Não há um momento certo ou errado para se enterrar uma relação, seja de que tipo for, a nossa cabeça pode matutar acerca do timing o quanto desejar que nunca fará as pazes com uma decisão e foi mais ou menos isso que Novak Djokovic disse a Goran Ivanisevic nos EUA, em março. “Há apenas o momento em que acontece, quando duas pessoas concordam que chegou o tempo”, disse o tenista ao treinador segundo o relato de quem outrora jogou e sabe aferir o desgaste de um relacionamento destes. “Houve uma fadiga gradual que se construiu em mim e nele”, resumiu Ivanisevic, e “se há uma razão essa foi a saturação”.
No seu tempo um vencedor de Wimbledon, em 2001, quando a organização o agraciou com um wild card para ele empunhar o serviço canhão que o caracterizava, o croata falou candidamente ao “Sportklub”, um canal de televisão dos Balcãs, sobre as agruras da separação. Ao fim de 12 torneios do Grand Slam conquistados, “os resultados falam por si” e Ivanisevic está “eternamente grato” a Djokovic, mas a relação jogador-treinador começou a ser corroída “pelo certo limbo” que a afetou durante a pandemia, quando Novak “era visto como o maior vilão do planeta” face à sua decisão em não se vacinar.
Terá sido o vai-não-vai de “jogar, não jogar, estar pronto outra vez, as restrições mudarem” e serem proibidos de entrar num país, tudo a par “do caos” na Austrália, de onde o tenista foi deportado em janeiro de 2022. Curada a pior fase da humanidade a lidar com a covid-19, haveria mais vitórias, Djokovic retornou aos seus hábitos dominadores em Grand Slams, ultrapassaria Rafael Nadal na hierarquia extraterrestre de quem ganhou mais títulos. Mas, quase seis anos depois, “basicamente” ambos fartaram-se um do outro. “Eu cansei-me dele, ele cansou-me de mim”, confessou Goran Ivanisevic na entrevista traduzida pelo site “Tennis Majors”, na qual atestou que “de qualquer forma” já não sentia que “podia ajudar” Novak.
O ano passado, em Wimbledon, um dos melhores encontros da temporada teve o sérvio a perder com o prodígio Carlos Alcaraz, a relva londrina acolheu um choque de gerações a precipitar-se na rede que sorriu ao espanhol, mas não foi aí que o treinador sentiu os primórdios da separação. Seria pouco depois, na ‘perna’ norte-americana. Djokovic vingou-se do espanhol no Masters de Cincinatti em mais um jogaço e conquistaria nas semanas seguintes o US Open - e porque o simbolismo destes feitos também picotam a mente de tenistas e adeptos, também foi aí que o sérvio ultrapassou o recorde de Roger Federer de meias-finais jogadas em majors.
Os perlimpimpins saídos da raquete do sérvio reapareciam, aos 36 anos mantinha-se no topo, mas Goran Ivanisevic sentia “que o fim estava próximo”.
Em 2024, quando aterraram no happy slam australiano, o croata “já sentia bastante cansaço” e lá perderam nas meias-finais para a cenoura aos caracóis no cabelo de Jannik Sinner, bombástico italiano que também está a tomar o circuito de assalto. Novak Djokovic “não estava em si” e o tenista nascido na região de Tirol do Sul “é demasiado bom para não se chegar” ao jogo “perto dos 100%”. A idade e o vagar a imporem que deixe passar mais tempo entre torneios, o sérvio só reapareceu nos courts em março, nos EUA, para os Masters de Indian Wells e, supostamente, o de Miami.
A sua estadia no primeiro fez-se curta, perdeu em três sets logo na segunda ronda com Luca Nardi, apenas o então 123.º melhor tenista do ranking. O primeiro parcial desse jogo foi “talvez o pior” que Ivanisevic o viu fazer em cinco anos e Aleksandar Vukic, a quem ganhou na ronda anterior, “também o poderia” ter derrotado. Djokovic abdicaria de competir no torneio seguinte, invocando “questões pessoais” que o seu antigo treinador resume na “vontade em passar mais tempo com a família”.
E afinal, “quem o pode culpar?”
A entrevista ao “Sportklub” de Goran Ivanisevic termina com ele a elaborar sobre os meandros da motivação, do desejo e do querer necessários a qualquer desportista que logra fazer uma carreira nos píncaros da sua modalidade. Essa pouco humana aptidão, incompreensível aos comuns mortais, requer “força, paixão, força de vontade” para um dia a seguir a outro e depois todos os seguintes um tenista “treinar com intensidade” na expressão que em inglês diz tudo, “over and over again”. E seria em Miami, cara a cara, que os amigos cansados tiveram a conversa do divórcio.
“Sentámo-nos com simpatia, relaxados, falámos e rimos, e para mim foi importante dizer-lhe certas coisas sobre como me sentia”, contou Ivanisevic, “ele disse-me como se sentia e foi bastante agradável”. Era o fim da relação que elevou ao terraço máximo do ténis um tipo chamado Novak Djokovic, que “quando as câmaras se desligam e ele está em si”, é “uma boa pessoa, com um coração grande”. Durante cinco anos, o croata esteve “disposto a morrer” pelo sérvio “se fosse necessário”.