Em Las Vegas, no mundo do UFC, fala-se português: “Eu digo ao Fialho que é muito inteligente e técnico. A maioria não tem essa inteligência”

Jornalista
O Seu Herbert tinha uma oficina em casa, em Niterói, do outro lado da ponte que desagua no Rio de Janeiro. Renovava os interiores dos carros que por ali chegavam já muito cansados. Certa vez, no carro de um professor de jiu jitsu, os seus três filhos descobriram um quimono. Era um “carrinho velho, feio”. A brincadeira dos garotos, fardados para as lutas, deu uma ideia àquele homem. “Ele perguntou ao cliente para trocar: em vez de pagar, dava alguns meses para treinarmos”, conta Gilbert Burns à Tribuna Expresso, ao lado de um dos ringues no Sindicato de Artes Marciais Mistas (MMA, na sigla inglesa), na Rainbow Boulevard, em Las Vegas, onde vários atletas do Ultimate Fighting Championship (UFC) treinam.
‘Durinho’, como é conhecido, estava nesta cidade do Nevada para acompanhar a International Fight Week, que teria muitas atrações até à derradeira jornada, o sábado, o dia dos dias, o festival de combates e golpes, em que haveria disputas de título em duas categorias, com o empático Max Holloway a desafiar o trono do destrutivo Alexander Volkanovski e com Jared Cannonier a tentar roubar o céu dos pés do cool e calculista Israel Adesanya. Enquanto falamos, os filhos de alguns atletas que por ali andam vão testando o tapete e praticando manobras. “Desde que seja o meu filho a levar…”, diz um deles, preocupado com a saúde alheia.
Estar na rua é impensável, com o diabo a soprar na nuca de toda a gente, fazendo oscilar a temperatura entre os 38º e 42º. Las Vegas, onde estão plantados milhares de outdoors anunciando os concentros de grandes artistas ou mágicos, mas também a especialização de certos advogados, não foi desenhada para se viver de dia. Sobrevive-se dentro de lojas e casinos, com um potente ar condicionado. De vez em quando, para contrariar o que há de radiante, vê-se uma ou outra carcaça decadente a arrastar-se, talvez vítima das promessas que tilintam em cada esquina ou porta giratória. Quando o sol vai descansar, as luzes acordam, as pessoas vão para as ruas e a roleta das emoções volta a florescer. É assim todos os dias.
A infância de Burns não foi como uma caminhada em Copacabana. “Eu tive bronquite asmática, era muito, muito forte. Os meus irmãos também tinham, mas a minha era muito forte. Sempre que mudava o tempo, eu ficava muito mal”, conta. “O desporto ajudou-me muito, foi uma das razões pelas quais comecei a fazer desporto, foi pela bronquite. Hoje não [a] tenho mais, posso dizer que me curou, não sei o que aconteceu”, diz, com um sorriso sereno.
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