Se Federer fosse um jovem, como lidaria com as redes sociais e a pressão? “Não faço ideia. Temos de nos lembrar que também somos humanos”

Editor
Um cisne em movimento, gracioso em cada pancada, ainda para mais a ter de segurar uma raquete e correr com ela em punho, é uma das descrições que assentam em Roger Federer, o já quarentão tenista que há algum tempo coloca toda uma modalidade em espécie de negação, a espreitar por entre os dedos que tentam tapar o olhar para a inevitabilidade de o tempo do suíço nos courts estar a minguar, aos poucos, enquanto a idade carcome-lhe as articulações: “Não serei daqueles a ficar por cá só porque quero continuar por cá. Não quero abusar do meu corpo”.
É mais um sinal da derrota só possível de ser adiável, como cada vez mais humanos fazem, embora nunca evitada. A vitória da idade e o dia em que chegará a retirada foram questões a que Roger Federer teve de responder, numa entrevista à edição britânica da revista “GQ” que lhe auscultou os pensamentos sobre o quão mais poderá esticar a sua carreira, além de assuntos ligados a quem tem estado mais ativo nos campos do que o suíço, mais preocupado em dar descanso aos joelhos até à próxima época.
Disse quem falhou os Jogos Olímpicos por esse motivo que “não estava a 100%” e percebeu-o no início de julho, quando foi eliminado nos quartos-de-final de Wimbledon por Hubert Hurkacz. “A decisão foi baseada puramente no joelho, soube que não deveria estar a jogar”, confirmou, explicando que sentia “desilusão e fúria no final de cada jogo” devido às dores que lhe afetavam a forma. Federer não joga desde esse dia, em que o público se levantou em apoteose para se despedir dele e o suíço se apressou a sair — “o palco, nesse momento, é do vencedor”.
E, saindo do campo, pensou em outra coisa.
E voltou a matutá-la quando o jornalista lhe perguntou sobre Emma Raducanu, o novo prodígio precoce do ténis que tomou o US Open aos 18 anos, vinda do qualifying, e à brutal habilidade tenística junta agora o jogo de cintura que a pressão mediática lhe exige. “Nos primeiros 10 anos da minha vida [no ténis] não existiam redes sociais, talvez só tinha o meu site. Hoje, o stress é tão grande. E dói ver o que lhes acontece e quando não se sentem bem”, admitiu Federer, referido-se também a Naomi Osaka, que recentemente revelou os seus problemas de relação com a imprensa e as repercussões na sua saúde mental.
Roger Federer defende que tenistas e jornalistas se deviam “reunir numa sala” e dizerem “ok, o que funcionaria para ti e o que funcionaria para nós”. O suíço sublinha que “a situação deve ser reconsiderada” por ser “necessária uma evolução”, porque as conferências de imprensa “são sempre as mesmas, sempre”, e quem o diz é “um dos atletas que fez mais media de sempre”. Ainda admitiu que “não tem ideia de como lidaria” com as redes sociais se fosse um jovem tenista, em início de carreira: “Por cada 10 comentários há sempre um negativo e, claro, é nesse que te focas. Até quando me sinto em baixo, sei que tenho de me comportar de uma certa maneira diante da imprensa. Temos que nos lembrar de que os tenistas são atletas e profissionais, mas também somos humanos”.
Sobre a idade que continua a ludibriar e fintar, o suíço explicou-a com base nos sinais que vai recebendo do corpo. “Quando tens 20 anos e sentes alguma coisa nas costas, tens um par de noites de bom sono e está feito. Hoje em dia, a dor pode durar dias, semanas ou mais”, contou. Aos 40 anos, que completou em agosto, “tens de ser mais esperto”.
Federer confessa gostar de pensar nessa “estratégia”, de como gerir as maleitas e os sinais do corpo. Admite que tem de ir com calma e quanto a conversa mesclou a sua idade, os 20 títulos do Grand Slam e os outros dois monstros do ténis, o suíço intuiu que Novak Djokovic “não sabe” em que ponto ele, ou Rafael Nadal, estão nas suas carreiras, quando disse que nenhum deles vai parar de tentar conquistar mais: “Obviamente que estava a falar só por ele, em adrenalina. Mas a intenção é boa, claro, e acho que este [próximo] ano vai ser fenomenal. É incrível que todos tenhamos 20 Grand Slams (...) mas acho que os outros estão num mindset diferente do meu, neste momento”.
É de crer que o suíço, queiram os seus joelhos, ainda competirá pelo menos no Open da Austrália e em Wimbledon, os majors que tem preferido nesta fase da carreira em que tem de dosear os esforços para prolongar a sua lenda no ativo. Mas, acha Federer que a marca dos 20 Grand Slams conquistados, ou os que forem, irá ser batida por alguém de uma nova geração futura? “Sim, acho que hoje em dia é mais fácil dominar em diferentes superfícies. Antes, os tenistas não iam atrás de slams, nem de recordes atrás de recordes. Agora, esse tipo de estratégia faz parte das carreiras. Acredito que um novo jogador incrível vai bater os nossos 20 Grand Slams, eventualmente”, respondeu, à “GQ”.
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