Ronaldo

Ronaldo pôs o laço, jantou com Trump na Casa Branca e o presidente dos EUA agradeceu: “O meu filho é um grande fã”

Ronaldo pôs o laço, jantou com Trump na Casa Branca e o presidente dos EUA agradeceu: “O meu filho é um grande fã”

No dia em que uma delegação da Arábia Saudita liderada por Mohammed Bin Salman, herdeiro ao trono do país e presidente do fundo soberano que é dono do Al Nassr, fez uma visita de Estado à Casa Branca, Cristiano Ronaldo esteve no jantar que se seguiu. O presidente norte-americano, Donald Trump, agradeceu a presença do português, dedicando-lhe algumas palavras para brincar com os créditos que ganhou junto de Barron, o seu filho mais novo. Foi a primeira vez que o capitão da seleção nacional esteve nos EUA desde 2018, quando foi conhecida a acusação de violação de Kathryn Mayorga

Ei-lo ao centro de uma longa mesa coberta a toalha branca, flores dispostas ao longo e altos castiçais a alumiarem a ocasião. Era ocasião para laçarote e não gravata, assim estava Cristiano Ronaldo, sentado com Georgina Rodríguez, a sua em breve esposa, no pomposo jantar na Casa Branca, em Washington, onde no meio de uma sala com alguns “dos maiores líderes mundiais em negócios e no desporto”, teve honras de dedicatória especial do presidente dos EUA, embora não precisamente virada apenas para o futebolista português.

Quando tomou a palavra antes da refeição para inaugurar o repasto, Donald Trump aludiu ao capitão da seleção nacional por o seu filho mais novo “ser um grande fã de Ronaldo”. Com a ida de Cristiano à sede do governo norte-americano, Barron “pôde conhecê-lo” e o 47º homem a sentar-se à secretária da Sala Oval regozijou-se por isso. “Acho que ele agora respeita um bocadinho mais o seu pai só pelo facto de os ter apresentado”, brincou Trump, citado pelo The Athletic, antes de procurar o português com o olhar: “Como tal, quero agradecer a ambos por estarem aqui.” Tanto quanto se sabe, terá sido a única referência ao português escutada durante o manjar.

Pouco mais se conhece como um facto acerca da ida de Ronaldo à Casa Branca, na terça-feira. Sabe-se que coincidiu com a visita de estado de uma delegação da Arábia Saudita encabeçada pelo príncipe herdeiro ao trono, mas não o principal líder do país, Mohammed Bin Salman. Disse-se, mas sem tal merecer confirmação oficial, que Cristiano viajou para Washington de jato privado, sem estar inserido na delegação oficial saudita. Sabe-se, porque o jogador o disse, que Bin Salman é “o nosso boss” e os factos secundam-no: MBS, sigla pela qual é vulgarmente conhecido, preside ao Fundo Soberano da Arábia Saudita (PIF) que é dono do Al Nassr, clube onde Cristiano joga desde 2022.

Era também sabido, desde há pouco mais de duas semanas, que o português desejava conhecer Donald Trump. “É um dos tipos que gostava de conhecer para nos sentarmos e conversarmos. Pode ser aqui, nos EUA, onde ele quiser. Sei que esteve aqui com o nosso boss, MBS. Espero que um dia aconteça porque ele é um dos tipos que pode fazer com que coisas aconteçam e gosto de pessoas assim”, admitiu na entrevista a Piers Morgan publicada recentemente e gravada não sabemos quando, em Riade, cidade onde Ronaldo joga. É desconhecido se, ao anunciar a vontade, Ronaldo já teria informações de que tal encontro seria possível ou se, entretanto e por o dizer em público, surgiu o convite do presidente dos EUA.

Donald Trump a dar as boas-vindas a Mohammed Bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita, à porta da Casa Branca, em Washington
Win McNamee

Porquê Ronaldo?

Prosseguindo no que é desconhecido, tão pouco se sabe quanto tempo privou Cristiano Ronaldo com Donald Trump, nem o porquê de o presidente norte-americano o ter convidado para o evento que juntou figuras cujos cargos e instituições nas quais o desempenham suplantam, na ótica geopolítica ou negocial do mundo, o peso prático de um desportista. Seja como for, Cristiano é hoje um embaixador de Portugal e mais do que um jogador de futebol, na descrição feita por Roberto Martínez, selecionador nacional.

É verdade que o futebol teve o seu peso um pouco acrescido com a presença de Gianni Infantino, chefe da FIFA desfeito em sorrisos, camaradagem e proximidade com o presidente dos EUA desde a sua reeleição. Mas, entre os citados “maiores líderes”, estiveram Elon Musk, CEO da Tesla e SpaceX, além de antigo conselheiro de Trump incumbido, durante alguns meses, de montar e comandar o Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) criado para cortar nos gastos do estado norte-americano. Ou Jensen Huang, diretor-executivo da Nvidia, empresa líder mundial na venda de chips que alimentam o boom da Inteligência Artificial e a primeira na história a ser avaliada em mais de 5 biliões de dólares. Outros convidados foram Lisa Su, CEO da rival AMD, ou Tim Cook, líder da Apple.

Todos são representantes de empresas com pegada mundial, responsáveis por movimentarem milhares de milhões de euros num mercado a que Cristiano Ronaldo, provavelmente o desportista mais popular do planeta, é alheio. Tanto quanto será em relação ao propósito da visita da delegação do reino da Arábia Saudita. Elogiado várias vezes por Donald Trump diante dos microfones de jornalistas como um parceiro de negócios e “um bom amigo”, Mohammed Bin Salman confirmou a intenção de investir 1 bilião de dólares nos EUA, um anúncio impensável há cinco anos.

Em 2020, um relatório dos serviços secretos do país considerou o herdeiro ao trono da Arábia Saudita o responsável pela morte de Jamal Khashoggi, colunista do The Washington Post, dentro do consulado saudita em Istambul. O jornalista, que vivia exilado nos EUA, foi assassinado e desmembrado, em 2018, por agentes do reino do Médio Oriente e no interior de um edifício diplomático da Arábia Saudita, aquando de uma visita à maior cidade da Turquia. Os líderes de várias poderosas nações criticaram Mohammed Bin Salman e Washington, então sob a presidência de Joe Biden, suspendeu o acordo de venda de armas à Arábia Saudita que Donald Trump restaurou o ano passado, ao ser reeleito. Na terça-feira, prestou-se a defendê-lo publicamente, ao dizer que o príncipe saudita não sabia de nada e criticando jornalistas que o questionaram acerca do assunto.

Ao aterrar na capital federal dos EUA, foi a primeira vez que Bin Salman entrou no país desde a morte de Khashoggi. Além de coincidir com a pompa de jatos a voarem sobre a Casa Branca, militares montados a cavalo nos jardins do icónico edifício e outros a tocarem trompetes cerimoniais, com que o líder saudita foi recebido, a visita de Cristiano Ronaldo teve o seu simbolismo por ser o regresso do português ao país desde que lidou com as suas próprias confusões.

JOSE SENA GOULAO

Ronaldo e os EUA

O capitão da seleção nacional estivera nos EUA, pela última vez, em 2016, quando jogou pelo Real Madrid um amigável de pré-época contra o Manchester United em Ann Harbour, cidade do estado do Michigan. Um ano depois, a polémica envolveu-o. O jornal Der Spiegel revelou que Kathryn Mayorga, uma modelo norte-americana, acusara formalmente o jogador de a violar durante um encontro entre ambos, em 2009, num hotel de Las Vegas. “Nego com firmeza as acusações. Violação é um crime abominável e vai contra tudo aquilo em que acredito”, diria Cristiano, através dos seus representantes.

Em 2019, a justiça norte-americana arquivou o caso por falta de provas. Mayorga ainda interpôs um processo civil contra o português, a polícia de Las Vegas reabriu o caso e o resultado seria o mesmo. “Revendo a informação disponível, as acusações de agressão sexual contra Cristiano Ronaldo não podem ser provadas para lá da dúvida razoável”, disse o juiz do estado do Nevada. O jogador não mais voltaria a jogar nos EUA, fosse com a Juventus, o Manchester ou o Al Nassr.

Quando, em 2022, se transferiu para o clube saudita para ser ‘a cara’ do investimento milionário do país no futebol, falou-se de que o Kansas City, equipa da Major League Soccer norte-americana, esteve na disputa para contratar Ronaldo. O convite de Donald Trump para estar na Casa Branca proporcionou o regresso de Cristiano ao país após o escândalo que o envolveu, sem ter sido a primeira vez, desde então, que o seu nome é mencionado entre quatro paredes recheadas de peso político.

No ano seguinte às acusações de violação, o presidente dos EUA, ainda no seu primeiro mandato, recebeu Marcelo Rebelo de Sousa em Washington, mencionou o futebolista mais internacional da história. Perguntou ao Presidente da República “quão bom jogador” era, se estava “impressionado” com ele e se Cristiano “alguma vez” iria “candidatar-se” contra Marcelo em eleições presidenciais, ao brincar com uma provocação: “Você sabe que não ganharia.” Com ofício no Palácio de Belém, o presidente português não se furtou a responder à letra, na Casa Branca, ao homem de negócios desprovido de vida política até à sua primeira eleição: “Há uma coisa que lhe devo dizer, Portugal não é como nos EUA, é um pouco diferente.”

Mais recentemente, em junho, António Costa, presidente do Conselho Europeu, entregou a Trump, à margem de uma cimeira do G7, uma camisola da seleção nacional autografada por Cristiano Ronaldo, na qual o jogador escreveu a frase “Playing for Peace” - “A Jogar pela Paz”. O ato aconteceu em Kananaskis, cidade do Canadá, um dos três países anfitriões do próximo Campeonato do Mundo onde, salvo algum problema físico, o capitão de Portugal estará no verão de 2026.

Ou até antes. Ainda carece de confirmação oficial, mas o The Athletic avançou que em março, durante o próximo período para jogos de seleções, haverá um encontro particular, nos EUA, entre a equipa anfitriã e Portugal. A ser convocado, o avançado do Al Nassr poderá estar em campo, embora tal não seja certo para o arranque do Campeonato do Mundo devido à expulsão, por cartão vermelho direto, de Ronaldo na penúltima partida de qualificação para o torneio. O jogador já cumpriu o jogo automático de castigo contra a Arménia, mas, quando são casos de agressão, as regras da FIFA ditam que o visado por ter uma suspensão de até três encontros.

A Federação Portuguesa de Futebol confirmou que vai tentar sensibilizar a entidade para reduzir, ou retirar, o eventual agravamento da punição. Caso contrário, o regresso oficial de Ronaldo aos EUA enquanto futebolista, para estar de chuteiras calçadas ao invés de laçarote ao pescoço, poderá acontecer apenas no último jogo da fase de grupos da prova.

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