Ténis

No duelo do futuro que já é presente, Gauff olhou para Andreeva, viu o seu passado e derrotou-o em Roland-Garros

No duelo do futuro que já é presente, Gauff olhou para Andreeva, viu o seu passado e derrotou-o em Roland-Garros
EMMANUEL DUNAND/Getty
No embate mais jovem do século na terceira ronda do Grand Slam parisiense, a norte-americana, de 19 anos, deu a volta no marcador e bateu a russa, de 16 voltas ao sol, por 6-7 (5), 6-1 e 6-1. A mais nova das adolescentes mostrou o muito ténis que tem em si, mas a 6.ª do ranking WTA aproveitou as quebras de Mirra, foi mais consistente e impôs-se
No duelo do futuro que já é presente, Gauff olhou para Andreeva, viu o seu passado e derrotou-o em Roland-Garros

Pedro Barata

Jornalista

O encontro parecia um espelho com a capacidade de viajar no tempo, uma imitação do trajeto que uma delas já fez e a outra está a realizar. Ser a menina prodígio do ténis, quebrar recordes de precocidade, ser a novidade no circuito WTA, ganhar nos maiores palcos antes de ter idade para votar ou conduzir.

Para Coco Gauff, 19 anos e 6.ª do ranking, olhar para Mirra Andreeva, 16 anos e 143.ª da hierarquia, deve ser o mesmo que fazer scroll no Instagram e viajar até à suas memórias de 2019. Nesse ano, a norte-americana tornou-se na mais jovem de sempre a ganhar um torneio WTA, em Linz, e a superar a qualificação de Wimbledon, tudo com 15 anos.

Quatro voltas ao sol passadas disso, Gauff ainda é uma adolescente mas já parece uma habitual do circuito, top 10 consolidado e atual vice-campeã de Roland-Garros. O conto de fadas está, agora, do outro lado, da parte de Andreeva, a mais precoce na terceira ronda em Paris desde Sesil Karantantcheva, em 2005, e a primeira sub-17 a ganhar dois encontros no quadro principal no major de terra batida desde a portuguesa Michelle Larcher de Brito, em 2009.

Desde 1997, quando Martina Hingis bateu Anna Kournikova, que não havia uma contenda tão jovem na terceira ronda de Roland-Garros. Nesta cimeira do futuro disputada no presente e que colocou Gauff a olhar para o seu passado, a norte-americana ganhou, dando a volta à desvantagem no set inaugural para se impor por 6-7 (5), 6-1 e 6-1.

O primeiro parcial desilidiu quanto ao nível exibicional demonstrado. Muitos erros, duplas faltas — só Gauff fez cinco — e uma constante troca de quebras de serviço. Nos primeiros 10 jogos de saque, só não houve breaks em quatro.

Com mais erros do que acertos, os melhores momentos da partida inaugural vieram, ainda assim, da siberiana de 16 anos cumpridos em abril, da jovem que treina em França e está apenas no seu terceiro torneio no circuito principal.

Mirra cita Jabeur como a jogadora mais parecida a si e, nos melhores momentos do encontro para a russa, percebeu-se porquê. Um ténis variado, com bolas longas e curtas, arriscando esquerdas paralelas ou subidas à rede.

EMMANUEL DUNAND/Getty

Das mãos de Andreeva saíram amortis suaves e precisos, bolas esvoaçantes que colocaram o público de Paris de pé. No desempate, ganhou o primeiro set.

No entanto, Gauff ganhou a consistência que lhe faltava a partir dali. Depois dos 62 minutos que durou o parcial de abertura, os outros dois tiveram uma duração total de somente 63 minutos.

Com muitos menos erros, a norte-americana foi ganhando conforto no marcador. Ali, naquela mudança de ascendente, a finalista vencida da passada edição evidenciou o seu fulgor físico e intensidade, levando o jogo para locais aos quais a preocidade de Mirra ainda não parece conseguir aceder.

Entrando em velocidade de cruzeiro, o triunfo de Gauff pareceu natural. Talvez beneficiando de ter olhado para o seu passado, de já ter estado no momento que se vive do outro lado, de já ter sentido o que Mirra estará a sentir.

Após o match point que deu a passagem aos oitavos-de-final à norte-americana, Gauff ficou alguns instantes a dizer umas palavras à sua adversária. Talvez estivesse a ajudá-la a digerir o momento da derrota, dando-lhe de beber da sua experiência para lidar com as dificuldades de ser uma jovem prodígio. Depois do conto de fadas de Paris, agora começa uma nova vida para Andreeva, já com todos os olhares postos em cima de si, sem tempo para ter 16 anos novamente.

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