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Detenção de Bruno de Carvalho “não tem nenhum reflexo no Sporting”

Detenção de Bruno de Carvalho “não tem nenhum reflexo no Sporting”

O vice-presidente da sociedade anónima desportiva do Sporting, Francisco Zenha, reconhece que o juro de 5,25% oferecido no empréstimo obrigacionista em curso é “caro”, mas diz que é preciso dar “um prémio de confiança” aos investidores

Detenção de Bruno de Carvalho “não tem nenhum reflexo no Sporting”

Pedro Lima

Editor-adjunto

As detenções do antigo presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, e do líder da Juventude Leonina, Nuno Mendes (conhecido como Mustafá) no domingo não deverão ter impacto na situação financeira da sociedade anónima desportiva (SAD) do Sporting. E, como tal, não deverão prejudicar a emissão obrigacionista em curso – que termina no dia 22 deste mês -, através da qual a SAD pretende financiar-se em €30 milhões, com uma maturidade de três anos e uma taxa de juro de 5,25%.

Esta é pelo menos a convicção de Francisco Zenha, vice-presidente com a área financeira da SAD do Sporting, quando questionado sobre o potencial impacto dos últimos desenvolvimentos, que podem dar força aos jogadores do clube que rescindiram contrato – e aos clubes para os quais foram jogar. Em causa estão as agressões a jogadores e equipa técnica na Academia do Sporting em Alcochete, em maio, por membros da Juventude Leonina, que levaram à rescisão de contrato de uma série de jogadores. Uns acabaram por voltar ao clube, outros chegaram a acordo – como o guarda-redes Rui Patrício - mas há ainda casos em litígio – Daniel Podence, Gelson Martins, Ruben Ribeiro e Rafael Leão. A SAD assume no prospeto da emissão obrigacionista que, além de poder não receber nada com as saídas desses jogadores, pode ter ainda de pagar-lhes €6,8 milhões em indemnizações.

“Não sou jurista mas do meu conhecimento estes casos não têm diretamente nenhum reflexo na entidade Sporting Clube Portugal nem na Sporting SAD, para além do ruído que existe”, afirma. Assim sendo, rejeita a hipótese de afastarem potenciais investidores.

“A perceção que tenho é que os clubes de futebol que estão relacionados com os jogadores [que saíram] têm boas intenções e pretendem resolver os problemas de forma amigável. Foi assim com o Rui Patrício e parece-me que será assim com os próximos, quando forem encetadas negociações. Estou confortável com essa situação”, disse Francisco Zenha num encontro com jornalistas esta quinta-feira.

“Já resolvemos aquele que seria o caso mais importante, o do Rui Patrício”, acrescentou.

O gestor refere que eventuais conversas com clubes que contrataram os jogadores que saíram são “confidenciais”. “Todos os contactos que foram feitos com esses clubes foram legítimos”. E não confirma as afirmações do antigo jogador Paulo Futre que esta quarta-feira à noite disse que um acordo com o Atlético de Madrid em torno de Gelson Martins estava próximo.

Quanto ao facto de o clube ter voltado a ser falado por razões extra-desportivas, o que já não acontecia há algum tempo, o vice presidente do Sporting refere que obviamente gostaria que as notícias sobre o clube fossem sobre o empréstimo obrigacionista em vez de serem sobre os “outros acontecimentos” que não são bons para o clube.

“Penso que os investidores e os sportinguistas em geral distinguem bem o que foi a administração anterior - e um evento que é passado e está a ser tratado na justiça - do que é hoje o Sporting com uma administração nova. São momentos, administrações, paradigmas diferentes. É a esperança que eu tenho, que as pessoas tenham noção disso”.

As detenções não introduzem, assim, nenhum fator novo que leve o Sporting a alertar para riscos acrescidos, e por esse motivo o gestor considera que não faz sentido alterar o prospeto da emissão obrigacionista. “Os fatores de risco já lá estão” referidos. “Não vale a pena chover no molhado”.

Operação termina a 22 de novembro

A SAD tem até esta sexta-feira para tomar a decisão de aumentar a emissão obrigacionista para lá dos €30 milhões. Esta operação visa proceder ao reembolso de uma outra emissão obrigacionista de €30 milhões, que vence a 26 de novembro. Em maio houve uma primeira tentativa que acabou por ser frustrada e a SAD acabou por propor o adiamento da emissão.

A SAD assume, por outro lado, que “tem já garantidos fundos próprios decorrentes da sua atividade operacional, no valor de €15 milhões” pelo que na prática a operação poderá concretizar-se apenas com mais €15 milhões, que Francisco Zenha não confirma ter já garantidos. Apenas diz: “a operação está a andar, começámos na segunda-feira, a nossa convicção é que vai correr bem”.

Francisco Zenha não rejeita a ideia de que o juro de 5,25% que está a ser oferecido a quem comprar as obrigações seja elevado. “Para mim é caro. Sentimos que depois destes meses de turbulência tínhamos de dar um prémio” sobre os concorrentes, que fizeram operações destas recentemente – a SAD do Porto ofereceu 4,75% e a do Benfica ofereceu 4%. “Achámos que esse prémio de confiança era merecido. Mas eu não gostava de emitir um montante enorme com esta taxa, por isso é que descartei logo montantes muito altos. Acho que está caro”.

Diz não temer que o Sporting fique com uma imagem de que é muito arriscado por estar a pagar mais juro do que o Benfica e o Porto. “À medida que o tempo for passando as pessoas vão ganhando cada vez mais credibilidade em nós”.

É que, em maio, o valor pedido na operação que acabou por cair era de 6%: “Era caríssimo, mas foi no meio da turbulência que a anterior administração decidiu colocar esse valor, foi um momento de desespero”.

É algo que já lá vai, adianta Francisco Zenha: “Tivemos resultados negativos e ficámos com capitais próprios negativos no final de junho. Mas neste primeiro trimestre [de julho a setembro] tivemos €16 milhões de resultados positivos, passámos a capitais próprios positivos e entre outubro e dezembro vamos contabilizar a mais-valia de €14 milhões com a venda do Rui Patrício. A perspetiva hoje é muito mais positiva”, acrescenta. “Temos o Sporting em segundo lugar, uma nova administração a cumprir o que prometeu, uma nova equipa técnica, estamos a montar uma estrutura de futebol que me parece muito forte. Estamos a fazer um trabalho a nível de estrutura que não tinha sido feito até agora e a dinamizar os departamentos comerciais e de marketing. Temos uma estratégia bem delineada que confiamos que nos vai levar ao sucesso não só desportivo como também financeiro”.

Quanto à auditoria de gestão que foi pedida, está ainda em curso. “Provavelmente não teremos resultados antes de janeiro”.

Francisco Zenha diz também, por outro lado, que após a conclusão da emissão obrigacionista, haverá uma conversa com os bancos no sentido de renegociar o acordo quadro de reestruturação financeira.

“Estamos a trabalhar com o acordo quadro original de 2014. Em abril foi negociado um princípio de acordo com a administração anterior, mas não há nenhuma vinculação a ele. O que acordámos foi falar com os bancos a seguir”. E não admitem que na sequência dessas conversas venha a ficar um princípio de acordo pior do que aquele que foi negociado em abril? “É bastante óbvio que não. Não vejo nenhum motivo para que seja assim”.

Pouco tempo para preparar a operação

O novo presidente do Sporting, Frederico Varandas, tomou posse a 9 de setembro, após ter vencido as eleições com 42,32% dos votos. “Uma das coisas que esta administração sempre tentou passar foi credibilidade e confiança. Já tivemos reuniões com praticamente todos os parceiros e temos sentido a confiança deles”. Francisco Zenha refere que o facto de esta emissão, face à tentativa de maio, ter mais bancos grandes colocadores é um sinal dessa confiança. “Em maio só tínhamos dois grandes grupos bancários a participar nesse empréstimo, o BCP e a CGD. Agora já temos o Novo Banco connosco. Isto já é um sinal de força e de credibilidade nesta administração. Se isto já é uma mensagem de credibilidade, parece-me que sim”.

Quanto ao legado da anterior administração, Francisco Zenha refere que, “do ponto de vista financeiro não vimos nenhum buraco, nenhuma anormalidade. Os resultados do ano que terminou em junho de 2018 foram auditados. E auditámos os do primeiro trimestre (do início de julho a final de setembro), o que nem é comum. Os nossos rivais nem sequer publicam resultados trimestrais, nós não só os publicamos como os auditamos, para mostrar que aqui não há nada a esconder. Não vi nada do ponto de vista financeiro que me preocupasse”.

Bruno de Carvalho foi então bom para o Sporting do ponto de vista financeiro? “Não podemos apagar nem esquecer o passado, mas também não nos podemos condicionar por ele. Houve coisas bem feitas na última administração do ponto de vista financeiro, mas houve outras que não foram bem feitas. Por exemplo, o caso do empréstimo obrigacionista de abril/maio é o exemplo de uma forma de estar com a qual eu não me identifico. Como em qualquer empresa não podemos ficar à espera do último mês para rolar uma dívida. Faz-se com a devida antecedência porque pode acontecer uma situação imprevista. A gestão deste empréstimo obrigacionista devia ter sido feita de outra forma. Herdámos este empréstimo e fizemos um excelente trabalho em lançar a nova emissão num curto espaço de tempo”.

Isso levou a que a SAD não tivesse oportunidade de criar uma campanha em que apelasse ao ‘sportinguismo’ dos adeptos ao contrário do que aconteceu noutras operações. “Para ser franco, não tivemos tempo para alterar o material publicitário, usámos o que estava feito desde maio. Quando chegámos tivemos de trabalhar com o que tínhamos”, afirma o vice-presidente da SAD do Sporting.

O gestor rejeita a ideia de situação de “pré-falência”, alertando para o facto de o futebol ser um negócio sui generis. “Nos últimos 10 anos o Sporting só em dois anos não esteve praticamente em falência técnica”.

“Isto sempre foi assim, é assim em todos os clubes e de repente, num momento em que somos nós, fala-se de coisas que sempre existiram. E ainda por cima nós até estamos numa situação melhor em termos relativos”, adianta, lembrando que as contas estão a apresentar melhorias. “Os cerca de €500 mil de capitais próprios positivos que o Sporting teve a 30 de setembro foram dos melhores resultados que o Sporting teve nos últimos 15 anos. Mas eu quero – e vou – fazer muito melhor do que isso”.

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