser diários, uma constante, porque só a repetição traz "perfeição". A preparação teórica, técnica, psicológica e o trabalho de equipa devem ser aprimorados o mais possível. Cada jogo é uma oportunidade para mostrar competência, foco, entrega total. E quem não estiver à altura, não pode pertencer à elite.
Externamente é preciso mostrar ao mundo, de forma ponderada, estratégica e consistente, que esta equipa - a terceira equipa em campo - é composta por pessoas sérias que não têm nada a esconder. Pessoas que se regem por padrões de transparência, seja na forma como trabalham, seja na forma como são nomeadas, classificadas, promovidas ou despromovidas.
O futebol de hoje tem que ser um livro aberto, onde tudo, mas mesmo tudo, possa ser auditado a qualquer hora, porque quem não deve não teme e a arbitragem nada deve a ninguém.
Howard Webb sabe disso. E mesmo consciente que jamais colherá elogios transversais - as críticas ferozes estão sempre à distância do penálti que se segue -, caminha da forma certa, apostando no reforço de qualidade para dentro e na demonstração de honestidade para fora.
Não é apenas inteligência, é competência e essa, meus amigos, é uma bênção que não toca a todos.

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