Cristiano Ronaldo envelheceu e está tudo bem

Editor de Sociedade
Uma das propriedades definidoras da internet é que esta não esquece. Para o bem e para o mal ou apenas para puro entretenimento, o que foi feito, escrito, gravado e publicado por lá fica e é facilmente repescado num motor de busca qualquer.
Neste aspeto, o YouTube é especialmente rápido e eficaz a devolver o que procuramos, dispensando-nos a busca por palavras-chave adequadas. Basta, por exemplo, escrever Cristiano Ronaldo e temos então quase toda a vida de Cristiano Ronaldo compartimentada em pequenas caixas de vídeo, em toda a sua glória, esplendor, sacrifício, golos, fintas, montagens, bloopers, gifs e momentos constrangedores.
Outra das caraterísticas da internet é que esta não perdoa e portanto aqueles deslizes que muitos gostariam de apagar da memória coletiva continuam lá, implacáveis.
Cristiano Ronaldo a chorar. Cristiano Ronaldo com as suas Gucci duvidosas. Cristiano Ronaldo a ensaiar o seu inglês de praia. Cristiano Ronaldo a tentar esconder a desilusão quando o seu busto foi descerrado no aeroporto da Madeira.
Mas o YouTube permite-nos também perceber quanto e como Cristiano Ronaldo foi mudando ao longo dos anos da sua longa carreira. Não vos direi nada de novo.
Ronaldo passou por várias etapas: malabarista, extremo imbatível no um-contra-um, sprinter vigoroso, batedor de livres com assinatura, segundo avançado e goleador. Isto aconteceu por dois motivos, a legítima a ambição de colecionar títulos individuais e o avanço da idade que ele tentou atenuar com uma hábitos monásticos, uma dieta rigorosa e transformações físicas evidentes. O Cristiano Ronaldo de hoje pesa menos e tem menos massa muscular do que o Cristiano Ronaldo de 2014: menos volume para transportar traduz-se em maior disponibilidade física e menor desgaste nas articulações.
Ainda assim, Ronaldo envelheceu.
No jogo contra a França, notaram-se as dificuldades nos dribles, as reações mais lentas e nem o ritmo footing dos últimos minutos passou despercebido. O CR7 é agora um finalizador puro, um futebolista de jogadas com poucos toques, cuja presença em campo tem efeitos cénicos e práticos: os adversários temem-no porque a sua taxa de eficácia em frente à baliza é ótima - e porque os golos acontecem.
E Ronaldo parece estar a conviver bem com o fim da carreira que se aproxima. Reconhece e aceita as limitações (“não sou o mesmo jogador de antes”), tem uma perspetiva darwinista sobre a vida (“a palavra é adaptação”) e o que lhe falta em resistência, sobeja-lhe em inteligência emocional.
Tem alguma questão? Envie um email ao jornalista: pmcandeias@expresso.impresa.pt