Tribuna 12:45

O sucesso do andebol português não apareceu por acaso

Portugal chegou à final do Mundial sub-21 de andebol. Há dez anos tal afirmação seria uma loucura
Anze Malovrh / kolektiff

“Quando entrei, sentia que os jogadores vinham à seleção fazer um frete. Porque vinham para perder. Porque foram muitos anos a perder, muitos anos”. A frase que abre a passadeira a esta newsletter é de Paulo Jorge Pereira, selecionador nacional de andebol. Não fala de uma realidade do século passado, nem sequer com 20 anos. Numa entrevista a esta casa, o treinador recordava o que encontrou quando assumiu o cargo em 2016. Há nove anos, portanto.

Há uma década, o andebol português ainda sentia os nefastos efeitos da guerra entre Liga e Federação, quezílias que redundaram no ridículo de haver dois campeonatos em simultâneo ou de termos equipas de escalões secundários a representar Portugal em competições europeias. Como não há nada que afaste mais o investimento do que o banzé, a modalidade sofreu. De 2006 a 2020, a seleção nacional tornou-se irrelevante e desapareceu das provas internacionais, fosse Europeus ou Mundiais.

Mas essa tal modalidade cujos praticantes bufavam a cada chamada à seleção, temendo uma qualquer aleatória derrota frente a um adversário excêntrico, deu-nos, só este ano, dois feitos históricos: um 4.º lugar no Mundial de seniores e, este fim de semana, a medalha de prata no Campeonato do Mundo de sub-21. Em ambos os certames, a derrota só chegou frente à Dinamarca, potência máxima do andebol. Em 2022, o Benfica venceu a Liga Europeia, a segunda competição mais importante da Europa. Esta temporada, o Sporting chegou aos quartos de final da Liga dos Campeões. Antes, o andebol nacional já tinha logrado uma inédita participação nos Jogos Olímpicos ou dois segundos lugares nos dois últimos Europeus de sub-20.

Como aqui chegámos? é uma pergunta que geralmente fazemos com aceção negativa, tantas vezes um desabafo suspirado de quem verdadeiramente não tem respostas. No andebol, a pergunta vem de um lugar de surpresa e orgulho. E essas respostas existem.

O investimento dos três grandes no andebol foi decisivo. Hoje, Sporting, FC Porto e Benfica, sendo clubes ecléticos, não têm condições inferiores a algumas das melhores equipas da Europa. As condições dadas pela federação, com o aumento de dias de estágio para as seleções e melhoria das condições dos mesmos, ajudou. Mas, curiosamente, num mundo dividido e em que as elites políticas nos dizem para desprezar o que é estrangeiro, veio lá de fora o início de muita coisa. Como nos explicou Carlos Martingo, selecionador desta malta nova que na Polónia colocou Portugal outra vez ao nível dos gigantes, o andebol português é uma feliz mistura de influências. Soviéticas, às mãos de Aleksander Donner; sérvias, com Ljubomir Obradovic; nórdicas, com a chegada de Magnus Andersson ao FC Porto, ou espanholas, por estarem aqui ao lado. A chegada de jogadores cubanos a Portugal, no início da segunda década do século XXI, deu à seleção “peso e altura”, a “alegria” (que saudades de Quintana), mas também “a ambição e nenhum tipo de preconceito de jogar contra atletas de renome”, frisou, por sua vez, Paulo Jorge Pereira, ainda antes do heróico apuramento para Tóquio 2020.

Esse “fator mental”, a “convicção” que se pode “ganhar a qualquer um”, sublinhou-nos há dias Carlos Martingo, fez o resto: hoje, Portugal, esse país que há 10 anos nem se qualificava para competições seniores, já entra para ganhar em qualquer prova.

Faltar-nos-á, talvez, o poder físico e a intensidade de uma equipa como a Dinamarca - ainda que no domingo a diferença não tenha sido assim tanta. Mas o jogador português apareceu também para dar cabo das ideias feitas, de preconceitos, como bom produto de uma mistura. “É um bocado como o jogador espanhol: não somos nem os mais altos, nem os mais fortes, nem os mais bonitos, provavelmente. Mas temos uma qualidade tática extraordinária, jogadores muito inteligentes, aquela ‘manha’. Somos desenrascados e isso é bom para aproveitar qualquer situação de jogo”, disse o espanhol Chema Rodríguez em 2022, quando treinava o Benfica.

O sucesso do andebol português não é, por isso, coisa do acaso, de astros alinhados, de acidentes ou eventualidades. É feito de muito trabalho de sapa, da influência de muitos e do esforço de tantos outros treinadores em clubes formadores. É um exemplo do desporto português, mais um, um daqueles milagres que dão muito trabalho.

O que se passou

O Benfica caiu nos oitavos de final do Mundial de Clubes, no prolongamento, contra o Chelsea.

Por falar em Mundial de Clubes, a paupérrima impressão deixada pelo FC Porto pelos Estados Unidos deixou Martín Anselmi à beira do despedimento.

A Inglaterra revalidou o título europeu sub-21, ao bater a Alemanha na final.

A preparar-se para os Mundiais dos graúdos, Diogo Ribeiro foi dar uma perninha aos Europeus sub-23 de natação e não se saiu nada mal.

Ao fim de quatro anos de domínio do Sporting, o Benfica sagrou-se campeão nacional de futsal.

Zona mista

Al-Nassr forever

Cristiano Ronaldo disse o que provavelmente nenhum ser humano havia dito até hoje, comprometendo-se por mais duas temporadas com o futebol saudita

O que aí vem

Segunda-feira, 30
⚽ Mundial de Clubes, oitavos de final: Inter-Fluminense (20h, DAZN) e Manchester City-Al-Hilal (2h, DAZN)
🎾 Começa Wimbledon, o terceiro torneio do Grand Slam do ano, com Nuno Borges já em ação no primeiro dia (13h, Sport TV2, 3 e 6)

Terça-feira, 1
⚽ Mundial de Clubes, oitavos de final: Real Madrid-Juventus (20h, DAZN) e Borussia Dortmund-Monterrey (2h, DAZN)
🎾 Wimbledon, dia 2 (11h, Sport TV2 e 3)

Quarta-feira, 2
⚽ Arranca o Europeu feminino: Islândia-Finlândia (17h, Sport TV1) e Suíça-Noruega (20h, Sport TV1)
🎾 Wimbledon, dia 3 (11h, Sport TV2 e 3)

Quinta-feira, 3
⚽ Estreia de Portugal no Euro feminino, frente a Espanha (20h, RTP1/Sport TV1). Veja também o Bélgica-Itália (17h, Sport TV1)
🎾 Wimbledon, dia 4 (11h, Sport TV2 e 3)

Sexta-feira, 4
⚽ Euro feminino: Dinamarca-Suécia (17h, Sport TV1) e Alemanha-Polónia (20h, Sport TV1)
⚽ Mundial de Clubes, quartos de final (20h e 2h, DAZN)
🎾 Wimbledon, dia 5 (11h, Sport TV2 e 3)

Sábado, 5
⚽ Euro feminino: Gales-Países Baixos (17h, Sport TV1) e França-Inglaterra (20h, Sport TV1)
⚽ Mundial de Clubes, quartos de final (17h e 21h, DAZN)
🚴 Começa a Volta a França, com João Almeida (12h, Eurosport 1)
🎾 Wimbledon, dia 6 (11h, Sport TV2 e 3)
🏁 F1: GP Grã-Bretanha, qualificação (15h, DAZN)
👟 Atletismo: Diamond League Eugene (21h, Sport TV3)

Domingo, 6
⚽ Euro feminino: Noruega-Finlândia (17h, Sport TV1) e Suíça-Islândia (20h, Sport TV1)
🚴 Volta a França, etapa 2 (11h, Eurosport 1)
🎾 Wimbledon, dia 7 (11h, Sport TV2 e 3)
🏁 F1: GP Grã-Bretanha, corrida (15h, DAZN)

Hoje deu-nos para isto

À terceira participação consecutiva no Europeu feminino, a ambição grita-se em uníssono na comitiva portuguesa: o objetivo, na Suíça, é passar a fase de grupos. Olhando para os últimos resultados de Portugal na Liga das Nações, as goleadas sofridas frente a Espanha e Inglaterra, a derrota por 3-0 com a Bélgica, seleção no mesmo patamar competitivo das Navegadores, a afirmação dá ares de ingénua altivez, mas tem mesmo de ser assim.

Portugal joga frente a Espanha (dia 3 de julho), Itália (dia 7) e Bélgica (dia 11). Em condições normais, os dois últimos jogos serão equilibrados. Anormais, garantiram-nos Francisco Neto e Inês Pereira, foram os três últimos meses da equipa, num contexto incomum, sublinham. Assumir a meta de chegar a uns quartos de final é corajoso e necessário, porque responsabiliza uma equipa que se quer ousada, mesmo que ainda em evolução. E porque esta equipa é a mesma equipa que em finais de fevereiro empatou com Inglaterra, campeã da Europa em título.

A pressão, diga-se, também é um sinal do quanto esta equipa caminhou. E do que se propõe, agora, a correr.

Isosport/MB Media

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