Diogo Ribeiro queria que isto ficasse escrito: “Ontem chorei com a minha família, não sabia o que é que se estava a passar”
JOSÉ SENA GOULÃO
“Nunca me correu mal numa prova, mas estar nos Jogos Olímpicos a correr mal…”, diz o jovem, justificando a causa do choro que, nos últimos dias, lhe tem escorrido pela face. Muito emocionado, o português, depois de atingir as meias-finais dos 50 livres, refletiu sobre os últimos dias, recordando o menino de 16 anos que viu “os Jogos de Tóquio na cama, sem saber se poderia voltar a praticar desporto”. “Nos Jogos para ganhar experiência e estar aqui uma primeira vez, são os Jogos em que sei que posso fazer mais”, garante
“Amo muito a minha família, sou muito feliz por ter quem tenho ao meu lado. E a minha namorada também, pá… Ontem à noite, e em muitos dias, ando a chorar, preocupado com as coisas, por não me sair bem.”
É assim, num turbilhão de emoções, que Diogo Ribeiro fala na zona mista da La Defénse Arena, minutos depois de passar às meias-finais dos 50 metros livres. Diz que não se sente na melhor forma. Que anda “preocupado”, os treinos não lhe estão a agradar.
Nunca lhe correra mal. É assim quando se é campeão nos escalões jovens, quando se ganham medalhas em Europeus e Mundiais absolutos sendo um adolescente, a derrota é uma coisa estranha. Não ser o melhor é uma sensação nova.
“Ontem chorei com a minha família, não sabia o que é que se estava a passar. Nunca me correu mal numa prova, mas estar nos Jogos Olímpicos a correr mal… Estava triste”, assume o jovem, talvez recordando-se de ter ficado de fora das meias-finais dos 100 metros livres.
Ele até costuma dizer à família que não venha às provas, “para não gastarem dinheiro”. Mas, nestes dias, está-se a “aperceber o quão importante” é a presença dos que ama. Permite-lhe chorar. Permite-lhe libertar a frustração. Ontem à noite chorou, hoje brilhou.
JOSÉ SENA GOULÃO/Lusa
Chegou às eliminatórias apenas com o 26.º melhor tempo. Fez o 13.º melhor, um 21.91 igual à lenda Caeleb Dressel, “uma referência”, como “se fosse o Cristiano Ronaldo”, compara.
Diogo ganhou a sua série. E até ele se espantou com a sua velocidade. “Não estava à espera de ver a parede tão rapidamente. Quando ainda faltavam uns dois metros, e comecei a ver a parede, achava que ainda faltavam uns 10 metros”, diz.
O adolescente surge ainda ofegante. Os braços tremem-lhe um pouco, como quem acaba de viver uma experiência excitante, como um miúdo que ainda não se recompôs das emoções. “Nunca me tinham doído as pernas nos 50 metros livres, mas hoje doeram”, indica, entre risos de Diana Gomes, nadadora em Atenas 2004 e Tóquio 2008 e adida olímpica da comitiva. Diana está de um lado de Diogo, toda ela sorrisos. Do outro está Pedro Pauleta, o outro adido olímpico da comitiva.
O serão anterior a estas eliminatórias foi de choro, mas também de inspiração. Diogo viu o recorde mundial de Pan Zhanle nos 100 livres e ficou “uma hora a dizer ‘absurdo, absurdo’”. Diziam que esta piscina era lenta, “mas aquele tempo não pode acontecer numa piscina lenta”, atira. A marca do chinês fê-lo “mudar a cabeça”.
Nas meias-finais, a partir das 20h46, Diogo “vai dar tudo”. Parece liberto, livre de algum peso mental. Na sua face, água com cloro e uns pingos de água vinda dos olhos misturam-se, mesclam-se. “Nos Jogos para ganhar experiência e estar aqui uma primeira vez, são os Jogos em que sei que posso fazer mais.”
A emoção atinge um dos picos máximo quando o natural de Coimbra puxa a fita atrás. Lembra-se do acidente de mota que teve, o gravíssimo acidente que sofreu aos 16 anos: “Estava a ver os Jogos de Tóquio na cama, sem saber se poderia voltar a praticar desporto. Estava deitado na cama, em casa, a chorar… Sou um felizardo por estar nos Jogos. O Pierre de Coubertin dizia que participar nuns Jogos era só para seres extraordinários, mas eu acho que mereço ainda mais do que isso [participar]”.
JOSÉ SENA GOULÃO/Lusa
Há três anos, um menino de 16 anos chegou ao Centro de Alto Rendimento do Jamor. Esse miúdo faltava a treinos dois dias por semana porque “tinha saudades da família”, recorda o ainda miúdo, hoje com 19 voltas ao sol. E destaca “o esforço”, palavra que lhe sai permanentemente da boca.
Neste turbilhão de emoções, Diogo extrai uma lição: “Os melhores também se preocupam”. Sim, preocupam-se, choram, precisam de apoio.
Ainda sem parecer assentar na terra, tremendo um pouco dos braços, o jovem pede para deixar uma última mensagem: “Só posso agradecer muito a quem me ajuda. E à minha namorada, por me aturar.”