Portugal pode ter mais gente a surfar nos Jogos Olímpicos. 'Só' tem de tirar partido de uma vantagem
Damien Poullenot/WSL
"A seleção nacional de surf compete nos ISA Games, em El Salvador, a partir deste sábado, para tentar colocar mais três surfistas (um homem e duas mulheres) nos Jogos Olímpicos. O selecionador nacional, David Raimundo, explica como a rodagem competitiva dos cinco surfistas em Portugal, além de Frederico Morais, é "uma mais-valia", porque há "vários países" cujos atletas "já não competem há muitos meses"
O tempo já lá vai, foi em 2019 e aconteceu nas águas escuras do Japão, onde Frederico Morais acabou como o melhor surfista europeu nos ISA (International Surfing Association) Games e garantiu uma vaga para Portugal em Tóquio, supostamente dali por um ano. Achávamos nós que pouco faltava até se avistar, pela primeira vez, humanos de pé em cima de pranchas e a deslizar sobre ondas nos Jogos Olímpicos.
A obra foi custosa, a vizinhança no oceano era tramada e nos mesmos metros cúbicos de água salgada houve os brasileiros Gabriel Medina e Ítalo Ferreira, ou os americanos Kelly Slater e Kolohe Andino, para exemplificar gentes experimentadas no circuito mundial da World Surf League (WSL).
Nas mulheres, tão pouco era costume ver as brasileiras Tatiana Weston-Webb and Silvana Lima, a sul-africana Bianca Buitendag, as australianas Stephanie Gilmore, Nikki Van Dijk e Sally Fitzgibbons ou a americana Courtney Conlogue a competirem nesta prova. Aumentaram o nível, a densidade de talento cresceu e Teresa Bonvalot, Yolanda Hopkins e Carolina Mendes não conseguiram vagas femininas para Tóquio.
Não era a principal via de acesso aos jogos dos aros e dessa prova sairiam apenas quatro surfistas masculinos, mais outras tantas surfistas apuradas. Uns meses volvidos, os 10 melhores homens e oito primeiras mulheres dos principais rankings mundiais da World Surf League (WSL) juntar-se-iam a esses convivas - ou, melhor descrevendo, garantiriam vagas para os seus países enviarem surfistas para Tóquio.
Haverá 40 pessoas, repartidas pelos dois géneros, a surfarem olimpicamente no Japão este verão. No máximo, cada país poderá lá ter dois homens e um par de mulheres e a partir deste sábado e até 6 de junho, as últimas 12 vagas estarão à mercê nas águas de El Salvador.
E as ondas voltarão a estar carregadas de talento.
Basta calcorrear um pouco pelo site dos ISA Games para o constatar: pela Austrália, vão surfar Owen Wright, Julian Wilson, Ryan Callinan, Sally Fitzgibbons (vencedora da última etapa de do circuito mundial feminino da WSL), Stephanie Gilmore (a sete vezes campeã mundial) e Nikki Van Dijk; pelo Brasil, haverá Itálo Ferreira (campeão mundial em título), Gabriel Medina (atual líder do ranking masculino) e Filipe Toledo; e os EUA terão Carissa Moore e Caroline Marks.
Tantos parágrafos de contexto para engrandecer o nível e, por arrasto, a enormidade da tarefa que Frederico Morais, Vasco Ribeiro, Miguel Blanco, Teresa Bonvalot, Yolanda Hopkins e Carolina Mendes terão em cima das pranchas em El Salvador, todos eles "bem preparados e supermotivados".
A garantia é de quem os escolheu para estarem ali, ciente de que todos, salvo Kikas - único português presente no Championship Tour (CT) da WSL -, tiveram a sorte de estarem num dos poucos pedaços de terra no planeta que teve competição interna durante os últimos meses.
Associação Nacional de Surfistas
David Raimundo explicou-nos que o facto de todos terem surfado contra alguém, com uma licra colorada sobre o fato, com juízes a esmiuçarem-lhes a perícia nas ondas e o tico e o teco nas suas cabeças a ter de lidar com isso pode ser "superimportante e determinante" nos ISA Games, onde estão "vários países" cujos atletas "já não competem há muitos meses".
Mesmo reconhecendo "a mais-valia" de os seus esqueletos terem o ritmo das três etapas da Liga Meo que pararam na Ericeira, na Figueira da Foz e em Matosinhos, além de dois eventos do circuito de qualificação (QS, ou Qualification Series) da WSL, o selecionador nacional explicou que não será isso a desnivelar a competição: "é uma prova muito dura e muito longa e que requer uma concentração e uma consistência muito grande durante os nove dias de prova".
O treinador ressalvou, também, que "praticamente toda a equipa fez bons resultados nestas provas". Teresa Bonvalot, Carolina Mendes e Yolanda Hopkins, por exemplo, já "fizeram finais nestes campeonatos" - a primeira, aliás, chegou a viajar este ano para ir treinar nas ondas de El Salvador. Nos homens, Vasco Ribeiro vence duas provas do circuito nacional desde abril e já garantiu o título europeu; Miguel Blanco falhou a primeira etapa da Liga MEO, devido a lesão, mas "tem vindo a subir de forma" e a "evolução do seu surf em El Salvador é impressionante".
Depois, claro, há Frederico Morais, que foi à Austrália buscar "o seu melhor arranque de sempre no World Tour" e, mesmo já tendo garantindo uma vaga para Portugal, poderá voltar a surfar até um resultado que permita ao país qualificar outro surfista para Tóquio.