Este homem é o melhor do mundo, como o Ronaldo (e, por acaso, até trabalha com ele)
Tem 34 anos, mais 200 pares de ténis no armário, uma paixão pelo desporto e pelo digital, e a responsabilidade de liderar a nível global o marketing digital da Nike, como Global Brand Digital Director. Para a consultora Leaders, Nuno Moura é um dos melhores do mundo naquilo que faz. O português, que está sedeado em Portland (EUA) desde 2014, está nomeado para o prémio “Leaders Under 40”, que distingue os melhores talentos mundiais na indústria desportiva, com menos de 40 anos, na categoria de Digital & Technology. Nuno Moura está entre os 35 melhores profissionais do mundo na indústria do desporto, selecionados entre 780 candidatos, num prémio cujos vencedores serão conhecidos na próxima semana, a 4 de outubro, em Londres.
Como é que chegas à Nike? Foi um processo inesperado e repentino. Trabalho na indústria de comunicação e marketing há mais de 13 anos. Passei um longo período da minha carreira a trabalhar nos headquarters europeus da MTV, em Camden Town, Londres, num período em que a música e os seus protagonistas gozavam ainda de um estatuto de quase “deuses na terra”.
Antes das redes sociais… Antes da explosão das redes sociais que vieram humanizar essas super-estrelas, ao criar maior proximidade e interação com o público. Até aí, um olhar mais íntimo era apenas possível através de plataformas como a MTV que permitiam aos fãs espreitar a vida das suas estrelas, para lá das cortinas dos palcos e das capas de revistas. Foram quatro anos críticos, passados numa casa-chave para o meu processo de maturação profissional e onde me especializei no consumidor jovem. A audiência, na minha óptica, mais exigente e perspicaz. Extremamente interessante de trabalhar. Porquê? Porque te obriga a ser super criativo, mais inovador a cada dia e sempre muito autêntico em tudo o que fazes.
Foi lá, na MTV, que começaste a especializar-te no digital? Sim. Na MTV comecei a explorar o potencial do digital e do mobile. Foquei-me na forma com os novos media e as novas plataformas permitiam o alargamento da distribuição, a maior proximidade com as audiências, e até uma maior satisfação dos consumidores, e a forma como tudo isto poderia beneficiar o crescimento da marca.
Que desafios se colocam hoje, na tua opinião, na comunição de marcas neste contexto digital imediato, acelerado, interativo? A transformação digital é uma realidade que nenhuma empresa pode ignorer. A corrida para acompanhar a procura de informação e responder on time às expectativas cada vez mais elevadas dos consumidores está lançada. O mundo digital e a tecnologia estão em constante metamorfose e as empresas têm hoje de apresentar um grau de flexibilidade que lhes permita rapidamente adaptar e evoluir processos internos e serviços às ambições e exigências dos seus clientes. Sobretudo quando se trabalha com público jovem, que já nasceu em contexto digital, está sempre conectado nas plataformas móveis e tem um graú de exigência de ‘novidade’ e inovação muito grande. O que ontem viam como extraordinário, hoje é o mínimo esperado de qualquer marca, independentemente da sua dimensão. Isto comporta desafios internos para as empresas, desde logo no campo da atração de talento. Para se apresentar o melhor trabalho na área digital e alcançar uma transformação com sucesso, é necessário atrair e reter o melhor talento do mercado. A arte, competência e experiência digitais escasseiam, tal é a procura por parte destas organizações. Atrair este profissionais depende da capacidade das empresas de oferecer aos “artistas digitais” a possibilidade de criar projetos interessantes e inovadores, tendo ao seu dispor os recursos adequados.
Da MTV saltaste para o mundo das agências… A paixão pela área do digital foi tal que acabei por começar a trabalhar com algumas das mais relevantes agências de marketing no campo do digital. Aí elevei meteoricamente as minhas competências no digital e nos social media, desde a vertente mais estratégica à execução dos planos, passando pelo desenvolvimento de soluções inovadoras na área mobile e web. Liderei a produção de projetos internacionais muito interessantes, em marcas a Coca-Cola, Fiat, Alfa Romeo, Pantene, Head n’ Shoulders, Malibu, T-Mobile, entre outras que me enchem de orgulho.
A indústria desportiva chega quando? Levo uma vida inteira dedicada ao desporto de alta competição, nas modalidades de futebol, andebol e rugby. Passei pelo Futebol Clube de Penafiel, A.D.Penafiel, SCRUM/Universidade do Minho, Clube de Rugby do Técnico e Hackney Rugby London. Enquanto espectador sigo religiosamente várias modalidades. Essa combinação de experiência profissional e amor ao desporto parece ter despertado o interesse da Nike. Fui recrutado para a empresa numa operação relâmpago, liderada por um head-hunter.
Um emprego de sonho… Sim. Para um apaixonado pelo marketing e pelo desporto, como eu, a Nike materializa um sonho. Nas duas vertentes, trabalhas com a elite, com os melhores e mais conceituados profissionais e atletas a nível global. Viajas por todo o mundo, contactas com indivíduos fora de série e trabalhas em projetos únicos que só uma empresa como esta poderia proporcionar.
Na Nike o teu percurso tem sido de desafios sucessivos. Por onde tens andado? Durante dois anos trabalhei para a Nike em terras britânicas, onde me foquei em toda a estratégia e execução no digital das nossas campanhas para o Europeu de Futebol, entre as quais “Nike Chance” e “My Time is Now”, com as quais fomos premiados nos Cannes Lions. Além destas campanhas, trabalhei ainda em todos os lançamentos de novos produtos, incluindo as coleções Nike com assinatura do Cristiano Ronaldo.
Foi o sucesso destas campanhas do Europeu de Futebol 2012 que colocou sobre ti os holofotes da Nike? Tenho como lema de vida que “é aquilo que fazes no escuro, que te coloca sob os holofotes”. Não há substituto para a dedicação máxima em tudo aquilo que fazes, esforço, ética de trabalho e, acima de tudo, fazer “a coisa acertada” (ainda que nem sempre a mais fácil) quando ninguém está a ver. É crucial ter a consciência tranquila e saber que deste tudo o que tinhas, sem prejudicar outros no processo. Após o sucesso conseguido com o projeto Europeu de Futebol 2012, recebi um convite para integrar a sede da Nike em Portland, nos Estados Unidos, como responsável pela campanha para o Mundial de 2014, no Brasil. A minha missão incluía o desenvolvimento de conteúdos da marca, lançamento da Nike Football App, a reestruturação do website/e-commerce, e a operacionalização de um centro de comando a partir do qual, durante o mundial, interagiríamos com os consumidores em tempo real, em resposta ao que acontecia em campo. Pelo meio tive a oportunidade de dirigir e, ainda contracenar, com o Neymar no Spot de lançamento da chuteira Hypervenom. Hoje lidero o marketing digital e e-commerce da Nike Football a nível global.
Neste momento, que desafio tens em mãos? Comecei a fase de planeamento da estratégia global de marketing digital para o Mundial 2018, que levará a Nike Football a estender as barreiras da comunicação, comércio e inovação nos serviços digitais, a novos territórios e audiências. Trabalho árduo, muita responsabilidade, mas extremamente gratificante.
Como é o dia-a-dia do Global Brand Digital Director da Nike? Os dias nunca são iguais. Ora na sede da Nike, no Oregon, ora em filmagens, ora num qualquer aeroporto partindo para mais um destino. Reuniões e conference calls superlotando os dias, onde acordas cedo e te deitas tarde para que a comunicação com os diferentes fusos horários, com as nossas equipas nas diferentes geografias, seja possível. Responsabilidades globais trazem esse fardo. Prazos curtos para entregas de projetos, muitas horas diárias de trabalho e uma boa dose de stress. Confesso que sou um “workaholic”. Sempre no telemóvel (mesmo quando fora do escritório), ligado ao email, a trocar mensagens de trabalho ou em calls. A tecnologia traz grandes benefícios e facilidade nem inúmeros aspectos da nossa rotina diária, mas também o peso de estarmos sempre conectados em qualquer lugar, a qualquer hora. Acho que já comecei a perder as impressões digitais nos meus polegares de tanto utilizar o telemóvel (risos).
A parte mais divertida desse trabalho é o contacto com os atletas… A captura de conteúdos com os nossos diferentes clubes e atletas é talvez a parte mais divertida, sim. E, obviamente, quando tens a oportunidade de estar presente em grandes eventos desportivos durante toda a sua extensão. Este ano fizemos de Paris a nossa base de trabalho, durante todo o mês em que o Europeu de Futebol aí decorreu. Não é a vida invejável que muitos imaginam, mas é algo que me dá enorme prazer. A oportunidade de trazer inovação para o mercado, de ser pioneiro em inúmeras áreas inexploradas do digital seduz-me. Marketing, desporto, atletas de elite, viagens, uma amálgama de culturas, colegas e amigos em cada capital. Gosto disso.
CURTO DE LA TORRE
Falaste nos atletas de elite. Como é trabalhar com um Ronaldo ou um Neymar? O Ronaldo e o Neymar são verdadeiros craques, dentro e fora de campo. Não apenas transbordam talento futebolístico, como basta colocá-los em frente a uma câmera e não param de espalhar magia (risos). Sempre bem humorados e extremamente profissionais, mesmo quando a sua agenda e compromissos desportivos encurta os dias. Esta atitude e disponibilidade estende-se a todos os outros atletas, clubes e federações, com quem trabalhamos. Simplicidade e anti-vedetismo parecem mesmo ser a norma nesta esfera. O facto de no passado ter trabalhado com estrelas do mundo da música, permitiu-me adquirir processos e mecanismos que ajudam a simplificar e a retirar o melhor destes indivíduos: a sua simplicidade.
Neste percurso na empresa, o que destacarias como as tuas principais conquistas? Diria que o sucesso estrondoso das campanhas para o Euro 2012 e 2016, e para o Mundial do Brasil em 2014, são o auge da minha passagem pela Nike. Foram três eventos incríveis, onde os consumidores nos deram a sua preferência. Os níveis de participação em todas as ativações que executamos foi fabuloso. A robusta aceleração do nosso comércio electrónico foi também, sem qualquer margem para dúvida, uma das mais saborosas conquistas nesta jornada. O desenvolvimento de uma nova suite de serviços digitais específicos para futebolistas, incluindo inovadoras ferramentas de treino mental aplicado ao desporto – o “Pro Genius” -, a aceleração e melhoramento do nosso programa de membership (CRM) e a organização de um modelo de comunicação e serviço “365” com os consumidores, que veio substituiu o modelo go-to-market sazonal, foram relevantes. A criação de uma network de produção interna onde todas as nossas geografias e territórios contribuem com (e reutilizam) conteúdos e ideias elevando a eficácia dos nossos recursos humanos e financeiros, foram achievements importantes. E, claro, todo o sucesso conseguido com as dezenas de campanhas Nike que incluíram o mais recente “The Switch”, onde o nosso Cristiano Ronaldo e a Seleção de Portugal sāo os personagens principais.
De todas essas campanhas que realizaste para a Nike, qual a que mais o marcou? A “Nike Chance” foi um projeto que me marcou bastante. Demos a 75 mil jovens, de 52 países, a oportunidade de serem vistos por treinadores e clubes. Alguns conseguiram mesmo atingir o sonho de uma vida, tornarem-se profissionais de futebol: o Tom Rogic, uma das maiores promessas do futebol na Austrália, que atua hoje pelo Celtic de Glasgow e pela seleção australiana de futebol, e muito provavelmente marcará presença na Copa das Confederações e Mundial na Rússia, ou o Abdul Waris e o David Titi Accam, ambos agora internacionais pela Seleção do Gana. O primeiro jogou contra Portugal no Mundial do Brasil. Estive no Gana, conheci as suas famílias, a sua história. Pessoas de origem humilde que hoje contribuem de forma exemplar para a comunidade que os viu crescer. Estes momentos, em que consegues mudar positivamente a vida de alguns destes jovens, valem tudo.
Qual é maior desafio da sua carreira? Desenvolver projetos à escala global, que envolvem a coordenação de múltiplas equipas distribuídas por diferentes geografias, exige alinhamento na mensagem que chega ao público em diferentes partes do mundo, mantendo relevância local. Este será talvez um dos grandes desafios, mas também uma oportunidade de trazer sabores diferentes para a nossa comunicação, segmentando e servindo diferentes públicos de forma pessoal. “Branded House Vs. House of brands”.
De que é que não abres mão como líder? Para mim, é fundamental a fusão da arte e ciência em todos os projetos que estou a gerir, desde a sua fase de concepção. Executar produtos, serviços e comunicação premium e criativa, mas validada por dados e pesquisa de consumidor é absolutamente crítico na realidade atual. Estabelecer objetivos específicos e mesuráveis e monitorizar performances constantemente, é algo que não dispenso e a que recorro para fazer mudanças em tempo real, se necessário.
Estás nomeado para um dos prémios mais relevantes para quem se movimenta na indústria desportiva mundial, o “Leaders under 40”. Qual é o peso desta nomeação? É um orgulho imenso ver o nosso trabalho ser reconhecido em fóruns tão prestigiados como o “Leaders Under 40”. Mas esta nomeação nāo é apenas focada em conquistas individuais. Ela premeia o esforço coletivo de um grupo de trabalho extremamente talentoso, que demonstra inesgotável paixão no serviço dos nossos consumidores diariamente. O reconhecimento ganha ainda mais valor quando olhamos a lista de ilustres candidatos. Centenas de indivíduos, de quase 50 países, representando as melhores organizações e entidades desportivas do planeta. Ser escolhido por um júri composto por 60 elementos entre líderes da indústria, conselheiros académicos e personalidades do desporto é simplesmente fantástico. Que este seja um ponto de ignição para o reconhecimento externo do talento nacional que existe na área do marketing, do digital e da tecnologia aplicados ao desporto. E que de resto, acontece já com os nossos atletas, treinadores e agentes desportivos. O talento não escasseia entre os portugueses. Temos profissionais e empreendedores de muito valor que podem ajudar na inovação de processos e dinamização do desporto enquanto negócio à escala global.
Qual é a sua grande ambição profissional? O meu sonho estou a vivê-lo diariamente. Faço aquilo de que gosto, é um prazer ir trabalhar. Mesmo em alturas de maior stress, sinto-me extremamente motivado e dou o melhor de mim constantemente, procurando desafiar e evoluir sempre as minhas competências. Liderar o marketing de uma marca forte em Portugal, trabalhando na sua expansão internacional, seria sem dúvida um desafio que me daria imenso prazer abraçar no futuro. Colocar toda a minha experiência internacional e know-how de brand (marca) e business (negócio) ao serviço de um projeto com selo nacional é algo que não descarto.