O que ganha Rodrigo Mora na Arábia Saudita?

Passei as últimas horas a tentar racionalizar as imagens de Rodrigo Mora no final do FC Porto-Casa Pia, confortado por colegas de equipa, olhar fixado nas bancadas do Dragão, como quem tenta tirar uma derradeira fotografia com a memória. Pode ser só a reação a um jogo onde pouco se viu o seu talento, apesar de muito se ter visto a fortaleza coletiva do FC Porto. É possível que seja apenas uma situação de colegas amigavelmente a acolherem o benjamim. Talvez nem seja nada disto, só a minha mente a projetar medos. Espero que seja tudo isso e não uma espécie de confirmação do que seria uma profunda facada no meu peito ainda ingénuo, apesar do futebol apresentar diariamente provas de que a inocência é coisa de palonços.

Rodrigo Mora, 18 anos, convocado para a seleção principal de Portugal no verão, é desejado na Arábia Saudita. E não terá desdenhado essa hipótese, percebendo que, esta temporada, será menos imprescindível para o grupo FC Porto do que no caos individualista de Martín Anselmi, que necessitava do seu talento por não conseguir sobreviver pela ideia.

Quem ainda assume o compromisso de ver um jogo de futebol à espera de um momento de transcendência, de magia, definha, claro, perante o pragmatismo da decisão de tirar Mora do onze. Mora é ilusionismo, fascínio, a sedução da arte nos pés. Na última temporada, tantas vezes foram as minhas mãos à cabeça a cada gincana, drible, a cada finta que acabou em golo. E agora banco. Que dor.

Só que o futebol nunca deixará de ser um jogo coletivo e, para já, o que o coletivo do FC Porto está a fazer, num 4-3-3 pouco dado a nuances, não permite apontar o dedo a Francesco Farioli. O FC Porto é, hoje, uma equipa de pressão, duelos, pouco romântica e mais bulldozer. Mas não é a fineza de Mora que não cabe ali: são metros quadrados onde se sente melhor a jogar que não estão disponíveis neste sistema.

E, por isso, Mora estará disposto a sair. O FC Porto está a fazer a sua parte, só aceitando, por parte do PIF, o fundo soberano da Arábia Saudita, os 70 milhões de euros da cláusula. Havendo esse dinheiro, tudo o resto ficará nas mãos do jogador, da família, dos empresários, de quem aconselha e ouve um jovem acabado de entrar na maioridade. Não jogar regularmente é uma sina que nenhum futebolista aprova, mas o que ganhará Rodrigo Mora no Al-Ittihad, no desenraizado futebol saudita, feito de estrelas e de anónimos, sem meio-termo? O que evoluirá numa liga de ostentação, onde só há espaço para ganhar e nunca para crescer? O que ganhará enquanto ser social, fechado em compounds?

Pode perguntar ao colega de equipa Gabri Veiga, por exemplo, que aos 21 anos, e com vários gigantes interessados, optou por ir jogar para o Al Ahli, apenas para, dois anos depois, aceitar uma redução significativa do salário para regressar à Europa e a um campeonato fora dos big 5. A Jota, que rapidamente deixou de ser opção no clube que agora quer Rodrigo. Ou Marcus Leonardo, ex-Benfica, que por ter feito 22 anos passou a contar como estrangeiro sénior e, por isso, não foi inscrito pelo Al-Hilal para o campeonato. Para lá de dinheiro, que terá mais do que tempo para amealhar, o que dará o futebol da Arábia Saudita, plástico, imediato, impulsivo, disposto a usar e deitar fora, a um miúdo de 18 anos com uma vida desportiva à sua frente?

No futebol tudo pode mudar rapidamente. Talvez demasiado tenha sido pedido a Rodrigo Mora com apenas 17 anos, levando uma equipa às costas. E isso não é de esquecer. Só que agora a equipa tem as costas bem mais largas. Rodrigo tem pressa, é compreensível, mas a paciência é uma virtude. Sendo tão jovem, precisa de bons conselhos, de soluções onde se pense a 10 anos e não a seis meses. Que as imagens do Dragão no último domingo nos tenham enganado.